USP: Programa Esporte Talento promove educação por meio de atividades físicas

Projeto reúne crianças e adolescentes de várias faixas etárias

qua, 25/08/2004 - 13h22 | Do Portal do Governo

Com apenas 16 anos, o jovem Marcos Rocha Lima se considera um cidadão completo. Tímido, até pouco tempo atrás, preocupava a mãe por ter dificuldades de relacionamento. Hoje, é um garoto desembaraçado e vive rodeado de amigos. A vitória sobre sua dificuldade ele credita à rotina que passou a obedecer desde que começou a freqüentar o Projeto Esporte Talento (PET), executado pela Universidade de São Paulo, em parceria com o Instituto Ayrton Senna.

Tendo como objetivo principal o desenvolvimento humano, recebe crianças e adolescentes menos favorecidos, de 8 a 17 anos, que moram e estudam na região do entorno da cidade universitária, principalmente das comunidades São Remo, Jaguaré e Rio Pequeno, para a realização de atividades pedagógicas no Centro de Práticas Esportivas da USP, o Cepeusp. Integra o Programa Educação pelo Esporte, iniciativa do Instituto Ayrton Senna, com desdobramento para todo o Brasil em parceria com 13 universidades e apoio da Audi AG, da Alemanha.

Segundo o coordenador do PET, Marcos Vinicius Moura e Silva, a admissão das crianças e adolescentes é feita por meio das escolas públicas da região e leva em conta critérios socioeconômicos. “Procuramos atender prioritariamente os que têm menos oportunidades”, explica. Também há a preocupação da participação dos familiares. “Para que o programa possa causar impacto local, são fundamentais as parcerias da escola e da família”, diz o coordenador.

Uma chance e tanto

Inscrito pela mãe na sua escola, Marcos R. Lima foi um desses jovens selecionados. Começou no projeto em 1999, com 12 anos, e passou por grande transformação. “Quando entrei era gordo e tímido. Aqui, recebi ajuda de muitas pessoas para melhorar a minha comunicação. Aprendi sobre vários esportes e fiz amigos”, enumera.

Há um ano de sua despedida, Marcos não imagina ainda o seu dia-a-dia sem as atividades, mas já sabe o que levará como bagagem para a vida adulta: “Conquistei respeito, aprendizado de convivência e o hábito de praticar esporte”.

Assim como Marcos, seus amigos André, Bruno, Eduardo e Jean também tiveram progressos desde que passaram a fazer parte da iniciativa. Jean Carlos Teixeira, 15 anos, diz que em um ano aprendeu a ser mais espontâneo; descobriu sua tendência para o basquete e melhorou na escola. “Eu gosto muito, pois antes ficava na rua”, conta. Com a mesma idade, André Silva Santos não lembra quando entrou – “faz tempo”, diz – mas se recorda direitinho dos problemas que carregava: “Meu pai era sempre chamado na escola. Hoje, estou mais tranqüilo”, comemora o garoto, que diz apreciar todas as ações, mas prefere o espaço e a liberdade.

Bruno Gabriel dos Santos e Eduardo de Oliveira Gonçalves, ambos com 16 anos, valorizam a oportunidade, principalmente a de tê-los tirado da rua. Bruno chegou ao Esporte Talento no ano passado, com o apoio dos professores. “Eu estava esperando a minha vez. O projeto me ajudou, pois eu vivia zoando, fui até preso”, revela, orgulhoso por ter mudado de rumo. Eduardo freqüenta o local desde 2001 e acha que teve uma chance e tanto. “Gosto de todas as atividades”, avalia.

Quatro pilares

As ações do Esporte Talento são planejadas e orientadas por uma equipe multidisciplinar, formada por coordenadores e educadores bolsistas de cursos de educação física, pedagogia, psicologia e artes. São 40 monitores que atuam dentro do princípio da co-educação, que inclui a participação da garotada no planejamento diário. O intuito é estimular o desenvolvimento de competências pessoais, sociais, cognitivas e produtivas entre a meninada.

Portanto, não há uma grade fixa de atividades. Elas são definidas dia-a-dia, de acordo com o interesse do grupo. Tendo o esporte como eixo, abrangem leitura, debates, brincadeiras, jogos, artes, escrita e informática, dentre outras propostas. “ A idéia não é preparar grandes atletas, nem ganhar competições esportivas, mas estimular o crescimento de potenciais a partir da relação do esporte com os aspectos da vida cotidiana”, explica Marcus Vinicius, formado em educação física.

A iniciativa parte da premissa de que as regras do esporte são as mesmas da sociedade. Questões como frustração, derrota, vitória, união, divisão de responsabilidades e cumprimento de ordens são vivenciadas por meio da prática de modalidades esportivas e discutidas posteriormente. A troca de idéias em grupos é realizada no início e no final de cada dia. “Praticando esportes, os jovens não desenvolvem só capacidades físicas e motoras como também ganham noções de valores básicos, como solidariedade, convivência em grupo e até de democracia”, ressalta o coordenador.

O PET, assim como o Programa Educação pelo Esporte, trabalha em consonância com o paradigma da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) sobre as perspectivas da educação, que contemplam quatro pilares fundamentais; Aprender a Ser, Aprender a Conviver, Aprender a Fazer e Aprender a Conhecer. Eles são considerados os indicadores de um processo educacional que busca a formação integral do ser humano.

Peteleco, Pequeninos, Unidos e Petelecão

Os participantes freqüentam o projeto quatro dias por semana (segunda, terça, quinta e sexta-feira), das 8 às 11 horas, ou das 14 às 17 horas, em horário alternado ao da escola. A quarta-feira é reservada ao planejamento. Participam cerca de 400 jovens entre 8 e 17 anos. Todos têm direito a atendimento médico, em casos de emergência, dentro do próprio Cepeusp e lanche oferecido pela Nestlé. Dentro da faixa etária delimitada, o educando pode permanecer no PET o tempo que quiser. Em média, a freqüência é de dois anos.

As crianças e os adolescentes são divididos em grupos, de acordo com a faixa etária: Peteleco, de 8 a 10 anos; Pequeninos, 11 e 12; Unidos, 13 e 14 e Petelecão, de 15 a 17 anos. Cada um é orientado por dois coordenadores e uma equipe de bolsistas. No primeiro grupo, as atividades têm caráter de iniciação esportiva generalizada, com destaque para as combinações das habilidades motoras básicas e a exploração de vivências e desafios com a utilização de brincadeiras e jogos populares.

Segundo Gisele de Camargo, uma das coordenadoras do Peteleco, o trabalho é fundamentado no conteúdo que as crianças trazem. “Nós nos baseamos nos problemas do grupo para traçar estratégias e objetivos e abordamos questões como respeito e amizade”, diz a educadora.

Integrante da turma da tarde do Peteleco, Vitória Esteves Fiuza, 10 anos, considera a participação no grupo pura diversão. A menina, que antes passava o período numa escolinha, prefere muito mais a alternativa atual. “Sempre falo para minha mãe que não estou cansada para não faltar.”

Com a mesma idade, seus colegas Gabrielle Aparecida Saraiva Bezerra, Andressa Dutra Lima e Mateus dos Santos também acham que o projeto melhorou a rotina de cada um deles. “Antes de vir para cá, só assistia à televisão e dormia à tarde. Era muito chato”, conta Gabrielle.

Atletismo a jogos populares

No segundo grupo, ocorre a iniciação esportiva específica, com a utilização de elementos comuns às diversas modalidades esportivas individuais e coletivas para aumento das atividades motoras e identificação das preferências. As opções de esportes vão desde o atletismo até os jogos mais populares, como futebol e vôlei. É a preparação para o grupo Unidos, no qual é necessário o consenso para escolha das modalidades. Nessa fase, são eleitas duas ou três, para serem praticadas durante cada semestre.

Os adolescentes de 13 e 14 anos recebem orientação específica e direcionada para a modalidade escolhida, mas sem perder a atenção sociocultural.

Com a turma de 15 a 17 anos são trabalhadas as possibilidades de aperfeiçoamento nas modalidades, com destaque para a contribuição do esporte para a saúde e como prática de lazer. Há também a iniciação de um processo para orientação profissional e para ação comunitária. No ano passado, foi desenvolvido com esse grupo o Projeto Jovem Protagonista, que possibilitou aos participantes estagiarem em seções do Cepeusp.

Pontapé inicial

A USP foi a primeira parceira do Instituto Ayrton Senna no Programa Educação pelo Esporte (PEE). A idéia de união das duas instituições surgiu um ano depois da criação do IAS, em 1995, em razão do vínculo afetivo do piloto com a universidade, já que a raia de corrida do Cepeusp era o local escolhido por ele para se exercitar quando estava em São Paulo. A aliança foi o pontapé inicial para a expansão do PEE. A Audi integrou a parceria, dando apoio financeiro.

Surgia, assim, o Projeto Esporte Talento, que no início tinha seu trabalho focado no crescimento do potencial atlético da garotada. Com o amadurecimento do programa, a proposta foi ampliada, passando a ter o esporte como estímulo para a educação integral de jovens carentes.

Parcerias

O Programa Educação pelo Esporte também atua em parceria com projetos que têm características similares às suas e promove encontros para a troca de experiências. Um exemplo ocorreu em maio, com a realização da V Olipet, a Olimpíada do Esporte Talento, que teve a participação de crianças e adolescentes da Fundação Gol de Letra, do Projeto Esporte Solidário e da escola parceira EMF Ibrahim Nobre. Coerente com os princípios do programa, a Olipet tem como objetivo a participação, ao invés da competição.

Cepeusp: três décadas de esporte e lazer

O Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp), construído há mais de 30 anos, é um complexo poliesportivo, cuja finalidade é planejar, coordenar e executar as ações necessárias à prática de atividades físicas, esportivas e recreativas no âmbito da universidade, estendendo sempre que possível esses benefícios à comunidade externa.

Dispõe de campos de futebol, estádio, quadras cobertas e descobertas (para várias modalidades), conjunto aquático, pista de atletismo, ciclovia, auditório, velódromo, espaços para lutas, ginástica artística e xadrez e da Raia Olímpica (conjunto esportivo destinado à prática do remo e da canoagem, instalado paralelamente à marginal do Rio Pinheiros), que tem vestiários, sala de musculação, pista rústica, barcos e garagem.

Simone de Marco
Da Agência Imprensa Oficial