USP: Método desenvolvido na FMRP vai facilitar diagnóstico de hantavirose

Desenvolvimento do antígeno só foi possível após a identificação da variante de hantavírus

seg, 23/08/2004 - 20h44 | Do Portal do Governo

A equipe do Centro de Pesquisa em Virologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP está patenteando uma proteína de Hantavirus que ao ser empregada em testes sorológicos permite o diagnóstico de casos de hantavirose. Antes, isso só era possível com antígenos importados dos Estados Unidos e da Argentina. ‘Pretendemos tornar o diagnóstico mais fácil e mais rápido’, comenta o professor Luiz Tadeu Moraes Figueiredo, coordenador do estudo. ‘Até então, só dois lugares faziam essa detecção, com antígenos doados por centros de pesquisa do exterior: o Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, e o Instituto Evandro Chagas de Belém (PA)’.

O desenvolvimento do antígeno só foi possível após a identificação da variante de hantavírus responsável pelos casos da grave Síndrome Pulmonar e Cardiovascular por Hantavírus (SPCH) na região de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. ‘Encontramos apenas hantavírus da variante Araraquara, mas ainda não descartamos a hipótese de existirem outras, talvez até causando infecções assintomáticas ou doença mais branda’, conta o pesquisador.

Diversas variantes de hantavirus têm sido encontradas só no continente americano. Nos Estados Unidos são comuns o Sin Nombre, o New York e o Bayou. Na Argentina, o Andes, na Bolívia, o Rio Mamoré e, no Paraguai, o Laguna Negra. No Brasil já foram identificadas as variantes: Juquitiba, Araraquara, Castelo dos Sonhos e Anajatuba. ‘O Araraquara é muito parecido com o Andes argentino’, comenta o professor Figueiredo.

A identificação da variante local do hantavírus e o desenvolvimento do antígeno são resultados de uma pesquisa que vem sendo feita desde 1998, quando os primeiros casos de SPCH foram observados na região de Ribeirão Preto. ‘Como era uma doença nova, os médicos tinham muita dificuldade em diagnosticá-la a tempo. Então resolvemos estudar suas características clínicas, a fim de estabelecer formas mais eficientes de identificação’, lembra Figueiredo.

Em algum tempo, a equipe do professor já tinha desenvolvido um fluxograma para ajudar no diagnóstico. ‘Um paciente jovem ou adulto, antes saudável e que começa a ter febre e falta de ar. Imediatamente o médico pede um raio-x de tórax. Quando os dois pulmões estão comprometidos com pneumonia, ele deve pedir um hemograma’, explica o professor. Se o hemograma apontar redução de plaquetas e concentração de hemácias, o paciente é diagnosticado clinicamente como SPCH e deve ser encaminhado imediatamente para hospital com recursos de terapia intensiva.

Figueiredo conta que também foi necessário fazer um trabalho alertando os profissionais da terapia intensiva na região. ‘Ao contrário de outras doenças em que o paciente em choque pode ser hidratado com grandes quantidades de líquido para se recuperar, na SPCH isso pode ser fatal’. Isso porque, nesta doença, o líquido do sangue vai para o pulmão, extravasando dos capilares para os interstícios e alvéolos, o que causa insuficiência respiratória. Se o paciente receber líquidos em grande volume, o pulmão vai se encher ainda mais, agravando a insuficiência respiratória e levando à morte. ‘Quando o paciente com SPCH entra em insuficiência respiratória, também surge o choque, a pressão arterial vai a zero e o coração começa a bater mais fraco. Então, orientamos para que ele receba drogas que ajudam o coração a bater com mais força’, explica o professor.

Hantavirose

O diagnóstico rápido da hantavirose é fundamental para garantir ao paciente uma chance de sobrevivência. ‘De dois a sete dias após o início dos sintomas, o doente pode desenvolver uma insuficiência respiratória fortíssima, agravada pela falência cardíaca, e falecer’, lembra o professor. ‘Se ele for diagnosticado cedo, vai para a terapia intensiva antes que o quadro piore’.

Até hoje foram diagnosticados cerca de 400 casos de hantavirose no Brasil. Só na região de Ribeirão Preto foram 31, dos quais mais de 50% foram a óbito. A doença atinge principalmente pessoas em contato com o meio rural e é contraída pela inalação de poeiras contendo resquícios da urina e das fezes de roedores do campo. O roedor mais comumente infectado pelo vírus Araraquara é o Bolomys laziurus, conhecido como rato do rabo peludo, para quem o vírus é aparentemente inofensivo.

Márcia Blasques, especial para a Agência USP