Unesp: Pesquisa conclui que jovens copiam padrões de mundo de ficção criados pelas telenovelas

O estudo buscou identificar como os jovens interpretam o discurso da TV

qua, 06/11/2002 - 20h29 | Do Portal do Governo

Reunir-se em frente à televisão após o jantar para assistir à telenovela, mais que um hábito tornou-se um ritual nos lares brasileiros. Cultuada, a novela dita moda, linguagem, hábitos e contribui para a alienação dos jovens. É o que constatou a psicóloga Valéria Vanine em sua dissertação de mestrado ‘Adolescência e telenovela: uma perspectiva crítico-interpretativa’, orientada pelo também psicólogo Ubaldo Silveira, do Departamento de Serviço Social, da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da UNESP, campus de Franca. O estudo buscou identificar como os jovens interpretam o discurso da TV.

Realizada com 58 estudantes de classe média, com idades entre 16 e 20 anos, a pesquisa, que teve como base a telenovela Torre de Babel, mostrou que os adolescentes tinham uma compreensão distorcida da realidade proporcionada pela imagem de mundo perfeito difundida nas telenovelas.

Segundo a psicóloga, é na adolescência que formamos nossa personalidade social e ficamos mais suscetíveis a qualquer tipo de influência. ‘Dessa forma, padrões difundidos pelas novelas são copiados’, diz. ‘Compramos a idéia ilusória de um mundo perfeito, em que todos os problemas são resolvidos, o mal é punido e o bem sempre vence. Romântico, mas irreal’, afirma.

Embora problemas sociais também sejam abordados, para os jovens, a trama e o destino dos protagonistas são priorizados. ‘Isso os torna acríticos e eles acabam naturalizando questões sociais graves que passam a considerar normais ou comuns’, alerta. A pesquisa mostra, ainda, que temas sobre drogas e homossexualismo exibidos em Torre de Babel são encarados pelos estudantes como problemas particulares dos personagens e não da sociedade. ‘É um erro, pois se alienam dos problemas sociais’, explica. Na percepção dos adolescentes entrevistados, o personagem de Claudia Raia, vilã na trama, merecia um fim trágico como suicídio ou assassinato. ‘O fato de não considerarem a hipótese de ela ir para a cadeia e pagar por seus crimes mostra a falta de senso de justiça’.

Outro problema detectado pela pesquisadora é o da construção de mitos. Espelhando-se nos protagonistas, os jovens os idolatram e ignoram suas atitudes erradas, para as quais sempre buscam justificativas. Edson Celulari, que interpretava Henrique, era para as meninas o estereótipo de homem perfeito e para os rapazes o modelo a ser seguido. ‘O fato, no entanto, de trair a mulher não era recriminado por eles, que encontravam na falta de amor ou na personalidade da esposa a desculpa para o deslize do mocinho’, afirma.

A identificação com personagens é outro fator importante. Os adolescentes se comparam com os personagens ditos mais belos, bem-sucedidos, ou ainda com aqueles que rompem com os padrões sociais. A alienação desses adolescentes, segundo Valéria, pode ser revertida desde que se aplique uma prática de politização e conscientização social. ‘O problema não é assistir à telenovela, mas é necessário o desenvolvimento de um senso crítico e de mudança que escape do mundo fantasioso criado pela teledramaturgia’, finaliza.