Brasil seqüencia DNA de levedura que produz etanol

O Estado de S.Paulo - Quinta-feira, 3 de janeiro de 2007

qui, 03/01/2008 - 11h36 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

A produção de álcool no Brasil caiu mais uma vez nas graças da genômica. Depois de seqüenciar o DNA da cana-de-açúcar, oito anos atrás, cientistas brasileiros estão prestes a concluir o seqüenciamento da levedura responsável pela fermentação de mais da metade do etanol produzido no Brasil. O trabalho tem aplicação direta na indústria e visa a identificar genes importantes para o melhoramento genético de leveduras – incluindo a produção de linhagens transgênicas.

As leveduras (da espécie Saccharomyces cerevisiae) são fungos microscópicos, unicelulares, que transformam açúcar em álcool – o processo conhecido como fermentação alcoólica. São elas que, além de fazer crescer o pão, produzem o álcool inebriante das cervejas, vinhos, cachaças e qualquer outra bebida alcoólica, assim como o álcool combustível (etanol) de cana-de-açúcar que hoje abastece grande parte dos veículos brasileiros.

Milhares de tipos de levedura são conhecidos e cada processo industrial emprega uma linhagem diferente. No Brasil, apenas quatro são usadas na produção de álcool combustível. O seqüenciamento genético está sendo feito com uma linhagem chamada CAT-1, selecionada ao longo de quase 20 anos de pesquisa por cientistas da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a Fermentec, uma empresa de consultoria especializada em fermentação alcoólica.

“O Brasil precisa urgentemente de novas linhagens”, diz o especialista Luiz Carlos Basso, da Esalq. “Esperamos que o genoma trará conhecimentos importantes para isso.” Segundo ele, a CAT-1 e a PE-2 (outra linhagem selecionada pelo programa) já são usadas por 150 destilarias, responsáveis por mais de 50% da produção nacional de etanol.

O seqüenciamento propriamente dito (a “leitura” do DNA) está sendo feito na Universidade Stanford, na Califórnia, com máquinas de última geração. Mas quem coordena o trabalho é o pesquisador Boris Stambuk, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que concluiu seu segundo pós-doutorado e foi professor visitante na instituição americana.

Segundo Stambuk, que é peruano radicado no Brasil, o genoma da CAT-1 tem 12 milhões de pares de bases (ou “letras”), com cerca de 6.500 genes inscritos. Para dar maior confiabilidade aos dados (e aproveitando o baixo custo e alta velocidade das novas tecnologias de seqüenciamento), o genoma está sendo “lido” diversas vezes. Até agora, já foram seqüenciados 200 milhões de pares de bases.

“Se você sabe quais fatores limitam ou favorecem a fermentação, pode trabalhar com isso para melhorar a produção”, explica Stambuk. Ele espera submeter um artigo científico sobre o trabalho para publicação ainda neste mês.

Uma característica importante já foi identificada: a duplicação de genes relacionados à síntese das vitaminas B6 e B1, cruciais para o processo de fermentação, o que pode ser uma das razões pela qual a CAT-1 funciona tão bem para a indústria. A eficiência média do processo de fermentação nas destilarias brasileiras hoje é de 88%. Nas mais eficientes (que já adotaram a CAT-1), o índice chega a 93%, segundo o presidente da Fermentec, Henrique Amorim.

Com os dados revelados pelo genoma, a expectativa é que esse número suba ainda mais – até 95%. “Poderemos aumentar a eficiência e diminuir o custo ao mesmo tempo”, aposta Amorim. Ele prevê também a produção de linhagens transgênicas combinando, por exemplo, fatores de interesse industrial, como resistência, e comercial, como aroma. “Poderemos transferir genes de uma levedura para outra para obter características desejadas.”