Autoridade única para o transporte

Jornal da Tarde - São Paulo - Segunda-feira, 22 de novembro de 2004

seg, 22/11/2004 - 8h55 | Do Portal do Governo

Opinião

Jurandir Fernandes

Na recém-terminada campanha eleitoral foi freqüente a menção à integração de transporte como um dos problemas a exigir a atenção da administração pública.

Falou-se muito em integração tarifária, discussão alimentada pela implantação do Bilhete Único, que aprimorou o sistema de arrecadação no transporte de ônibus da Capital e reduziu o custo médio da tarifa no Município – claro, à custa de aumento do subsídio do Tesouro para o setor.

Falou-se menos da integração física do transporte de ônibus municipal, restringindo-se a discussão à implantação apressada dos corredores de transporte e seu sistema alimentador, com base também no Bilhete Único, na reforma dos velhos corredores à direita e na adequação da frota operacional, que passou a ser equipada com portas à esquerda.

Pressionada pela agenda eleitoral, a discussão da complementaridade das modalidades de transporte, feitas pela Prefeitura de São Paulo, acabou por ignorar a malha metrô-ferroviária existente na cidade. Também ignorou que a malha de transporte municipal se rebate na malha intermunicipal, indispensável para a realização de milhares de viagens diárias, que não só refletem a expansão da malha urbana de São Paulo, como também o desenvolvimento dos municípios vizinhos.

Na verdade, é tapar o sol com peneira prescindir do metrô nos deslocamentos urbanos realizados em São Paulo. Assim como é desperdício deixar de usar a malha ferroviária da CPTM (180 km e 42 estações), instalada no Município, na estruturação do transporte urbano. E também o é deixar de usar o restante desta malha na articulação das demais cidades da Região Metropolitana de São Paulo RMSP, que representam opção não só de moradia, como também de emprego, escola e serviços públicos para os munícipes de toda a região.

O governo do Estado sempre enxergou a importância dessa rede metrô-ferroviária para o equacionamento da questão de transporte, tanto em São Paulo como em sua região metropolitana, tendo investido nela pesadamente nos últimos anos.

O metrô, os trens metropolitanos, os corredores segregados, os ônibus municipais, intermunicipais e os microônibus fazem parte de um mesmo sistema, de cujo funcionamento depende o desenvolvimento de toda a RMSP, inclusive de seu núcleo paulistano. E assim devem ser tratados todos os segmentos dessa malha intricada e complexa, respeitadas a função e a capacidade de cada um deles, buscando-se sua complementaridade e sua melhor sinergia, com vistas à qualidade de vida do cidadão metropolitano, esse, sim, o objetivo final da administração.

A visão sistêmica, causa e conseqüência da perfeita integração desses modais, porém, tropeça num emaranhado jurisdicional, que, em vez de promover, inibe essa integração.

Temos assistido à competição ruinosa, que superpõe projetos de transporte concorrentes, uns inviabilizando e desestabilizando os outros, ao fechamento de fronteiras municipais com terminais de transferência praticamente inevitável e com tecnologias despadronizadas, que colocam empecilhos à circulação intermunicipal em nome de cercas que a cidade pulou quando se desenvolveu.

Acreditamos que a criação de uma autoridade única para o tratamento da questão de transporte seja uma medida necessária para pôr fim a esse estado de coisas e promover uma efetiva integração dos subsistemas de transportes da RMSP, visando à otimização dos recursos disponíveis e à exploração sustentada de cada um deles.

Uma entidade que congregue as jurisdições envolvidas, onde os problemas possam ser debatidos à luz do interesse público, pode ter a força que impeça a desagregação dos esforços e propicie o desenvolvimento harmônico de toda a região.

Nesse sentido, o governo do Estado, por meio da Secretaria dos Transportes Metropolitanos, iniciou trabalho de articulação das áreas técnicas de transporte e trânsito dos municípios da RMSP, tendo promovido dois encontros e já programado o terceiro, a ser realizado no município de Guarulhos. É o embrião para o avanço institucional, essencial para o desenvolvimento eficiente e eficaz do transporte metropolitano.

Jurandir Fernandes é secretário dos Transportes Metropolitanos do Governo do Estado de São Paulo, presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos ANTP e presidente da divisão latino-americana da União Internacional de Transportes Públicos UITP