USP: Vacina desenvolvida no Brasil estabiliza câncer de rim e melanoma

Pesquisa é do professor José Alexandre Marzagão da USP

sex, 02/09/2005 - 20h01 | Do Portal do Governo

Por que as células de defesa do nosso organismo não combatem o câncer? Essa foi a pergunta inicial para cientistas de várias gerações que tentaram achar um meio de ativar o nosso Sistema Imunológico para o reconhecimento e destruição dos tumores.

A história dessa procura começa no final do século XIX, tendo sido responsável pelo surgimento de tratamentos ao longo dos séculos. O problema é que a Imunologia era desconhecida até algum tempo atrás, o que dificultava o estudo desses tratamentos. A função do linfócito, por exemplo, que é reconhecer os organismos estranhos do nosso corpo, só foi descoberta na segunda metade do século XX.

Em várias das tentativas de ativar nossa defesa contra os tumores, os pesquisadores encontraram indícios de que é possível atingir esse objetivo, ainda que a maioria dos experimentos tenha falhado. O professor José Alexandre Marzagão Barbuto, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, explica que “o tumor criou diversos mecanismos de equilíbrio para conviver com o Sistema Imunológico, que são os mecanismos de escape tumoral”.

Desenvolvendo a vacina

Em resposta à pergunta inicial, o professor José Alexandre Barbuto, em conjunto com profissionais do Hospital Sírio Libanês, desenvolveu a Hybricell, a primeira vacina brasileira contra o câncer. Na verdade, o docente explica que, diferentemente das vacinas contra outras doenças, essa “não previne, mas destrói as células cancerosas que já estão no organismo. Na maior parte dos casos ela estabiliza o tumor, mas não o diminui”. Para ele, a vacina seria o tratamento imunológico ideal, porque é específico e ativo, ou seja, é o próprio organismo que age contra e não um corpo estranho.

Mas o desenvolvimento da vacina não foi algo fácil. Outros já haviam pensado nisso, mas todas as tentativas falhavam porque o tumor resistia. Isso aconteceu até que foram descobertas as células desencadeadoras da resposta (células apresentadoras de antígeno). As mais eficientes entre essas células são as dendríticas.

Para se utilizar as células dendríticas, que são raras, os pesquisadores ainda levaram algum tempo, até que foi descoberto um modo de cultivá-las in vitro a partir de células comuns do sangue. Foi essa descoberta que encadeou a pesquisa da José Alexandre Barbuto.

Resultados satisfatórios

Em 2001 o docente recebeu apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) para desenvolver a vacina junto com o Centro de Oncologia e o Laboratório de Patologia do Hospital Sírio Libanês.

Como o número de tipos de câncer é muito alto, os pesquisadores tiveram que escolher entre eles. “Escolhemos dois tipos de tumores metastáticos. O melanoma, que é um tipo de câncer de pele e o câncer de rim. Os dois são tumores ruins de tratar se o diagnóstico e a cirurgia não foram feitos imediatamente. Se eles voltarem, as opções são ruins. Então qualquer coisa que for desenvolvida nessa área é bem-vinda”, explica Barbuto.

Além disso, nos pacientes com esses tipos de tumores a expectativa mediana de vida – quando a doença é metastática – é menor do que um ano, o que faz com que os resultados sejam obtidos rapidamente.

Os resultados publicados são otimistas, como mostra Barbuto: “30 doentes foram tratados, 11 deles tinham melanoma e 19 tinham câncer de rim. 73% dos pacientes que têm melanoma e 89% dos que têm câncer de rim tiveram estabilização da doença”. Essa estabilização citada pelo professor durou, em média, de seis a sete meses. Outro estudo foi feito e o resultado obtido foi o mesmo.

Ao se fazer uma comparação histórica com os outros tratamentos, podemos perceber uma grande diferença. Nos pacientes com melanoma, a sobrevida média é de seis ou sete meses. No câncer de rim a sobrevida média é de nove meses. “A sobrevida mediana dos nossos pacientes com melanoma foi de 13 meses e com câncer de rim foi maior do que dois anos”, conta o pesquisador.

José Alexandre Barbuto afirma que continuará os estudos, visando agora a biologia das células dendríticas, com o apoio da Fapesp. “Eu tenho que entender o que está acontecendo, ou seja, por que parou?”.

Vacina no mercado

O tratamento foi autorizado para aplicações com indicação dos médicos. O protocolo para se fazer a vacina é individual. Os médicos retiram o tumor cirurgicamente e a partir dele fazem a vacina, sendo que cada dose custa cerca de R$3,5 mil. São necessárias duas doses, no mínimo.

O professor ressalta que a Hybricell foi desenvolvida inteiramente no Brasil. Outros países, principalmente Estados Unidos, Itália, Japão, desenvolveram vacinas semelhantes. A cooperação internacional para o desenvolvimento de uma vacina mais eficaz é atrativa, mas está somente nos planos do professor. Nada concreto foi realizado, ainda.

Giulia Camillo / USP Online

J.C.