USP: ECA recupera a história do teatro paulista pelos arquivos da censura

Escola de Comunicações e Artes está montando um banco de dados com informações extraídas do arquivo

seg, 10/11/2003 - 10h00 | Do Portal do Governo

Desde o início de 2002, uma equipe da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP está montando um banco de dados com informações extraídas do arquivo da censura paulista sobre peças de teatro, que entraram no processo de liberação entre os anos de 1939 e 1970.

O material produzido terá os títulos e resumos de todas as peças, informações sobre o gênero a que cada uma pertence, nomes de autores, diretores, atores, músicos e outras pessoas envolvidas na produção. Além disso, os locais e datas de exibição, datas dos processos, nomes dos censores, dos órgãos oficiais, comentários e resultados da censura e outras considerações acerca de cada caso.

Os 6 mil processos do arquivo são compostos pelas peças – algumas delas inéditas de artistas como o Palhaço Piolin e Manuel da Nóbrega –, informações sobre as montagens, as autorizações dadas pela Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (SBAT) e documentos adicionados por exigência de vários órgãos de censura, estaduais e federais, que atuaram no Estado durante os governos do período.

‘O controle era amplo e irrestrito. Desde as escolas e clubes que quisessem encenar uma peça de final de ano até as grandes companhias internacionais tinham de se submeter. Então temos todo o teatro desse tempo documentado aqui’, comenta a professora Maria Cristina Castilho Costa, coordenadora do projeto.

Não existem registros sobre a ida dos processos para a ECA. ‘Ex-alunos do professor Miroel Silveira contam que ele guardava o arquivo como um segredo. Quando acabou a censura, por volta de 1985, ele soube que o material seria queimado, foi ao DDP e trouxe tudo para a ECA. No entanto, ninguém tem certeza de como isso aconteceu’, conta Cristina.

Escritor e crítico teatral, Miroel Silveira foi professor do Departamento de Artes Cênicas da ECA e morreu em 1988. Depois de catalogados e digitalizados, os processos deverão ser entregues ao Arquivo do Estado.

‘Bois de piranha’

A pesquisa de Cristina Costa sobre o arquivo diz respeito ao processo da censura: ‘O que acontecia era uma longa negociação, que começava quando o empresário pedia a liberação da peça, que ia para um censor e voltava. Depois o censor assistia a um ensaio, para avaliar gestos e roupas. Apresentado o espetáculo, o público também podia pedir a censura, que às vezes passava a instâncias superiores.’

Na opinião da pesquisadora, o processo era possivelmente um ritual invariável. ‘Às vezes uma peça de duzentas páginas tinha duas palavras riscadas, que o autor já sabia que eram proibidas. É possível que essas palavras fossem colocadas para serem cortadas, como “bois de piranha’, no lugar de outras”, relata Cristina.

Além da censura, a pesquisadora aponta outros temas que podem ser abordados pelo arquivo, como expressões de época, o papel das mulheres, a relação do teatro com o cinema, televisão e rádio e, ainda, os grupos estrangeiros (alemães, lituanos, italianos, espanhóis), que faziam teatro amador para preservar suas línguas e culturas.

Lucas Oliveira Telles – Da Agência USP
Da Agência Imprensa Oficial

(AM)