A real saúde do Estado de São Paulo

Folha de S.Paulo - terça-feira, 24 de maio de 2005

ter, 24/05/2005 - 10h50 | Do Portal do Governo

LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA

A crítica construtiva é sempre salutar. O erro é um ato humano, por vezes involuntário. Já a má-fé é um erro premeditado, mas que pode ser evitado com uma simples dose de boa vontade.

O presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), José Erivalder Guimarães, deveria ter feito uma rápida consulta ao Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (Siops) antes de ter escrito o artigo publicado por esta Folha (dia 19/5). Disponível pela internet, o Siops é um banco de dados do Ministério da Saúde que traz informações sobre os gastos aplicados na área por Estados e municípios. E lá está a prova cabal de que, diferentemente do informado pelo missivista, o governo do Estado de São Paulo destina, sim, os percentuais mínimos em saúde determinados pela emenda constitucional n.º 29/2000. E o órgão que atesta essa informação é o próprio Ministério da Saúde.

O governo do Estado de São Paulo destina, sim, os percentuais mínimos em saúde determinados por emenda constitucional

O investimento mínimo de 12% previsto para 2004 foi cumprido, assim como também o será neste ano.
Feito o esclarecimento, vamos aos demais fatos. Sem meias palavras, o presidente do Simesp decidiu julgar e condenar sumariamente o governo de São Paulo. É no mínimo estranho que um representante da classe médica desconheça ou nem mencione que o SUS (Sistema Único de Saúde) integra as três esferas de governo -União, Estados e municípios- para garantir a eqüidade, universalidade e integralidade do atendimento médico-hospitalar.

Em nenhum momento foi citada, por exemplo, a defasagem nas tabelas de remuneração do governo federal para os atendimentos realizados pelo SUS, que compromete o equilíbrio financeiro de santas casas e entidades filantrópicas. O autor tampouco trata da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que permite ao governo federal aplicar menos recursos na saúde e na educação.
Também não foi mencionado que o teto financeiro do SUS para o Estado de São Paulo não é reajustado pelo governo federal, e que seriam necessários no mínimo mais R$ 14 milhões por mês para suprir a demanda nos hospitais. Ainda faltou informar que o governo estadual acaba arcando com esse rombo, bancando boa parte do ‘estouro’ do teto por parte dos prestadores do SUS e evitando, assim, o colapso do sistema.

Mas não pára por aí. É preciso lembrar que a Secretaria de Estado da Saúde socorre anualmente as santas casas e hospitais filantrópicos, que enfrentam grave crise por conta dos baixos valores da tabela do Ministério da Saúde. Apenas como exemplo, um parto que custa R$ 700 é remunerado pelo governo federal em apenas R$ 300. Desde 1995 o governo estadual repassou a essas entidades algo em torno de R$ 1 bilhão, dos quais R$ 155 milhões somente no ano passado.

A questão do salário dos médicos também foi tratada de maneira enviesada. De maneira nenhuma a remuneração máxima desses profissionais chega a apenas R$ 1.600 por mês. O salário médio da categoria é de R$ 2 mil. Esqueceu-se, mais uma vez, de mencionar que o Estado mantém uma política de plantões, o que pode elevar o salário para cerca de R$ 5.000.

Outro assunto que merece uma análise mais criteriosa é o modelo de Organizações Sociais de Saúde (OSS), implementado pelo atual governo para o gerenciamento de hospitais. Se para o presidente do Simesp esse modelo representa uma ‘via muito mais acidentada’, para a população de São Paulo representa melhoria do atendimento, uma vez que o índice de satisfação médio de usuários dos 16 hospitais geridos por OSS fica na casa dos 95%.

Mais do que isso. Os hospitais gerenciados por organizações sociais são exemplo de eficiência e otimização de recursos. Em 2004, essas unidades tiveram um custo médio de 20% menor do que as unidades de administração direta e, no mesmo período, tiveram uma produtividade 37,3% maior. E, para não estender o assunto, basta ressaltar que as OSS vêm recebendo diversos prêmios pela qualidade do atendimento.

Não é verdade que houve diminuição de leitos na rede estadual. O governo do Estado não fechou nenhum leito hospitalar nos últimos anos, com exceção dos psiquiátricos, pois nesse caso o governo segue a política de desinternação dos portadores de distúrbios mentais, preconizada pelo SUS. Como é possível falar em redução se o Estado entregou cerca de 4.000 leitos à população desde 1998?

Por fim, é importante esclarecer que, de fato, o atendimento na rede pública ainda tem, infelizmente, os pronto-socorros de hospitais como porta de entrada. Essa realidade, que agora começa a merecer atenção por parte da Prefeitura de São Paulo, é fruto de quatro anos sem investimento na estrutura de atenção primária em saúde, o que gerou o sucateamento de boa parte dos postos municipais e impediu o aumento do Programa de Saúde da Família.

Curiosamente, o sindicalista dirige seus ataques apenas contra o governo do Estado e silencia quanto à responsabilidade do governo federal e ao sucateamento da saúde na administração municipal de São Paulo no período 1998-2002. Isso é lamentável, pois um assunto tão importante como a saúde deveria estar acima das preocupações partidárias.

Luiz Roberto Barradas Barata, 52, médico sanitarista, é secretário de Estado da Saúde de São Paulo.

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