Empresas querem resultados na sala de aula

Gazeta Mercantil - São Paulo, 4 de agosto de 2008

seg, 04/08/2008 - 9h28 | Do Portal do Governo
Gazeta Mercantil
 
Na década de 90, quando ainda morava em uma travessa da Av. Giovanni Gronchi, na zona sul da capital paulista, o empresário Jayme Garfinkel, presidente da Porto Seguro Seguros tinha uma idéia recorrente: ajudar os moradores da favela Paraisópolis, localizada em pleno coração de um dos bairros mais nobres de São Paulo, o Morumbi. Seu sonho era oferecer à comunidade uma escola de qualidade. E não precisou de muito para que, como bom empreendedor, colocasse a idéia em prática.

Em contato com a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, Garfinkel adotou em 1991 a escola estadual Profª Etelvina de Goes Marcucci, com dois mil alunos. Inicialmente, o trabalho foi ajudar na infra-estrutura da escola. Mas a carência era grande também na área pedagógica, e o empresário começou a ajudar na compra de material escolar. Era o próprio empresário que negociava e acompanhava a rotina da escola.

O trabalho de Garfinkel foi o começo do projeto Parceiros da Educação que, segundo dados da Secretaria de Estado da Educação do Estado de São Paulo, atende hoje 65 escolas. E com metas agressivas. Até o final deste ano, o programa deve alcançar o número de 100 escolas. “Em 2010, chegaremos a 500 escolas”, afirma Lúcia Fávero, diretora-executiva do programa.

A associação Parceiros da Educação foi criada em julho de 2006 e ajudou a alavancar o projeto que até então, contava com apenas 20 escolas. Atualmente, é coordenado pelos empresários Ana Maria Diniz (Grupo Pão de Açúcar e Axialent) e Jair Ribeiro (CPM Braxes), e conta com nomes de peso entre seus associados: Ana Helena de Moraes Vicintin (Instituto Votorantim), Alfredo de Goeye (Sertranding), Marcelo Adorno (M13 Tecnologia), Moise Politi (Grupo Ourinvest), Nizan Guanaes (Grupo ABC), Paulo Brito (Mineradora Santa Helena), Sérgio Motta (TV1) e Sérgio Spinelli (Mattos Filho Veiga Filho Marrey Jr. e Quiroga Advogados).

A Parceiros da Educação é uma das entidades que atuam como catalizadoras de empresas para a Secretaria de Educação de São Paulo. O objetivo das empresas não é substituir o papel do estado, afirma Fábio Bonini, presidente do FDE. “O governo de São Paulo investe anualmente R$ 600 milhões em infra-estrutura das escolas”, afirma Bonini. Valor que não é suficiente para atender à demanda de todas as 5,5 mil escolas, como explicou em entrevista à Gazeta Mercantil, a secretária de educação Maria Helena Guimarães de Castro.

“A ação tem como foco a responsabilidade social das empresas que podem resolver com mais rapidez pequenas questões do dia-a-dia da escola”, diz Bonini, ressaltando que a doadora não participa de maneira determinante no regime pedagógico. “Mas tem o direito de saber o resultado de seu ‘investimento’”, diz Bonini.
 
A utilização de instrumentos de averiguação de performance ainda é recente no sistema de ensino brasileiro, mas indicadores como o Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) já começam a dar um retrato mais amplo dos resultados da atuação empresarial, que nem sempre é o que se espera.

Garfinkel acompanha de perto a performance de suas escolas – em 1997, a Porto Seguro assumiu também a escola Prof. Homero Santos Fortes, com 2,7 mil crianças, e em 2003 adotou a escola Maria Zilda Gamba Natanael, com 2,7 mil alunos. E se diz decepcionado com os resultados do último Ideb da escolas, que ficaram abaixo da média do estado.

No caso da escola Profª Etelvina de Goes Marcussi, Garfinkel reclama da qualidade da direção que não tem preocupação com resultados. “É um problema do estado que não disciplina a diretoria, que em contrapartida, não disciplina os professores, que por fim, não disciplinam os alunos.”

A Porto Seguro vem travando uma batalha por qualidade, e as escolas que não atingirem suas metas correm o risco de perder os benefícios. “Depois de tantos anos, não queremos ser parte do problema, por isso, contratamos o Instituto de Qualidade de Ensino e estamos medindo os resultados”, conta.

Apesar da ameaça, dificilmente Garfinkel vai abandonar o projeto. A Porto Seguro, para manter um canal permanente de acompanhamento com as escolas e desenvolver outros projetos em Paraisópolis, criou em 1998 a “Associação Crescer Sempre”, que abriu uma escola de educação infantil – totalmente mantida e administrada pela Porto Seguro -, da qual já foram beneficiadas cerca de 620 crianças de 4 a 6 anos. Os investimentos na região tendem a crescer.
 
“Felizmente, a empresa tem um bom resultado e definimos uma verba de 2% a 3% do lucro para investimentos em projetos sociais”, conta.

Segundo Lúcia Fávero, da coordenação do Parceiros da Educação, as empresas já entenderam que investir só em infra-estrutura não traz melhoria de performance dos alunos. Um exemplo, é o trabalho realizado pelo empresário Jaime Ribeiro, da CPM Braxes, quando adotou em 2004 a escola Luiz Gonzaga Travassos da Rosa, localizada no bairro Jardim Santo Antonio. O começo do trabalho foi estrutural: reforma de salas de aula, banheiros, dependências administrativas, manutenção, sala de leitura e informática, além de a terceirização da limpeza e apoio à conservação do prédio.
 
Mas isso não trouxe melhoria de qualidade.
Para resolver o problema, foi contratado o Instituto Idéias para atuar na capacitação dos professores, especialmente nas áreas de português e matemática. “No final de um ano, os alunos tiveram um salto em rendimento”, conta Lúcia.

Após um ano de apoio pedagógico aos professores e coordenadores, os resultados dos alunos de 4ª série no Saresp saltaram de uma média de 54,1 em 2004, para 71,5 no ano posterior. A escola conseguiu também eliminar o analfabetismo funcional entre os alunos da 8ª série em 2007.
Esses resultados ajudaram a dar foco às ações do Parceiros da Educação. “Estamos acompanhando o desenvolvimento das escolas com base em quatro processos básicos: formação dos professores, apoio aos projetos pedagógicos, avaliação de performance, infra-estrutura de sala de leitura e informática”, diz Lúcia.

A qualidade também é preocupação da Fundação Lemann, que adotou em 2007 a escola Vicente Rao, localizada no bairro Americanópolis, na capital, por intermédio da associação Prosaber. Segundo Claudia Gamba, gerente responsável pelo projeto, a intenção inicial era dar apoio pedagógico. “Mas descobrimos que chovia dentro das classes e tivemos que, primeiramente, trocar o telhado”, conta. A entidade também está investindo em reformas no piso superior e instalação de pára-raios, além de material básico de ensino, como cartolina. “Também estamos realizando um programa de reforço escolar aos sábados para os alunos de 5ª a 8ª série”, conta.

Cláudia sabe que, apesar da ansiedade, a entidade terá muito trabalho até realmente conseguir resultados. “Entrar na escola é diferente de olhar de fora, estamos conhecendo as dificuldades da direção e da Secretaria”, afirma.

Apesar de a Secretaria da Educação afirmar que não existe valor mínimo para os empresários que queiram participar do projeto, um levantamento feito pela associação Parceiros da Educação afirma que em média, as empresas participantes gastam, no mínimo, R$ 7 mil ao mês com os projetos. “Para participar a empresa precisa ter vontade, uma vez que não há benefícios fiscais”, afirma Lúcia Fávero. O investimento médio é de R$ 125 mil ao ano., ou R$ 99 por aluno.

Os recursos serão repassados diretamente para a Associação de Pais e Mestres (APM) da escola que, em conjunto com a empresa, decidem a prioridade de acordo com a diretrizes educacionais da Secretaria de Estado da Educação. Depois de um ano de projeto, a empresa recebe o Selo Empresa Educadora, outorgado pela Secretaria. No entanto, afirma Lúcia, os empresários têm que estar cientes que o tempo mínimo de trabalho em uma escola é de cinco anos, “com possibilidade de ampliação, se assim for necessário”.