USP: Salgadinho enriquecido com pulmão bovino reduz anemia

Incidência de anemia caiu de 60% para 11,5% em experiências realizadas com crianças em creches de Teresina

sex, 26/03/2004 - 19h18 | Do Portal do Governo

A anemia, doença causada pela insuficiência de ferro no sangue, atinge em média 45% das crianças brasileiras, segundo estatística divulgada esta semana pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Para tentar reverter este quadro, pesquisadores do Grupo de Estudos de Propriedades Funcionais de Alimentos da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP criaram um salgadinho rico em ferro, com uma matéria-prima barata: o pulmão de boi. A incidência de anemia caiu de 60% para 11,5% em experiências realizadas com crianças em creches de Teresina (PI).

O professor José Alfredo Gomes Arêas, que coordenou o projeto, explica que os salgadinhos foram produzidos com 78% de grão-de-bico, 12% de milho e 10% de pulmão bovino, extraído em condições adequadas de higiene. O pulmão utilizado foi seco e teve a gordura original extraída antes de ser incorporada ao produto final. ‘Os salgadinhos comuns usam apenas milho e têm um nível protéico baixo e muitas gorduras saturadas estimulando o aumento do colesterol e da obesidade’, diz Arêas. ‘Utilizando o pulmão de boi, a quantidade de proteínas teve um aumento de 20%.’

A eficiência dos salgadinhos foi testada em duas creches de Teresina (PI), nas quais a incidência de anemia atingia 60%. Numa das creches, crianças de 2 a 7 anos receberam um pacote de 30 gramas do salgadinho desenvolvido na FSP. ‘Depois de 55 dias, o índice de anemia foi reduzido para 11,5%, um nível comparável ao de países desenvolvidos’, diz José Alfredo Arêas. ‘Na outra creche, onde não foi fornecido o salgadinho, a incidência de anemia foi de 58%, não muito diferente do valor original.’

O professor relata que cada 100 gramas do salgadinho enriquecido contêm 10 miligramas de ferro. ‘O aproveitamento do ferro contido no pulmão bovino é 140% maior que o do sulfato ferroso, usado como medicação contra a anemia’, afirma. Arêas aponta que o quilo do pulmão bovino custa cerca de 20 centavos, mas embora esteja disponível em larga escala, não é usado na alimentação humana. ‘Para dar um aspecto agradável, foi preciso modificar a textura do pulmão e agregá-lo a outros alimentos’, explica.

Arêas explica que a falta de ferro reduz a captação de oxigênio pelo sangue, provocando nas crianças restrições no sistema imunológico, no aprendizado e no processo de crescimento. ‘Em algumas regiões do Brasil, a incidência de anemia pode chegar a 70%’, aponta. Segundo o professor, a Organização Mundial de Saúde (OMS) calcula que um terço da população mundial sofra de anemia, especialmente devido a queda do consumo de alimentos ricos em ferro, especialmente a carne. ‘Para modificar este quadro, é preciso usar todos os recursos.’

De acordo com José Alfredo Arêas, algumas indústrias se interessaram no salgadinho enriquecido com ferro, mas nenhuma iniciou sua produção em grande escala. ‘Embora o custo de produção tenha um aumento médio de 9 a 10 centavos por pacote de 30 gramas, as empresas poderiam oferecer aos consumidores um produto de maior qualidade’, diz. As experiências com crianças em creches de Teresina foram coordenadas pela professora Regilda Saraiva dos Reis Moreira, da Universidade Federal do Piauí.

Mais informações: (11) 3066-7736, ramal 229, e-mail jagareas@usp.br

Júlio Bernardes – Agência USP