USP: Ração especial faz animais produzirem ‘leite light’

Mais magro e nutritivo, leite também tem propriedades anticancerígenas

seg, 26/01/2004 - 12h44 | Do Portal do Governo

Experimentos demonstraram que ao sintetizar menos gordura, o animal tem suas exigências dietéticas de energia reduzidas. Resultado: ele come menos, ou come o mesmo e produz mais leite, que é mais diluído

Um leite com mais proteína, menos gordura e com propriedades anticancerígenas. Este produto, criado por cientistas do Departamento de Zootecnia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP e da Universidade de Cornell (Nova York, EUA), é formulado com a adição de um composto de ácidos graxos na ração dos animais leiteiros.

Além da melhor qualidade do leite, a ração especial pode aumentar a quantidade de litros produzidos pelos animais. Segundo o pesquisador Dante Pazzanese Lanna (Esalq), um tipo de ácido linoléico presente na ração, ao ser absorvido pelo animal, inibe o processo de síntese de gordura em seu organismo – tanto no tecido adiposo, quanto na glândula mamária.

Experimentos conduzidos em colaboração com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) demonstraram que, ao sintetizar menos gordura, o animal tem suas exigências dietéticas de energia reduzidas. ‘Ele precisa comer menos, porque sintetiza menos gordura, ou come o mesmo e produz mais leite, que é mais diluído’, declara Lanna.

O pesquisador explica que o estudo começou a ser feito com o objetivo de entender o que regula o teor de gordura do leite. ‘Sabíamos que os animais naturalmente apresentam a síndrome de baixo teor de gordura do leite. Ainda em Cornell, durante meu período de doutorado, um colega identificou que esta síndrome era causada por um composto produzido no estômago deles, que aparecia com o uso de certas rações.’

Ao identificar o composto (o ácido linoléico conjugado, ou CLA), a equipe descobriu como fabricá-lo em laboratório e como manipular sua produção. ‘O ácido está no óleo de soja, então o empregamos para o processo de desenvolvimento da ração.’

Lanna afirma que os estudos dos efeitos do CLA se iniciaram ainda na Universidade de Cornell, onde fez seu doutorado e pós-doutorado, mas foi com a equipe da Esalq que ele demonstrou o aumento no teor de proteína. ‘Foi também na Esalq que identificamos a possibilidade de aumentar a produção de leite.’

Questão de mercado

O cientista afirma que atualmente o consumidor de leite procura mais as versões desnatadas e semi-desnatadas. Por outro lado, vem caindo o consumo de leite integral e manteiga (sub-produto da fabricação de leite desnatado). ‘Portanto a gordura do leite tem perdido seu valor ao longo das últimas duas décadas. O resultado da pesquisa contribui para deixar de produzir algo que tem valor decrescente e simultaneamente aumentar a produção de proteína do leite, cada vez mais valorizada.’

Atualmente a empresa detentora da patente do produto o está apresentando para órgãos regulatórios dos EUA e Canadá. Ele passará por uma série de estudos com o objetivo de comprovar suas propriedades e segurança. O processo levará entre dois e três anos, segundo Lanna. ‘Esta empresa está montando uma fábrica na Europa, visando os mercados europeu e norte-americano.’

A patente da descoberta pertence à Universidade de Cornell (para o efeito sobre o teor de gordura) e à USP e Fapesp (no caso do efeito no teor de proteína e produção de leite).

Agora que a técnica passou para o setor privado, o grupo de Lanna está trabalhando em outra frente de pesquisa: estudar mecanismos que permitam que o próprio animal transforme as gorduras da dieta em CLA dentro do estômago, em vez de produzir o composto em laboratórios para depois adicioná-lo à ração. ‘Estamos tentando entender quais são as bactérias no estômago dos ruminantes que produzem esses CLAs. A idéia é aumentar a concentração destas substâncias benéficas à saúde e capazes de alterar a composição do leite.’

Por Fábio de Castro, da Agência USP de Notícias

C.C.