Compositor da rainha rege a Osesp

O Estado de S.Paulo - Quinta-feira, 3 de abril de 2008

qui, 03/04/2008 - 12h24 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

O que esperar do programa que o compositor britânico Peter Maxwell Davies interpreta de hoje até sábado com a Osesp? ‘Vai ser divertido’, diz ele, em entrevista após ensaio na tarde de terça-feira na Sala São Paulo. Sir Davies rege duas obras suas – Mavis in Las Vegas e Strathclyde Concert nº 10 -, ao lado de sinfonias de Haydn e Mozart. ‘Há muita coisa séria nessa música, mas o programa de alguma forma mostra que não há nada de errado em se ter um pouco de senso de humor’, brinca.

Nascido em 1934, sir Peter Maxwell Davies começou a carreira nos anos 50, ajudado por Benjamin Britten e Aaron Copland, figuras eminentes no mundo musical inglês e americano, respectivamente. Nos anos 60, era o enfant terrible da música britânica, com obras expressionistas, de temas quase sempre sombrios e com um caráter satírico carregado. Nos anos 70, passou a se voltar para as formas clássicas, escreveu suas primeiras sinfonias e concertos. Mudou-se para as Ilhas Orkney, cuja paisagem passou a influenciar seu trabalho. Em 2004, foi nomeado Mestre de Música da Rainha – e, uma vez empossado, saiu disparando contra a redução de verbas para projetos de educação musical e custeio de orquestras no Reino Unido. Ao trabalho como compositor, aliou sempre a atividade de maestro convidado à frente das principais orquestras européias.

De volta aos concertos desta semana, como ele apresentaria as peças que vai interpretar? ‘O Strathclyde é o décimo e último de uma série de concertos que escrevi nos anos 90, quando atuei como compositor residente da Orquestra de Câmara Escocesa. Cada peça era dedicada a um solista do grupo, de forma que, no último da série, criei um concerto para orquestra, bastante virtuoso, do qual todos os músicos participam ativamente’, diz ele. ‘É, até por isso, uma peça de celebração, digamos assim. A inspiração vem das paisagens, do mar, do ambiente das ilhas Orkney. Outro dia ouvi aqui na Sala São Paulo uma obra de Villa-Lobos e percebi que tenho muito em comum com ele. Em sua música, e na minha também, acredito, fica claro o amor pela pátria. O último movimento é uma celebração divertida desse amor.’

Já Mavis em Las Vegas surgiu de um desencontro. Durante uma turnê com a Filarmônica da BBC pelos Estados Unidos, fizeram uma parada em Las Vegas. ‘Para os músicos britânicos, a cidade provocou sensações intensas. Para alguns, Vegas era o que havia de mais brega, para outros, de mais fenomenal. O certo é que ninguém havia conhecido antes uma cidade como aquela. Mas, enfim, certo dia, foi marcada uma entrevista pelo telefone com um jornalista inglês, que estava preparando um artigo sobre a turnê. Esperei durante mais de uma hora e nada do telefone do quarto do hotel tocar. Dias depois, fiquei sabendo que o jornalista ligou para a recepção e pediu para falar com Sir Maxwell Davies. Disseram-lhe que não havia ninguém com aquele nome hospedado ali. O repórter insistiu, insistiu – e nada. O fato é que eles juntaram meu nome no computador e passei a me chamar Mavis, que é um nome feminino! Enfim, achei curioso e fiz uma peça em homenagem aos músicos, recriando suas sensações sobre nossa viagem a Vegas. Os críticos detestaram, mas o público adorou. Um deles me disse que era a música mais brega que já tinha ouvido. Pensando no tema da peça, recebi o comentário como um elogio!’

E como é a sua relação com o público? ‘O meu prazer está no contato com os músicos e as platéias. Nos anos 50, surgiu uma cratera entre autores, intérpretes e público. O momento, agora, é de reaprendermos a nos comunicar e começarmos a fechar essa cratera, o que tem acontecido. Isso não quer dizer que condeno a música de Pierre Boulez ou Stockhausen (dois grandes nomes da vanguarda européia). Somos autores muito diferentes, mas tocamos a música um do outro. O importante é entender que em um universo de respeito mútuo, há espaço para todos.’

E por que unir às suas peças duas obras de Mozart e Haydn? ‘Em primeiro lugar porque a Sinfonia Praga (de Mozart) e a nº 22 (de Haydn) são duas das minhas obras favoritas. Além disso, como compositor, vejo essas peças com um olhar diferente, pouco usual. E acho que, ao regê-las, posso tentar mostrá-lo ao público, revisitando de maneira original essas obras. Mas isso, enfim, é uma intenção. Se vou conseguir, não sou eu quem vai julgar.’

Serviço Osesp. Sala São Paulo (1.484 lugs.). Praça Júlio Prestes, s/n.º, 3223-3966. Hoje e amanhã, 21 h; sáb., 16h30. De R$ 28 a R$ 98