A gripe e a vacina

Jornal Bom Dia

dom, 22/04/2007 - 13h38 | Do Portal do Governo

A GRIPE E A VACINA

José Serra

A leve dor no braço no momento da picada não deve impedir ninguém de comemorar uma grande conquista da medicina – a vacina contra a gripe. Os pesquisadores estão convencidos de que, em 75% dos casos, a vacina evita o aparecimento da doença; em 98%, diminui sua gravidade.

A maioria das pessoas atacadas por uma gripe cai de cama e recupera-se em menos de uma semana, quando a cabeça parece uma maionese e os ossos viram um hambúrguer. Esse sofrimento infernal e de curta duração é enganoso.

A gravidade da gripe é definida por três fatores. A virulência do vírus e sua quantidade no organismo de uma pessoa – e também pela condição geral do paciente.

A idade influencia muito. A partir dos 60 anos, o organismo tende a ficar enfraquecido – e as complicações geradas pela gripe se tornam mais perigosas. A pessoa fica sujeita a quadros respiratórios graves, com pneumonia, que podem causar complicações capazes de levar à internação em hospital e até à morte.

Conforme o Grupo Regional de Observação da Gripe, entidade apoiada pela Secretaria de Saúde do governo do Estado, cerca de 15 mil brasileiros morrem, todos os anos, de complicações geradas por essa doença que parece tão inofensiva. Nos Estados Unidos, esse número passa de 20 mil.

Mulheres, homens e crianças convivem com a gripe há milhares de anos – e as boas vacinas têm menos de meio século de existência. Os primeiros registros foram feitos no Egito Antigo, por volta de 1.700 a.C. na Grécia.

Clássica, Hipócritas, o pai da Medicina, fez o que se considera a primeira descrição científica de uma epidemia de gripe, 400 anos a.C.

Os surtos marcaram várias fases do Renascimento Italiano e eram tão freqüentes nos séculos seguintes que, entre 1847 e 1889, quando a gripe desapareceu da Europa, essas décadas foram batizadas como “Período de Eclipse da Gripe”.

Algumas estimativas dizem que a gripe espanhola (1918-1919) provocou 40 milhões de mortos. Foi um holocausto mundial provocado por uma versão especialmente virulenta do vírus.

No Brasil, 65% da população da capital, o Rio de Janeiro, foi afetada. Soldados brasileiros que embarcaram para a Europa, para lutar na Primeira Guerra, morreram antes de chegar ao campo de batalha – vítimas da gripe. Eleito para um segundo mandato, o presidente Rodrigues Alves não tomou posse. Por que? Gripe.

No total, 14 mil pessoas morreram no Rio. No Estado de São Paulo, o número de mortos foi idêntico.

Cronistas da tragédia descreveram um mundo onde faltavam leitos em hospitais, médicos para curar os doentes – e até coveiros para enterrar os mortos.

Entre 1957 e 1958 ocorreu a gripe asiática, que produziu 1,5 milhão de vítimas fatais. Entre 1968 e 1969, a chamada gripe de Hong Kong também fez 1,5 milhão de mortos.

O esforço para combater essas duas epidemias custou uma fortuna estimada em U$ 32 bilhões. Em 1998 a gripe aviária gerou pânico – com justificativa – mas terminou sob controle.

O pesadelo dos tempos passados parece distante, hoje, em função de uma novidade: a vacina. Quando eu era ministro da Saúde, em 1999, introduzi a vacinação gratuita no Brasil, para todo brasileiros com 60 anos ou mais. Mais ainda, fiz um convênio com um laboratório francês com o Instituto Butantã, para a transferência de tecnologia e produção nacional pelo Instituto.

As campanhas foram um sucesso, mas é possível melhorar. Em 2006, 80% da população de São Paulo com mais de 60 anos foi atingida – a meta era ficar em 70%.

O Brasil é um dos países com a melhor cobertura de vacina do planeta. A campanha de 2007, que começa nesta segunda-feira, é uma chance de melhorar esse desempenho. Ao contrário do que muitos ainda imaginam, com gripe ninguém pode brincar.

José Serra é governador do Estado de São Paulo

 

(*) Bom Dia é uma rede de jormais que circula em mais de 70 cidades do Interior do Estado. 

(R.A.)