A promessa da revolução pelo mérito pessoal

Brasil Econômico

seg, 23/11/2009 - 8h11 | Do Portal do Governo

O economista e secretário de Educação Paulo Renato está comandando um movimento que já ganha adeptos em Pernambuco, Distrito Federal e Rio Grande do Sul: a utilização da meritocracia para remunerar professores de escolas públicas. Com tantas variáveis que afetam a educação, o esforço individual é suficiente para garantir qualidade?

A utilização de instrumentos privados de gestão costuma ser considerada como uma das saídas para melhorar os processos administrativos do setor público. Porém,uma vez instituídos, tais mecanismos causam polêmica. O exemplo mais recente é a meritocracia para remuneração de professores. Trata-se da avaliação da performance individual como forma de garantir bonificações.

O projeto iniciado no Estado de São Paulo está ganhando adeptos em várias partes do país. Pernambuco já conta com um programa de bonificação por resultados, assim como Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro. O Rio Grande do Sul encaminhou há pouco mais de uma semana um projeto para a Assembleia Legislativa para a criação de um programa de valorização por mérito dos servidores públicos.A aposta desses estados segue a lógica de que melhorar o salário dos professores é uma forma de diminuir o absenteísmo, tornar a carreira do magistério mais interessante e conseguir melhorar os indicadores de qualidade na sala de aula.

Mas as formas de fazer isso criam debates controversos. E o economista Paulo Renato, atual secretário de Educação do Estado de São Paulo, é uma das peças chaves desta discussão.

Ele promete liderar uma revolução no ensino da maior rede de ensino da América Latina, com 5,5 mil escolas, mais de 240 mil professores, cerca de 300 mil funcionários e um orçamento de R$ 15,4 bilhões. E 5,5 milhões de estudantes. Ele afirma estar ciente de que a meritocracia não é unanimidade nem mesmo dentro das corporações.

O compromisso coma educação lhe valeu uma cadeira na Academia Paulista de Educação, como titular nº 33. Uma grande responsabilidade, já que o patrono desta cadeira é o educador Lourenço Filho, um dos autores do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, de 1932 e sua antecessora, a jurista e educadora Esther de Figueiredo Ferraz, primeira mulher a ocupar o posto de Ministra de Estado, quando foi titular do Ministério da Educação, em1982. 

A estratégia de São Paulo foi traçada no Programa Mais Qualidade na Escola, lançado em maio. Em sua primeira fase foi criada a Escola de Formação de Professores, que mudou a forma de ingresso dos profissionais do magistério, agora com base na  realização de um concurso e de um curso de capacitação. O governo também criou duas novas jornadas de trabalho – de 12 e 40 horas semanais -, abriu 80 mil vagas para cargos efetivos e regulamentou a situação dos temporários, instituindo uma prova como requisito para a atuação nas salas de aula. A segunda fase é o Programa de Valorização pelo Mérito, aprovado em outubro pela Assembleia Legislativa. Em entrevista ao Brasil Econômico, Paulo Renato falou sobre as expectativas quanto à mudança no modelo de educação de São Paulo.

O governo paulista está prometendo uma revolução na educação. Como isso será feito?
O Estado de São Paulo tem uma posição de destaque em todos os indicadores de wducação. Mas isto não nos satisfaz. Trabalhamos com quatro eixos de atuação: definir padrões curriculares para São Paulo, com o apoio das escolas para a aprovação do currículo; trabalho de avaliação com indicadores de qualidade; política de bonificação por resultado e reestruturação da carreira do magistério, com nova forma de ingresso, por concurso e curso de formação.

Programas de bonificação não são novidades no serviço público. Qual o diferencial?
A Secretaria de Educação tinha um programa de bônus há anos. O que mudou é que no último ano ele foi modificado para um plano de bônus por resultado. Temos o maior programa de pagamento por mérito e experiência do mundo. Neste ano, foram R$ 590,6 milhões, valor 31% superior ao de 2008.

Como esse plano foi recebido pelos funcionários?
No programa de bonificações , 195 mil funcionários receberam, sendo 158 mil professores. Metade deles ganhou dois salários. Eu assumi a secretaria dez dias após o pagamento das bonificações, no dia 13 de abril, e esperava um ambiente conturbado, já que os sindicatos são resistentes. Mas não ouve reclamações, apenas das escolas boas que não receberam o bônus.

Escolas boas que não atingiram as metas não recebem e ruins dentro das metas recebem?
Esse é o problema: o bônus é um prêmio ao desempenho da escola, pago pela evolução nos indicadores do Idesp (Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo). Se a escola atingiu a meta, todos recebem dois salários a mais. As escolas que já têm bons indicadores, mas não atingiram as metas, não recebem. Estamos estudando como resolver isto.

Como vai funcionar o Programa de Valorização pelo Mérito?
O programa funciona paralelamente às bonificações e é baseado emtrês aspectos: assiduidade, tempo de permanência, e provas, que já começam em janeiro.Assiduidade e permanência afetam diretamente a qualidade do ensino na sala de aula. Nossos levantamentos mostram que os professores faltam em média 30 dias por ano letivo. Os professores também passarão por cursos de atualização, que ajudarão na realização das provas.

O que garante que a meritocracia é adequada para a educação, uma área tão sensível do setor público?
A questão de valorizar pelo mérito é um desafio em qualquer entidade, até mesmo no setor privado. A questão principal é vencer uma resistência cultural. A sociedade brasileira está mais acostumada a programas de valorização igualitários e não pelo mérito individual. Mas acredito que o plano vai motivar os professores, que não receberão só bônus.A cada três anos, terão um aumento salarial que vale para a carreira inteira. Isto tornará o magistério mais interessante.

O Plano Nacional de Educação do governo federal foi lançado na sua gestão como ministro. Como o senhor o avalia?
A maioria das metas vai ser cumprida. Tivemos um grande avanço na educação básica e na redução do alfabetismo. Já conseguimos melhorar a cobertura do sistema,mas o grande desafio é melhorar a qualidade. A boa notícia é que existe uma consciência deste fato, que pode ser averiguada em qualquer um dos indicadores nacionais de ensino.

Educação é considerada um tema pluripartidário pelo governo federal e apoiado pelos partidos. Como isso reflete nas relações estado/governo?
Há uma tendência do governo federal de impor modelos que a constituição nega, sobrepondo ações que no final desperdiçam dinheiro, com recursos que são distribuídos diretamente para as escolas, como o Mais Educação, que oferece apoio técnico e financeiro para escolas. E este não é o caminho. As instâncias federativas têm de ser respeitadas. O que o governo está fazendo é pulverizar o problema. Se existe recurso sobrando, essa distribuição tem de ser articulada com os governos estaduais.