Ameaça a anfíbios mobiliza aliança de pesquisadores

O Estado de São Paulo - Sábado, dia 8 de julho de 2006

sáb, 08/07/2006 - 11h25 | Do Portal do Governo

Rede internacional precisa de US$ 400 milhões para primeiros 5 anos e propõe reprodução em cativeiro

Herton Escobar

Mais de 30% das quase 6 mil espécies conhecidas de anfíbios estão ameaçadas de extinção. E como se não bastasse a destruição de hábitats e a poluição dos rios, uma boa parte dos sapos, rãs e pererecas do planeta está contaminada por um fungo letal, que já dizimou populações inteiras nas Américas. Para tentar reverter esse quadro, pesquisadores de vários países estão propondo a criação de uma rede internacional voltada para a conservação e o estudo dos anfíbios.

O projeto foi apresentado ontem, em um artigo da revista Science. Segundo a proposta, a Aliança para a Sobrevivência dos Anfíbios seria chefiada por um grupo de especialistas da União Mundial para a Natureza (IUCN), e precisaria de um orçamento de US$ 400 milhões para os primeiros cinco anos. “O sucesso vai depender de uma mudança de paradigma na escala de uma resposta coordenada”, escrevem os cientistas. “O apoio de indivíduos, governos, fundações e a comunidade conservacionista em geral será essencial.”

A principal preocupação no momento é com relação ao fungo causador da quitridiomicose. Para isso, além da criação de áreas protegidas (que não impedem a entrada da doença), os cientistas propõem a reprodução em cativeiro das espécies mais ameaçadas.

“Até que tenhamos uma maneira de controlar o fungo no ambiente, não há, em nossa perspectiva, outra solução que não seja criar programas de criação em cativeiro”, disse ao Estado Claude Gascon, vice-presidente da Divisão de Programas Regionais e especialista em anfíbios da ONG Conservação Internacional.

A idéia é que os animais possam ser devolvidos à natureza, no futuro, depois que o fungo for controlado de alguma forma. “Se só ficarmos olhando, essa doença vai acabar com uma série de espécies”, alerta Gascon. “É um debate que não pode mais ficar só entre nós, anfibiólogos.”

A proposta de reprodução em cativeiro (também chamada de conservação ex situ), porém, não agrada a todos os pesquisadores.

“É uma coisa muito custosa e que freqüentemente apresenta resultados duvidosos ou ineficazes”, diz o herpetólogo Célio Haddad, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro. “A verdade é que fazer criação em cativeiro rende espaço na mídia e chama a atenção de empresas interessadas em aparecer como preocupadas com a preservação dos animais. O ideal é fazer conservação in situ (na natureza) por meio da criação de reservas e do manejo de populações.”

Gascon reconhece que a experiência mundial com reprodução de anfíbios é pequena e que será preciso muita pesquisa para avançar nesse campo. “Há muitas espécies que não sabemos como se reproduzem nem na natureza”, observa. Ele ressalta, porém, que a reprodução em cativeiro é apenas uma ferramenta dentro de um conjunto de estratégias de conservação. “De maneira alguma vai ser a única e última solução”, diz.

A proposta para criação da aliança já está sendo avaliada pela IUCN e um lançamento oficial deverá ser feito em setembro, segundo Gascon.