USP: Raio-X pode causar mutações em células da mucosa bucal

Raio-X odontológico pode alterar DNA de células da mucosa de revestimento bucal

qui, 25/11/2004 - 20h34 | Do Portal do Governo

O uso do raio-X na odontologia, mesmo em baixa intensidade, pode provocar danos ao DNA das células que revestem internamente a boca. Em pesquisas realizadas no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, o grupo da professora Gláucia Maria Machado-Santelli colheu amostras da mucosa oral de pessoas que passaram por radiografias panorâmicas (de toda a arcada dentária) e periapicais (focando alguns poucos dentes), por determinação de dentistas, e observou que parte das células teve seu núcleo atingido por alguma espécie de alteração – relacionadas à morte celular e, de algum modo, ao câncer.

‘Analisamos o material colhido antes da exposição ao raio-X e depois de 10 ou 13 dias. Nesse intervalo, houve um aumento de 50% no número de células em apoptoses’, diz Gláucia. A morte por apoptose acontece devido devido à grande quantidade de lesões causadas no DNA da célula. Segundo a professora, a morte dessas células, por si, não tem um efeito drástico. Porém, sua ocorrência pode retardar a renovação do epitélio de revestimento da boca, além de indicar que houve algum problema com a exposição ao raio-X.

Além da apoptose, também foram observadas no estudo formações de micronúcleos. Por não provocarem a morte celular, os micronúcleos são o principal alvo de preocupação da pesquisadora. ‘Ao atingir células que estão em constante processo de divisão e diferenciação, a radiação faz com que o material genético presente no núcleo se divida de forma desordenada e sofra mutações’, explica.

Quando em perfeito funcionamento, as células do corpo humano (com exceção dos óvulos e espermatozóides) se dividem por um processo chamado mitose – a partir do qual uma célula dá origem a duas outras idênticas. Gláucia afirma que a exposição ao raio-X leva ao aparecimento de fragmentos cromossômicos. Isso faz com que o material genético não se separe da maneira adequada e provoque a formação de um pequeno núcleo (micronúcleo) ao lado do núcleo ‘principal’.

‘Após 13 dias, o número de micronúcleos nas células do revestimento bucal de indivíduos que passaram por exposições pontuais de raio-X praticamente triplicou’, revela a professora. ‘Nas células epiteliais crescidas em cultura, que estão em constante processo de divisão ‘os micronúcleos, que antes da exposição estavam presentes em 0,5% das células, após 72 horas, passaram a ocorrer em 2% delas.’

Câncer

De acordo com Gláucia, essas alterações não provocam, de imediato, grandes impactos na saúde das pessoas. No entanto, ela alerta para o fato de que as pequenas mutações genéticas ocorridas na mucosa oral por conta do raio-X, principalmente os micronúcleos, podem estar ligadas ao aumento do risco de câncer.

‘O raio-X possui efeito genotóxico, ou seja, influi negativamente no DNA, cindindo as cadeias. O hábito de fumar e beber em excesso possui propriedade semelhante e contribui para o aumento de mutações malignas’, diz. Segundo a professora do ICB, células cancerígenas normalmente originam-se de pequenas alterações genéticas que vão se somando conforme as células atingidas se dividem e se diferenciam. ‘Por não estar isento de riscos, o uso do raio-X na odontologia deve ser recomendado criteriosamente, somente quando necessário’, recomenda.

Tadeu Breda – Agência USP