USP: Oficinas de teatro ajudam na discussão e ensino de práticas de saúde

Psicólogo conseguiu abrir caminhos para a educação em saúde de grupos sociais marginalizados

ter, 02/08/2005 - 11h23 | Do Portal do Governo

Utilizando conceitos de Paulo Freire e do Teatro do Oprimido, criado por Augusto Boal, o pesquisador conseguiu resultados muito rápidos com grupos tradicionalmente de difícil acesso a estranhos.

Além de fazer bem para a alma, o teatro pode ajudar a melhorar a saúde de alguns praticantes. Aliando exercícios teatrais a debates, o psicólogo Alexandre Oliveira Leme conseguiu abrir caminhos para a educação em saúde de grupos sociais marginalizados, como adolescentes que vivem nas ruas, homossexuais e étnicos. ‘Só o fato destas pessoas entrarem em cena e pensarem em outras possibilidades gera um nicho de reflexão diferenciado para elas’, afirma ele.

O estudo, que será apresentado à Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, partiu da necessidade de criação de uma prática educativa concreta para a discussão de procedimentos de saúde na atualidade. Utilizando conceitos de Paulo Freire e do Teatro do Oprimido, criado por Augusto Boal, o pesquisador conseguiu resultados muito rápidos com estes grupos, tradicionalmente de difícil acesso a estranhos. ‘O teatro acaba facilitando o diálogo, por que difere da terapia onde todo mundo sabe que algo incomoda e que é este o motivo de estarem ali.’

Com a encenação de acontecimentos cotidianos, é possível criar questionamentos que facilitam o diálogo com fatores da realidade. As pessoas acabam por colocar elementos factíveis de suas vidas onde tudo não passa de uma representação. ‘O processo educativo e terapêutico não fica tão doloroso, pois tudo é colocado em uma suposta terceira pessoa’, explica. A temática relacionada à saúde vai surgindo naturalmente, baseada em situações presentes no dia-a-dia dos participantes e sugeridas por eles próprios, como violência, sexo, drogas e morte.

Dando ênfase a estes aspectos de saúde, os exercícios proporcionam o surgimento de reflexões que serão posteriormente discutidas. O psicólogo relata que pelo menos uma hora é reservada, ao fim de cada aula, para a realização destas ‘rodas de conversa’. ‘Este é o momento que os alunos podem tirar de forma mais esclarecedora as dúvidas sobre os temas trabalhados. Muitas vezes eles vêm com conclusões próprias’.

Como parte do pensamento do Teatro do Oprimido, Leme se propõe a interferir cada vez menos no caminho que as discussões possam tomar, informando apenas o necessário diante da demanda que surge. ‘Eu tento trabalhar aquilo que é fantasioso no conceito deles, preservando o que é cientificamente sustentável’. Ele acrescenta que temas como a camisinha e crendices populares, por exemplo, são dos mais recorrentes.

Melhorias

Segundo o pesquisador, este espaço de aprendizado e crítica produz muitos efeitos positivos nos alunos, que embora sejam altamente subjetivos também são de fácil percepção. Por exemplo, apenas o fato de as sessões serem bastante intensas já ocasionava uma drástica redução no uso de drogas por parte daqueles com este problema, principalmente os adolescentes que moram na rua. ‘Com toda a movimentação das oficinas, eles simplesmente não tinham tempo para isso.’

Leme conta diversas experiências de melhora em termos psicológicos e sociais dos participantes, que ele estima terem sido em torno de 100. Em muitos destes casos, a visão crítica que estas pessoas adquirem ao encenar problemas e situações de suas vidas as ajuda a encarar a realidade de uma maneira mais segura. No entanto, o objetivo focal do trabalho é educativo, e não terapêutico. ‘Eu não posso deixar que eles se tornem dependentes de mim, isso seria opressor.’ Segundo ele, a maior realização das oficinas é que os integrantes consigam passar a técnica adiante, como multiplicadores. ‘Eu tento ensinar que para a saúde de um estar boa, é preciso que a das outras pessoas também esteja’, conclui.

André Benevides, da Agência USP

M.J.