USP: Sobrecarga mental transforma cuidadores em pacientes

Falta de suporte social aumenta a sobrecarga de cuidadores de idosos com doenças psiquiátricas

sex, 18/02/2005 - 17h52 | Do Portal do Governo

Dentre os principais fatores de sobrecarga para as pessoas que cuidam de idosos com demência ou depressão destacam-se a questão financeira, as alterações de comportamento do idoso e a percepção de que há uma relação de dependência.

A psiquiatra Cintia Maria C. B. Matsuda, da Faculdade de Medicina (FM) da USP, investigou a sobrecarga e o grau de sintomas de ansiedade e depressão entre esses cuidadores. A pesquisa faz parte de um projeto maior, empreendido pela FM, que tem entre seus objetivos a elaboração de medidas de intervenção e assistência a idosos com demência ou depressão e a seus respectivos cuidadores.

Cintia aplicou a 60 cuidadores um questionário para obtenção de dados sócio-demográficos e avaliação do grau de sobrecarga e sintomas de morbidade psiquiátrica (ansiedade e depressão). Todos os entrevistados eram responsáveis por idosos atendidos pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da FM, dos quais metade sofria de depressão em grau moderado ou grave e, a outra metade, de demência em grau leve ou moderado. Os idosos também foram avaliados, por meio de questionários sócio-demográficos e análises do nível de dependência e presença de sintomas de doenças psiquiátricas.

Resultados

Entre os cuidadores, os principais fatores de sobrecarga são a questão financeira, alterações de comportamento do idoso e a ‘percepção de uma relação de dependência’. ‘A percepção do cuidador quanto à gravidade da deterioração do quadro clínico do idoso parece ser mais importante para a determinação da sobrecarga do que as escalas objetivas de avaliação de piora desse mesmo quadro’, explica a psiquiatra. Além disso, muitos dos cuidadores se queixam de dificuldades em manter as atividades cotidianas e apontam o surgimento de dúvidas, sobretudo a respeito dos cuidados necessários ao paciente.

A maior parte dos idosos recebe cuidados de familiares, geralmente cônjuges ou filhos. Cintia conta que, freqüentemente, a motivação para se cuidar de um idoso com demência ou depressão está na noção de dever, de que é necessário retribuir algo à pessoa doente. Por outro lado, algumas pessoas realmente sentem gratificação ao cuidar do idoso, o que funciona como um elemento redutor da sobrecarga. ‘Trata-se de um aspecto que merece maior investigação’, diz a pesquisadora.

Suporte

Devido à ocorrência gradativa de sintomas de ansiedade e depressão, muitos dos cuidadores acabam se tornando pacientes. Esse efeito, além de perverso sob o ponto de vista social, acaba por sobrecarregar o sistema público de saúde. De acordo com a psiquiatra, é comprovado que quanto menor o nível de suporte social, maior a sobrecarga do cuidador.

‘No Brasil, a rede de apoio formal (de assistência profissional) ainda é muito escassa’, informa Cintia. Segundo ela, os principais cuidadores são familiares, que desconhecem a possibilidade de se cobrar políticas de apoio do Estado. ‘Muitos deles reclamam da falta de apoio, contando apenas com suporte familiar’. A psiquiatra ressalta a importância de campanhas educativas e defende o cumprimento de estratégias, previstas no Estatuto do Idoso, de treinamento profissional e suporte aos cuidadores.

Flávia Souza – Agência USP