Ciência da biodiversidade

Folha de S. Paulo

qua, 03/06/2009 - 8h28 | Do Portal do Governo

Nesta semana, na sede da Fapesp, estará em discussão a forma de atuação do Biota nos próximos dez anos

A Terra formou-se há 4,5 bilhões de anos. Durante os primeiros 700 milhões de anos, átomos e moléculas se combinaram em diversas formas, até que algumas dessas combinações levaram a estruturas estáveis e com uma característica muito especial: a de serem capazes de se reproduzirem. Esses organismos, manifestações primitivas da vida, habitavam o oceano; parte deles passou a produzir oxigênio pelo processo de fotossíntese.

Há 600 milhões de anos, quando a atmosfera já tinha 21% de oxigênio, houve rápida diversificação e aumento do tamanho dos animais na Terra.

Essa foi a chamada Explosão do Cambriano, denominada segundo o período geológico em que ocorreu. Em seguida, vieram as plantas terrestres.

O processo de diversificação continua em curso. Estima-se que o Homo sapiens -espécie surgida há 200 mil anos, resultado da evolução e da diversificação- encontrou, registrou e descreveu, nos séculos recentes, 1,4 milhão de espécies: 750 mil são de insetos, 41 mil são de vertebrados e 250 mil são de plantas, além de invertebrados, fungos e micro-organismos.

Quantas espécies vivem no planeta é motivo de especulação: alguns cientistas da área supõem a existência de 30 milhões de espécies.

A disparidade ilustra a dimensão do desafio de estudar e conhecer a vida na Terra. O conhecimento e a conservação da biodiversidade criam oportunidades de pesquisa que a comunidade científica paulista tem usado intensamente. É imperativo que o Brasil estude e conheça as espécies em seu território, até porque uma fração grande da biodiversidade mundial está na região tropical.

Na segunda metade dos anos 90, cientistas propuseram à Fapesp a organização da pesquisa sobre biodiversidade no Estado como um programa.

Em um programa, os pesquisadores envolvidos nos projetos de pesquisa interagem e os resultados de cada um e as dificuldades que enfrentam auxiliam o avanço dos projetos de todos.

Anunciado em 1999, o programa Biota/Fapesp -o Instituto Virtual da Biodiversidade- articula a comunidade científica paulista em torno das premissas da Convenção sobre a Diversidade Biológica, assinada durante a ECO-92 e ratificada pelo Congresso Nacional em 1994.

O Biota estimula e articula a pesquisa para mapear e analisar a biodiversidade do Estado de São Paulo -a fauna, a flora e os micro-organismos.

O programa se desenvolve por meio de uma rede virtual que interliga 500 pesquisadores e seus estudantes, participantes em 800 projetos de pesquisa financiados pela Fapesp. Os resultados científicos são expressivos, destacados em seguidas visitas de avaliação de comitês internacionais: centenas de artigos foram publicados em revistas científicas de circulação mundial. A revista “Biota Neotropica”, criada pelo programa, afirma-se como veículo de repercussão internacional. Criando boa ciência, já se formaram mais de 150 mestres e mais de cem doutores.

A ciência do Biota auxilia as políticas públicas para conservação em São Paulo. Marco recente foi a definição dos mapas produzidos para a Secretaria estadual do Meio Ambiente, definindo estratégias para a conservação da biodiversidade remanescente e restauração de corredores ecológicos.

Resultados do Biota embasam as resoluções SMA 14/08 e 15/08, a 9/09 e o decreto estadual 53.939/09, que estabelecem critérios e parâmetros para a compensação ambiental obrigatória no caso de o Estado autorizar supressão de vegetação nativa.

O mapa de zoneamento agroambiental da Secretaria de Agricultura e Abastecimento para o setor sucroalcooleiro em São Paulo baseou-se também nos dados do programa.

O Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente, da Procuradoria de Justiça do Estado, também adotou as diretrizes do Biota por meio do ato normativo 565/09. Bahia, Pará e Minas Gerais já criaram programas estaduais baseados na experiência do Biota e cientistas do Biota contribuem para o Biota/África.

Desde 2006, o programa passou a ser uma colaboração entre Fapesp, USP, Unicamp e Unesp. A partir de 2009, a Unicamp garante ao programa apoio institucional essencial para seu desenvolvimento. A Fapesp, nesses dez anos, investiu mais de R$ 85 milhões no Biota para financiar pesquisa e bolsas de estudo. As universidades e os institutos de pesquisa investiram outro tanto em salários de pesquisadores e pessoal de apoio.

Nesta semana, na sede da Fapesp, estará em discussão a forma de atuação do Biota nos próximos dez anos.Novos desafios científicos e novas tecnologias serão incorporados: restauração com espécies nativas, genômica, vida marinha e mudanças climáticas. Os resultados dos primeiros dez anos justificam otimismo.

Carlos Henrique de Brito Cruz é diretor Científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp)