A Osesp chega ao Rio

Jornal do Brasil - Rio de Janeiro - Sábado, 13 de novembro de 2004

sáb, 13/11/2004 - 14h21 | Do Portal do Governo

Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, sob a regência de John Neschling, encerra turnê nacional que celebra seus 50 anos com concertos hoje e amanhã no Teatro Municipal

Gustavo Leitão

Em seus 50 anos de existência, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) já enfrentou crises típicas de todo grupo do gênero no país: atrasos de salários, demissão de maestros, hiatos e reformulações. Desde 1997, vive uma estabilidade e reconhecimento raros. Prova disso é a quantidade de concertos pelo mundo nos últimos anos. Desde 2000, a orquestra já passou pela Argentina, Peru, EUA, Alemanha e Suíça. Este ano, o cinqüentenário está sendo comemorado com uma turnê por 14 capitais brasileiras, que se encerra hoje e amanhã com apresentações no Teatro Municipal do Rio. Receitas de sobrevivência? O maestro e diretor artístico da Osesp, o carioca John Neschling, não quer saber delas:
– Não existe nenhuma vantagem em fazer 50 anos. Poderíamos estar fazendo 100 tocando mal. O importante é tocar bem e esta receita é muito mais complicada – afirma o maestro.

No caso da Osesp, essa fórmula é composta por partes iguais de excelência dos músicos – entre os mais bem pagos do país – e subvenção do governo estadual. Hoje, a orquestra tem um orçamento de R$ 28 milhões por ano, cinco vezes mais do que no início da atual administração. Para se ter uma idéia, a Orquestra Petrobras Pró Música (OPPM), uma das mais conhecidas do Rio, sobrevive com pouco mais de R$ 6 milhões anuais. Quando assumiu a Osesp, há sete anos, Neschling promoveu uma barulhenta reforma. Realizou um concurso interno que manteve apenas 43 membros da antiga formação e contratou músicos de 16 países. Todos com dedicação exclusiva. Em 2001, demitiu mais sete, que enviaram uma carta de protesto à Secretaria de Estado de Cultura.

– Montamos praticamente uma orquestra nova. A Osesp estava muito tristinha. Era fazer isso ou acabar – lembra Neschling.

Outro diferencial do grupo é a sede própria para ensaios e concertos, também investimento do governo paulista. Um projeto de R$ 44 milhões, executado pela Artech, empresa alemã especializada em acústica, transformou os jardins da estação de trem Júlio Prestes em uma sala de concerto reconhecida como uma das melhores do país, a Sala São Paulo. Depois do pontapé inicial, a participação governamental diminuiu. De 95% do orçamento em 1997, passou a 61% – o restante é coberto pela iniciativa privada. Essa nova proporção foi motivada, principalmente, pelo aumento dos custos da orquestra. Desde que o projeto de reconstrução da Osesp foi posto em prática, a orquestra cresceu consideravelmente. Atualmente, inclui três coros – infantil, juvenil e adulto – e uma orquestra de câmara. São 109 músicos e 350 funcionários no total, incluindo a administração. Também já conta com um acervo de gravações considerável, que inclui a integral das Bachianas, de Villa-Lobos e obras de Camargo Guarnieri.

Fundada em 1954 pelo maestro Souza Lima, a Osesp se consolidou sob a liderança do mítico regente Eleazar de Carvalho, que ocupou o cargo de titular de 1971 até sua morte, em 1996. Sob sua liderança, a orquestra viveu seu auge nos anos 70 e 80, com a criação do Festival de Inverno de Campos de Jordão e dos Concertos para a Juventude e com as transmissões semanais de concertos pela TV Cultura. Apesar das conquistas, a crise financeira sempre rondava o grupo. Os baixos salários, um problema constante durante o período, fez a orquestra minguar de seus 91 músicos iniciais para 54. Chamado para reestruturar a Osesp, Neschling impôs como condição principal poder aumentar os gastos com a folha. Para ele, este é um dos fatores que diferenciam o conjunto de outros como a OPPM carioca, que ele considera “um capricho”.

– A OPPM é uma brincadeira. Não dá para ensaiar três vezes por semana, com músicos que tocam também em outras orquestras. Músico tem que ganhar bem e ter dedicação exclusiva – afirma Neschling, que ganha R$ 800 mil por ano.

A nova fase da Osesp ganhou corpo com uma bem-sucedida turnê internacional iniciada em 2000, com apresentações na Argentina e Peru. Em 2002, a orquestra visitou 18 cidades dos Estados Unidos. Em Costa Mesa, na Califórnia, tocou em teatros de 3 mil lugares. Mas o ponto alto da turnê foi em Nova York, quando a orquestra se apresentou no Avery Fischer Hall lotado, arrancando elogios do The New York Times. A projeção internacional também conta com uma ajuda de peso: o diretor artístico adjunto e regente associado da Osesp, Roberto Minczuk. Ex-pupilo de Eleazar, Minczuk é hoje uma das maiores promessas brasileiras no exterior. Assumiu o comando do Festival de Inverno de Campos de Jordão e, recentemente, o cobiçado posto de regente adjunto da Filarmônica de Nova York.

Depois de ganhar espaço no exterior, foi a vez de excursionar pelo Brasil com uma equipe de 120 pessoas. A Osesp já passou por 13 capitais, como Belo Horizonte, Brasília e Salvador. A turnê serviu para conferir a quantas anda a estrutura dos teatros pelo país. Neschling elogia a acústica de alguns – como Belém e Salvador – e critica outros, como o de Brasília. Outras dificuldades estruturais também ficaram evidentes:

– É muito mais difícil viajar com uma orquestra aqui, onde os vôos são menos freqüentes e os hotéis, precários. Fizemos, por exemplo, uma viagem de Maceió para Aracaju que durou seis horas – conta.

Os dois concertos da orquestra no Rio, com ingressos praticamente esgotados, terão programas diferentes. No sábado, a Osesp executa a abertura da ópera O Guarany, de Carlos Gomes, a suíte O pássaro de fogo, de Stravinsky, e a sinfonia nº 5, de Tchaikovsky. No domingo, é a vez da longa e complexa sinfonia nº 9, de Mahler. No ano que vem, o conjunto segue para países da América Latina. Em 2006, repete a turnê pelos EUA e, em 2007, pela Europa.