Tecnologia: IPT inaugura túnel de vento

Aparelho permite estudar o impacto físico de uma tempestade ou detectar para onde será levada, pelo vento, a fumaça de uma fábrica

qua, 05/05/2004 - 18h20 | Do Portal do Governo

Um equipamento recém-inaugurado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) poderá ajudar a indústria paulista a aumentar a segurança de edificações e a resolver problemas ambientais. Segundo o chefe do laboratório de Vazão do IPT, Marcos Tadeu Pereira, o túnel de vento permite, por exemplo, estudar o impacto físico de uma tempestade sobre uma ponte ou detectar para onde será levada, pelo vento, a fumaça de uma fábrica.

O primeiro trabalho previsto para o novo equipamento é o estudo da trajetória do urano caso haja um vazamento no Centro Experimental de Aramar, em Iperó, onde a Marinha constrói um submarino nuclear. Uma equipe do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo (USP), coordenada pelo meteorologista Amauri Pereira de Oliveira, estudou essas possíveis trajetórias durante quatro anos, por meio de cálculos matemáticos. Com o túnel, os pesquisadores vão poder simular o processo fisicamente.

Segundo a meteorologista Jacyra Soares, da equipe do IAG, os ensaios no túnel de vento aumentam a segurança dos resultados já que colocam à prova todos os cálculos matemáticos. No caso de Iperó, o estudo será feito com uma maquete da região. Os técnicos simularão vazamentos em condições atmosféricas similares às que ocorrem no local e com isso poderão detectar para onde o vento levará o urano, em que espaço de tempo isso ocorrerá e que parte da região deverá ser desocupada primeiro pela Defesa Civil. O trabalho, de acordo com Jacyra, vai durar pelo menos um ano porque serão simulados vários cenários diferentes como noite, dia, chuva, sol e outras possibilidades.

Estudo semelhante, de acordo com Marcos Tadeu, pode ser feito em relação à fumaça eliminada pela chaminé de uma fábrica. Simulando a trajetória desses resíduos é possível saber se estão indo parar, por exemplo, em uma zona residencial. Detectado um problema como esse, a solução pode ser encontrada por meio de testes feitos no próprio túnel. Segundo ele, mudanças na altura ou na posição da chaminé em geral são suficientes para que o vento leve a fumaça a outro local mais adequado como, por exemplo, uma região desabitada.

Marcos Tadeu afirma que as simulações no túnel de vento também podem detectar falhas nos filtros de ar das grandes indústrias. Esses filtros, que costumam ter o tamanho de um edifício de três ou quatro andares, possuem placas que atraem e retêm o pó, permitindo, assim, que a fumaça chegue ao ambiente com o índice mínimo exigido pelos órgãos de proteção e fiscalização ambiental. Ocorre que a circulação desequilibrada do ar dentro do túnel pode sobrecarregar algumas placas, deixando outras sem trabalhar. O resultado é que o pó excedente nas placas sobrecarregadas acaba indo parar na atmosfera. Um ensaio no túnel de vento, segundo Tadeu, detecta as causas desse desequilíbrio e revela a maneira correta de introduzir e fazer circular o ar poluído no filtro para que sua eficiência seja recuperada.

Agora e possível fazer um diagnóstico mais realista dos resíduos industriais

Além das aplicações ambientais, o túnel do IPT pode ser utilizado para simulações mecânicas. Marcos Tadeu dá o exemplo da ponte Rio-Niterói. ‘Há uns cinco anos houve uma oscilação de 60cm devido a um vento de 120km/h’. Segundo Tadeu, a estrutura não tinha sido convenientemente testada em túnel de vento. Ele conta que foram feitos novos ensaios em um túnel canadense, e a ponte recebeu amortecedores que garantem sua estabilidade mesmo com ventos fortes. ‘Agora quando tiver um vento como aquele, os amortecedores vão trabalhar, mas a ponte vai ficar no lugar’.

Tadeu disse que já está negociando com várias empresas a realização de simulações mecânicas no túnel de vento. Uma delas é a Embraer, que ensaiará um pedaço da asa de um avião com o fim de melhorar sua performance. A Petrobrás, segundo Tadeu, provavelmente testará os raisers que levam o petróleo dos poços até as plataformas e navios. São tubulações flexíveis, localizadas muito próximas umas das outras, e os ensaios são feitos para verificar a possibilidade de choque entre elas. Esse tipo de estudo já tinha sido feito pelo IPT em outro equipamento e, de acordo com Tadeu, deverá prosseguir, com mais recursos, no túnel recém-inaugurado.

A terceira empresa é uma instaladora de antenas de microondas para telefonia, cujo nome ainda não pode ser revelado, que pretende dar a suas torres a aparência de árvores com a instalação de galhos. Segundo Tadeu, esses galhos serão testados no túnel ‘para que, ao primeiro vento, não saiam voando pela cidade’. Ele disse que fará um modelo de árvore com um metro de altura, em escala geométrica com a torre real, e colocará os galhos expostos ao vento. Segundo Tadeu, na árvore modelo é possível calcular qual a força que irá incidir sobre a torre real. ‘Por meio de cálculos, a equipe de engenharia vai determinar a espessura e a dimensão adequadas desses galhos para que eles possam suportar ventos de uma determinada velocidade’.

Marcos Tadeu ainda não sabe quanto custará a hora de ensaio no túnel de vento, ‘até mesmo porque cada simulação tem suas próprias características’. No caso de uma torre como a da empresa de telefonia, ele estima que o trabalho completo saia em torno de R$ 25 mil. A vantagem para a indústria, segundo Tadeu, não seria o preço, que provavelmente se equivalerá ao dos túneis de vento do Exterior. O ganho, em sua opinião, está na disponibilidade do equipamento porque as agendas dos túneis estrangeiros estão sempre lotadas. A segunda vantagem seria a economia de tempo e dinheiro já que agora não será mais preciso mandar modelos e profissionais ao exterior para a realização dos ensaios.

Amauri Oliveira, do IAG, destaca mais uma vantagem. Segundo ele, os cálculos matemáticos que são feitos quando uma fábrica vai ser implantada ou decide aumentar sua produção são muito restritivos. O motivo disso é que, pela falta de uma verificação física, o poder poluente de determinadas fontes precisa ser superestimado. ‘Com o túnel de vento vamos poder ter um diagnóstico mais realista’, diz ele, lembrando que isso diminuirá as restrições e dará mais flexibilidade às indústrias. Amaury também lembra que a existência desse equipamento no Brasil permite que as empresas façam revisões periódicas de seus ensaios, coisa que dificilmente conseguiam quando era preciso levar os modelos para serem testados em túneis do Exterior.

Do ponto de vista acadêmico, Jacyra Soares afirma que somente com os ensaios de Iperó o túnel irá gerar muitas teses de mestrado e doutorado. Tadeu também acredita que o novo equipamento terá um papel importante para a Universidade, mas alerta para o fato de que os próprios trabalhos acadêmicos serão importantes também para a indústria, na medida em que irão formar mão-de-obra especializada.

Túneis de vento já existiam no Brasil há alguns anos, um deles no próprio IPT, mas em dimensões que não permitiam o ensaio de grandes estruturas. Marcos Tadeu conta que tempos atrás foi procurado por duas montadoras que precisavam testar automóveis de motor 1.000 com o ar-condicionado em funcionamento. Para que o teste fosse feito, o carro tinha que caber inteirinho dentro do túnel. No equipamento que o IPT possuía naquela época isso era impensável. No novo equipamento, com um espaço de testes que mede 25m de comprimento, 3m de largura e 2m de altura, o teste dos carros 1.000 poderia ser realizado sem problemas.

O túnel de vento custou R$ 1 milhão e levou quase três anos para ficar pronto. A maior parte desses recursos, R$ 700 mil, foi liberada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Os R$ 300 mil restantes foram custeados pelo próprio IPT. Segundo Marcos Tadeu, o equipamento saiu muito barato porque sua tecnologia já estava desenvolvida. ‘Como tínhamos a experiência de ter construído outro túnel menor, esse custo foi grandemente amortizado porque não tivemos que inventar nada. Apenas refizemos os cálculos do outro túnel para este maior’.

Sylvia Leite – IPT