A falta que faz a videoconferência

Jornal da Tarde - Sexta-feira, 26 de outubro de 2007

seg, 29/10/2007 - 11h38 | Do Portal do Governo

Jornal da Tarde

Jundiaí nunca tinha visto nada igual: as ruas ficaram desertas, o comércio ficou vazio e foi grande o prejuízo para os comerciantes locais na sexta-feira da semana passada, quando teve de ser montado o maior esquema de segurança que a população daquela cidade já tinha visto para que os acusados da morte do policial militar Nelson Pinto pudessem se deslocar até o fórum da cidade e ali ser ouvidos das 10 às 21 horas. Nossa lei penal prevê a anulação de depoimentos de réus que não sejam feitos pessoalmente ou mesmo os de testemunhas que não sejam acompanhados pelos réus. Ainda não é possível a utilização de meios tecnológicos, como a videoconferência, que poderia permitir que estes assistam ao próprio julgamento sem ter de deixar os presídios de segurança máxima onde vivem. Para cumprir esse preceito legal e sendo obrigatória a presença perante juiz, promotor, advogado e testemunhas, o assaltante de bancos e líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Camacho, o Marcola, foi transportado da penitenciária de segurança máxima, onde cumpre pena, em Presidente Venceslau, no extremo oeste do Estado de São Paulo, a 620 quilômetros da Capital, até Jundiaí, a menos de 100 km. Por questões de segurança, a polícia não divulgou o total de homens ocupados na verdadeira operação de guerra montada para receber os 14 ouvidos dos 19 réus do processo (5 estão foragidos), mas os jornais calcularam que 150 policiais e funcionários da Justiça foram escalados para evitar transtornos capazes de permitir ou facilitar a fuga de bandidos de alta periculosidade e de grande poder de fogo e financeiro.

O absurdo da operação é que 6 réus já tinham sido ouvidos por videoconferência ou carta precatória, mas tiveram de ser ouvidos de novo, pessoalmente. Com toda razão, o promotor Fernando Vianna, do Grupo de Atuação e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), reclamou: “Não faz sentido que a comarca de Jundiaí receba esses réus de alta periculosidade. O cidadão de bem não pode sofrer com isso, e o gasto público com esses deslocamentos é absurdo.” Não bastasse isso, o principal responsável por esses gastos, Marcola, acusado de ser o mandante do crime, e um de seus liderados, Julinho Carambola, se recusaram a prestar depoimento.

Isso ocorreu após decisão unânime (4 a 0) da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou inconstitucional a tomada de depoimentos por sistemas de áudio e vídeo sem a presença do réu diante do juiz. A decisão não leva em conta que a videoconferência é uma forma eficaz, segura e barata de usar a tecnologia a serviço da lei e desconheceu o fato de o advogado do preso processado poder ficar a seu lado na prisão, não havendo, por isso, nenhuma restrição à defesa. A decisão, aprovada pelo Senado anteontem, de torná-la obrigatória poderá pôr fim a absurdos custosos como o episódio de Jundiaí, desonerando os cofres públicos e corrigindo essa injustiça.