USP: Traços de depressão e fobia social são encontrados entre estudantes evangélicos

Estudantes de uma faculdade de Teologia, avaliados em pesquisa, demonstraram ter um relacionamento inseguro com os pais

qua, 10/11/2004 - 14h08 | Do Portal do Governo

O que chamou a atenção do pesquisador foi a medição do nível de segurança no relacionamento com os pais: 41% dos estudantes apresentaram um nível médio de segurança, 32% um nível alto e 27% um nível baixo. ‘Esse resultado merece destaque por ter uma grande correlação com índices depressivos’

O forte apego à religião não elimina muitos dos traços de depressão e fobia. Uma pesquisa apresentada ao Instituto de Psicologia (IP) da USP analisou os traços psicológicos de 192 estudantes de uma faculdade de Teologia adventista e verificou que há, entre os avaliados, indícios de fobia social e relacionamentos inseguros com os pais. Em estudos anteriores, o fato é associado a sintomas de depressão.

O psicólogo Florival Scheroki aplicou aos estudantes questionários que avaliavam estilos de apego à figura de Deus, relacionamento interpessoal e nível de segurança construída – confiança, comunicação e proximidade emocional – na relação com os pais. Os adventistas se caracterizam, basicamente, por serem cristãos do ramo protestante (surgidos em meados do século XIX nos EUA) e enfatizarem o cuidado com a saúde corporal e a educação.

Cerca de 70% dos estudantes apresentavam o que se pode chamar de um apego ‘seguro’ à figura de Deus, considerando-o próximo e atencioso. Os demais mostraram uma posição ambivalente, de que Deus é ora próximo, ora distante. Não houve respostas que mostrassem uma posição ‘evitativa’ (de distanciamento completo), típica de ateus. ‘Devemos considerar que o contexto – de freqüência a uma escola religiosa – pode influenciar as respostas’, ressalta o pesquisador.

No que se refere a relacionamentos interpessoais – estilos de apego a pessoas significativas -, 31% se diziam ambivalentes (seguros em certos momentos e apreensivos em outros), 34% seguros, e 35% rejeitadores ou medrosos.

Mas o que chamou a atenção do pesquisador foi a medição do nível de segurança no relacionamento com os pais: 41% apresentaram um nível médio de segurança, 32% um nível alto e 27% um nível baixo. ‘Esse resultado merece destaque por ter uma grande correlação com índices depressivos’, aponta Scheroki.

O questionário avaliou fatores como qualidade da comunicação com os pais, taxa de confiança e nível de afastamento emocional. Os estudantes deveriam aplicar uma escala de validade a afirmações como ‘Meus pais respeitam meus sentimentos’ e ‘Meus pais me ajudam a me entender melhor’.

Fobias

Também foram analisados os índices de agorafobia (insegurança ao se ver sozinho em certas situações) e fobia social (ansiedade diante de contatos sociais). O pesquisador constatou que, entre os avaliados, predominam os traços sociofóbicos. ‘De um lado, eles têm medo do contato humano. De outro, o fato de estarem sozinhos numa situação os assusta menos, provavelmente por considerarem ter uma espécie de ‘companhia de Deus’, que lhes dá segurança’, afirma.

O psicólogo explica que não existe uma relação significativa entre o estilo de apego à figura de Deus e os índices de depressão e fobia. Contudo, a ligação desses índices com o nível de segurança no relacionamento com os pais enriquece a análise quando se considera que ‘Deus’ tem as mesmas características das nossas figuras de ‘apego primário’ – geralmente, o pai ou a mãe.

Esse ‘apego’ adquire maior visibilidade em situações de estresse e ameaça, quando nos voltamos com maior freqüência para o que Scheroki chama de nossos ‘portos seguros’ (pais, Deus, entre outros). Nesse sentido, Deus pode se tornar uma figura substituta da figura primária e criar um grau elevado de segurança individual.

Da Agência USP

M.J.