A família de genes Homeobox, que tem um importante papel no desenvolvimento embrionário, também está relacionada com o aparecimento de carcinomas epidermóides de boca (CEB), um tipo de câncer bucal. Esta constatação é possível hoje graças a uma linha de pesquisa pioneira do Laboratório de Patologia Molecular da Faculdade de Odontologia (FO) da USP. ‘Somos o único grupo de pesquisa no mundo a pesquisar as relações entre os genes da família Homeobox e o CEB’, afirma o odontólogo Fábio Daumas Nunes, coordenador do laboratório.
As suspeitas de Nunes em relação aos Homeobox se deram por causa da proximidade entre o câncer e o desenvolvimento embrionário. No embrião, estes genes atuam principalmente no sentido de controlar o equilíbrio entre a proliferação celular e a posterior especialização de cada uma delas, chamada de diferenciação. ‘Já o carcinoma ocorre quando a célula se diferencia pouco e permanece se multiplicando.’ A quebra deste equilíbrio, com a proliferação celular desordenada, caracteriza o tumor maligno.
Utilizando a técnica denominada hibridização in situ, foi possível perceber que nos CEB a expressão destes genes foi perdida. A idéia é que, de alguma forma, a estimulação do funcionamento dos Homeobox faça com que a ordem natural seja restaurada, cessando a proliferação exacerbada das células, que voltariam a se diferenciar. Segundo Nunes, a expectativa é que as pesquisas selecionem alvos terapêuticos para o tratamento da doença, provavelmente por meio da estimulação dos genes.
Outra possibilidade é que seja possível definir marcadores de prognóstico, fornecendo aos médicos uma previsão mais precisa da possível evolução tumoral em cada paciente. ‘Com isso poderemos direcionar melhor o tratamento em cada caso.’
Estudos
Esta linha de pesquisa já produziu diversos trabalhos acadêmicos (três monografias de pós graduação já foram defendidas, e existem ainda cinco doutorados e um mestrado em andamento). Porém, Nunes ressalta que o estudo da família Homeobox, que é composta por muitos genes, está ainda em sua fase inicial. No momento, a ênfase dos trabalhos está na definição de quais são os agentes que provocam a perda da expressão destes trechos gênicos.
Até o fim do mês de junho, o laboratório deve ter seu primeiro artigo científico publicado em revistas internacionais. Nunes atenta para a importância da divulgação, pois é de interesse coletivo que outros laboratórios e centros de estudo passem a se aplicar nesta linha de pesquisa, tão recente.
O próximo passo, previsto para ser iniciado já no próximo ano, será direcionado à estimulação da expressão dos Homeobox em células de carcinoma in vitro. ‘Existe a possibilidade de serem um fator que, se for reposto com uma droga, conduza à restauração da ordem.’
Colaboraram para a realização dos estudos a Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), que forneceu amostras de CEB, e o Projeto Genoma Câncer, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que forneceu dados sobre os Homeobox.
André Benevides – Agência USP