A política de saúde de São Paulo

Gazeta Mercantil - Segunda, 10 de outubro de 2005

seg, 10/10/2005 - 11h39 | Do Portal do Governo

Luiz Roberto Barradas Barata

O Hospital Geral do Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo, recebeu no final de 2004 prêmio do Ministério da Saúde por ter a melhor casa de partos do sudeste. No outro extremo da capital, o Hospital Geral de Pedreira recebeu certificação ISO 9001 para seu ambulatório de especialidades, o primeiro emitido para uma unidade ambulatorial pública no país.

Há muito mais. Seis hospitais estaduais de São Paulo possuem certificado de excelência e qualidade da Organização Nacional de Acreditação, órgão federal. Na região da cracolândia, o Centro de Referência em Álcool, Tabaco e Outras drogas foi premiado pelo Inca como uma das seis unidades do país que melhor combateram o tabagismo em 2003.

No quesito humanização do atendimento, o Hospital Pérola Byington acaba de ganhar o prêmio Top Qualidade Total 2005, do Centro de Integração Cultural e Empresarial de São Paulo. O modelo paulista de Organizações Sociais de Saúde para gerenciamento de hospitais já chegou a outros Estados brasileiros, estabelecendo um novo paradigma de gestão pública de saúde.

Além disso, São Paulo tem o maior programa de assistência farmacêutica gratuita do país, realiza o maior número de transplantes e tem os menores índices de mortalidade infantil e gravidez entre adolescentes, nesse último caso contrariando a tendência nacional.

Todos esses fatos não são mera coincidência e, além disso, têm algo em comum. Tratam-se de unidades e iniciativas do governo do Estado, cujo êxito é fruto de uma política de saúde implementada nos últimos 10 anos e pautada por planejamento, estratégia de ação e prioridade para o setor.

Cabe, de imediato, ressaltar que São Paulo é um dos poucos Estados brasileiros que cumpre integralmente a Emenda Constitucional nº. 29, destinando 12% de sua receita líquida para a saúde. Esse investimento é fundamental para garantir o sucesso das ações de saúde pública alcançado até aqui, em que pesem os inúmeros desafios que temos pela frente. E não se pode pensar em saúde de qualidade sem o devido aporte de recursos.

Paradoxalmente, o empenho exigido dos Estados e municípios no cumprimento do financiamento da saúde não é seguido pelo governo federal, que tem na Desvinculação de Receitas da União (DRU) um mecanismo para remanejar verbas de áreas de saúde e educação para outras áreas.
Além disso, as esferas estaduais e municipais são uníssonas no que se refere à necessidade de ampliação dos tetos financeiros pelo Ministério da Saúde e de um reajuste mais contundente na tabela de remuneração do SUS para os hospitais e unidades conveniadas.

Esse descuido por parte do governo federal vem gerando uma crise sem precedentes entre os prestadores do SUS em todo o país, especialmente no caso dos hospitais filantrópicos, como o Santa Marcelina de Itaquera, no caso de São Paulo, além das Santas Casas existentes no Estado e que por vezes são a única opção de atendimento em saúde de um município.

Para reduzir o déficit dos filantrópicos, governo do Estado vem socorrendo rotineiramente as santas casas com repasse de recursos extras. Somente de 2003 até agora foram enviados cerca de R$ 200 milhões como auxílio. Além disso, metade do chamado “estouro de teto” dos hospitais conveniados ao SUS, e considerados estratégicos, é coberta com recursos do tesouro estadual.

Também é preocupante as diretrizes do governo federal em torno da assistência farmacêutica aos brasileiros, agravada com as recentes crises de abastecimento de medicamentos para portadores de HIV e tuberculose.

Falamos de remédios essenciais, e que não podem faltar, sob risco de comprometer a recuperação dos doentes.
No caso dos medicamentos básicos, as chamadas farmácias populares, que vendem remédios com descontos à população, também representam um equívoco por parte do Ministério da Saúde, já que ferem o princípio de universalidade do SUS. Em outras palavras, o acesso a esses remédios deve ser sempre universal e gratuito, como preconiza a Constituição Brasileira.

O governo paulista vem investindo maciçamente na ampliação da assistência farmacêutica gratuita, por meio do programa Dose Certa, que distribui 40 tipos de medicamentos básicos, entre antibióticos, antiinflamatórios, xaropes, pomadas e anti- ipertensivos, aos 645 municípios do Estado. Somente em 2004 foram repassados 1,2 bilhão de unidades farmacêuticas, e neste ano a quantidade deve pular para 1,5 bilhão. A Secretaria de Estado da Saúde também irá duplicar até dezembro o número de quiosques da Farmácia Dose Certa na capital paulista, que passará de 10 para 20_ esses, sim, com remédios totalmente gratuitos.
Cumpre-nos ressaltar, ainda, que o êxito do modelo de Organizações Sociais de Saúde (OSS) para gerenciamento 18 hospitais estaduais de São Paulo, e que já está sendo adotado de forma similar por Estados como Pará, Minas Gerais e Bahia, além da capital paulista, poderia merecer atenção em nível nacional, expandindo o conceito de gestão profissionalizada, com economia, qualidade e eficiência, de unidades públicas de saúde.

Se queremos, efetivamente, que a saúde no Brasil avance a passos largos, não há tempo nem espaço para experimentações descabidas, muito menos para a omissão diante de questões tão urgentes. Nesse sentido, os bons exemplos dados por São Paulo nos últimos 10 anos deveriam, sem viés partidário ou político, merecer o olhar de Brasília.

Luiz Roberto Barradas Barata, 52, é médico sanitarista e secretário de Estado da Saúde de São Paulo