USP: Brasil se candidata para receber radiotelescópio de US$ 1 bilhão

SKA é um arranjo de radiotelescópios que abrange uma área coletora de um quilômetro quadrado

seg, 26/04/2004 - 20h05 | Do Portal do Governo

O Brasil acaba de se candidatar para receber um projeto internacional de radioastronomia que envolve recursos da ordem de US$ 1 bilhão. O Square Kilometer Array (SKA) é um arranjo de radiotelescópios que abrange uma área coletora de um quilômetro quadrado.

O responsável pela candidatura brasileira, professor Jacques Lépine, diretor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG), dá uma idéia das dimensões do projeto: ‘É como se fosse um agrupamento de 100 antenas de 100 metros de diâmetro’, diz. A candidatura foi lançada no início de abril.

Segundo Lépine, a realização do SKA revolucionaria completamente a pesquisa em muitas áreas da astronomia, desde o estudo dos primórdios do Universo até a procura de vida fora do sistema solar. ‘Com uma sensibilidade muito grande e um campo de visão muito amplo, o radiotelescóprio poderá, por exemplo, observar planetas em volta de estrelas, ver o que acontece em volta de buracos negros, observar o nascimento das primeiras galáxias e ser utilizado, inclusive, na procura de sinais artificiais extraterrestres’.

No momento, o comitê internacional que estuda a implementação do projeto busca o melhor local possível no Hemisfério Sul, para que o instrumento esteja em operação por volta de 2015. O comitê reúne instituições de pesquisa da Austrália, China, Canadá, França, Alemanha, Itália, Holanda, Polônia, Rússia, África do Sul, Espanha, Suécia, Inglaterra, Índia e EUA.

Lépine representa um grupo de radioastrônomos brasileiros que inclui membros da USP, da Universidade Mackenzie, do INPE e da Universidade de Brasília. ‘Os pesquisadores se uniram espontaneamente, sem designação oficial, para tentar instalar o projeto no Brasil’.

Depois de estudos preliminares, o grupo brasileiro enviou ao consórcio internacional, no início de abril, uma proposta de instalação do instrumento na região do Cerrado brasileiro, a cerca de 300 quilômetros de Brasília. Segundo o cientista, toda a área ao sul da capital federal foi excluída por não oferecer condições adequadas – há uma anomalia na ionosfera em toda essa região, que prejudica a captação das ondas desejadas.

Excluindo-se a Amazônia e as áreas de maior densidade populacional, concluiu-se que o Cerrado oferecia as condições ideais. ‘Sugerimos três locais, bastante próximos: um no nordeste de Goiás, um no sudoeste da Bahia e um no noroeste de Minas Gerais (ver mapa ao lado).

Segundo Lépine, o relatório inclui estudos climatológicos, sismológicos, dados de temperatura, velocidade do vento, quantidade de precipitação, aspectos da geografia do local, da economia e da política do país e de sua história na área da astronomia. ‘Tudo é considerado satisfatório, inclusive a proximidade com Brasília e Goiânia, que possibilita acesso a aeroportos e universidades. Se o país for selecionado, haverá também estudos de impacto ambiental’.

Concorrência acirrada

O cientista diz que Argentina, África do Sul, Austrália e outros países também se candidataram para receber o SKA. Ele declara que o projeto, além de benefícios científicos, traria vantagens econômicas e sociais para o país. ‘Além da interação científica que proporciona um grande projeto internacional, atraindo parcerias universitárias, haveria um investimento enorme, tanto em infra-estrutura, como fabricação de antenas e equipamentos. Todos os materiais que serão adquiridos criam um mercado importante. Depois que o aparelho estiver em funcionamento, vai gerar mais empregos – guardas motoristas, pessoal de limpeza, restauração, manutenção, técnicos, engenheiros’.

Lépine afirma que o aparelho seria complementar, em termos de freqüências, ao projeto ALMA, um imenso arranjo de radiotelescópios para ondas milimetricas e sub-milimétricas que está em construção no deserto do Atacama, no norte do Chile. ‘Nos últimos anos, a comunidade científica internacional tem avaliado qual seria o próximo passo da radioastronomia, depois da construção do ALMA, que capta freqüências de 300 gigahertz. Chegou-se a conclusão que o ideal seria construir um aparelho complementar que captasse comprimentos de ondas maiores, de 170 megahertz até 22 gigahertz’.

O ALMA, por detectar ondas de freqüência muito alta, precisou ser instalado no deserto do Atacama, num platô de 5 mil metros de altitude. O custo de operação num local como este, no entanto é muito grande, segundo o cientista. ‘Nas freqüências mais baixas, as ondas de rádio não sofrem tanta interferência atmosférica e não precisamos ficar num local tão desconfortável.

Segundo Lépine, a sensibilidade do radiotelescópio está ligada à área coletora, por isso o arranjo de antenas precisa ser tão grande. ‘Os sinais que nos interessam são muito fracos, mas somando-se o que captamos de uma área coletora grande, lidamos com uma energia maior, que nos permite trabalhar com estes sinais’.

Além da grande área coletora, é preciso que as antenas estejam dispostas com uma distância considerável, para aumentar a chamada ‘resolução angular’ do telescópio. ‘A resolução angular determina o quanto se consegue distinguir dois objetos muito próximos um do outro. O SKA prevê uma resolução angular maior que a do Hubble’, afirma.

Segundo Lépine, a área coletora do SKA é 100 vezes maior que o VLA (Very Large Array), que funciona atualmente nos EUA.

Mais informações: (11) 3091-4762 ou e-mail jacques@astro.iag.usp.br

Fábio de Castro – Agência USP