Enchentes e equívocos

Folha de S. Paulo

ter, 15/09/2009 - 14h40 | Do Portal do Governo

Hoje, somos vítimas de um passado de políticas erradas. Mas o futuro colherá os bons resultados de um presente de políticas responsáveis 

Depois das chuvas atípicas da terça-feira (8), muita coisa errada foi dita sobre a relação entre as enchentes que transtornaram a cidade de São Paulo e a construção de novas pistas na Marginal Tietê.

Erros devido a desconhecimento ou, mais grave, oportunismo puro e simples. Infelizmente, vários deles foram levados a sério na mídia.

O maior de todos talvez seja o que atribuiu o peso das enchentes às obras que estão começando, mas que, paradoxalmente, aliviaram a calamidade: as valetas abertas funcionaram como “piscinões”, retendo boa parte da água.

Derivado desse, outro equívoco repetido em rádios e no noticiário on-line chamou o projeto da Nova Marginal de “estúpido” e disse ser “desperdício de dinheiro público”, porque iria agravar a impermeabilização da cidade. O raciocínio decidiu ignorar dados conhecidos:

1) a área asfaltada das novas pistas é desprezível -nem 0,06% da bacia do Tietê e 0,012% da área total já impermeabilizada no último meio século;

2) devido ao  replantio de árvores na própria marginal e à implantação do parque Várzeas do Tietê, a área permeável aumentará cerca de 360 vezes. Serão eliminadas 559 árvores, 129 delas já mortas, e outras 4.900 serão plantadas nos canteiros da via expressa, 83 mil nas ruas adjacentes e 63 mil no parque linear.

Equívocos vieram também de “especialistas”, como o engenheiro da Unicamp, subprefeito da gestão Marta Suplicy (a dos desastrados túneis dos Jardins, que não investiu um centavo no Metrô), mais ligado à área de seguros do que à hidrologia.

Além de afirmar erradamente que serão retiradas da marginal 20 vezes mais árvores que de fato, propôs acabar com pista expressa, com um parque no seu lugar. Teríamos de ir a Guarulhos no lombo de um burrinho, como ironizou o governador Serra?

Outro “especialista”, dessa vez arquiteto, sugeriu então uma ideia da época do prefeito Jânio Quadros – levar as marginais do Tietê e Pinheiros a 1,5 km de distância dos rios.

Só em desapropriações, seriam 180 bilhões de reais, fora demolições, parque e novo sistema viário local. Dezenas de milhares de famílias e empresas seriam despachadas para longe. O Estado quebraria, governador e prefeitos seriam depostos.

Nesta mesma página 3, um geólogo publicou uma “Carta aberta ao governador Serra” (11/9). Disse que os 43 piscinões da região metropolitana deveriam ser extintos -os mesmos piscinões que retiveram 8,5 bilhões de litros de água na terça-feira, ou um Tietê da Penha ao Cebolão, com sete metros de altura.

E após abominar o programa de combate a enchentes do governo, o que propôs? Precisamente o mesmo programa, com as cinco frentes que vêm sendo executadas pelo governo do Estado com as prefeituras da região metropolitana: ampliação das calhas, permanente desassoreamento de rios e córregos, eliminação de pontos de estrangulamento dos cursos d’água, recuperação da capacidade de infiltração e retenção de águas pluviais e combate à erosão do solo.

Desde 1995, foram investidos em drenagem e contenção de cheias na região metropolitana 2,9 bilhões de reais. O plano de macrodrenagem é coerente e sensato, parte de um diagnóstico hidráulico-hidrológico que abrange toda a bacia hidrográfica e integra vários conceitos: contenção das águas das chuvas nas cabeceiras por meio de piscinões; aumento da capacidade de vazão dos cursos d’água; ampliação de áreas verdes; criação de parques lineares e ciclovias; urbanização de favelas. Todos transformados em ação pelo Estado e prefeituras, principalmente a da capital.

Em 2004, São Paulo tinha 34 parques municipais, com 15 milhões de m2 de área verde. Em 2008, eram 48 parques e 23 milhões de m2. Hoje, são 54 parques e, até 2012, serão 100, ou 50 milhões de m2!

Foram plantadas 550 mil árvores na zona urbana de 2005 a 2008, quintuplicando o quadriênio anterior. Todas as obras públicas e privadas licenciadas pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da cidade de São Paulo exigem a calçada verde. A lei municipal das “piscininhas” já contempla essa iniciativa.

O parque Várzeas do Tietê, lançado em julho, terá um papel decisivo na drenagem e contenção das águas de chuvas atípicas. Com 75 km de extensão e 107 km2 de área, será o maior parque linear do mundo, unindo os oito municípios do Alto Tietê desde a nascente. Faz parte do licenciamento da Nova Marginal, como medida compensatória.

É claro que, com muito mais dinheiro, faríamos muito mais, e mais depressa. Mas o fato é que nunca se fez tanto, na direção correta. Hoje, somos vítimas de um passado de políticas urbanas erradas. Mas o futuro colherá os bons resultados de um presente de políticas responsáveis.

Dilma Seli Pena é secretária de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo 

Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho é secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo