Saúde pública: Violência doméstica contra idoso é mal notificada

Estudo da USP revela que muitas das agressões são cometidas por parentes próximos

ter, 19/10/2004 - 11h30 | Do Portal do Governo

Do Portal da USP
Por Flávia Souza

‘Os idosos que fazem boletins de ocorrência são relativamente independentes. Não há registros a respeito daqueles que, por alguma doença, são completamente dependentes de outras pessoas’.

Grande parte das agressões domiciliares contra idosos é cometida por parentes como filhos, netos, genros e noras. Num estudo apresentado à Escola de Enfermagem da USP de Ribeirão Preto (EERP), a enfermeira Cheila Cristina Leonardo de Oliveira Gaioli analisou 87 ocorrências de violência domiciliar contra idosos registradas na cidade em 2002. De acordo com a pesquisadora, é preciso criar, com urgência, programas de educação familiar e detecção de abusos.

A pesquisa mostra que entre os 5.233 registros de exame de corpo de delito realizados na cidade, em 175 deles as vítimas tinham idade acima de 60 anos. Destes, 100 correspondiam a moradores de Ribeirão Preto e 87 registravam violência em domicílio.

O estudo revela também que houve uma mudança do perfil do idoso vítima desse tipo de agressão. Enquanto o senso comum e trabalhos anteriores mencionam as mulheres viúvas como alvos típicos da violência domiciliar, Cheila constatou que a maior parte dos maus tratos (58,6%) foi cometida contra idosos do sexo masculino.

A enfermeira também analisou os tipos de lesões sofridas de acordo com a Classificação Internacional das Doenças (CID-10). O estudo mostra que 33,5% apresentaram traumatismo superficial de ombro e braço, e 33,3% mais de um tipo de lesão. Uma das ocorrências registrava abuso sexual e duas se referiam a queimaduras. A maioria dos idosos (57,4%) não recorreu a atendimento médico.

Subnotificação

Cheila chama a atenção para a insuficiência dos registros de maus tratos a idosos. ‘Muitas vezes o profissional da saúde é o único a detectar o abuso, mas a informação não chega oficialmente ao conhecimento institucional’, aponta. ‘Os idosos que fazem boletins de ocorrência são relativamente independentes. Não há registros, por exemplo, a respeito daqueles que, por alguma doença, são completamente dependentes de outras pessoas.’

Além de não haver muitos recursos ao alcance de médicos e enfermeiros, grande parte dos idosos agredidos procura esconder a ocorrência desses atos. ‘Geralmente o idoso tem medo ou vergonha de denunciar, por dependência ou afeto familiar’, afirma a pesquisadora. Outro aspecto preocupante está na dificuldade em se detectar o abuso psicológico, como negligência e agressões verbais.

Recomendações

Segundo Cheila, é preciso criar políticas de educação familiar, medidas de detecção de violência domiciliar e programas de proteção às vítimas de maus tratos. ‘O que temos é uma sociedade despreparada para lidar com as necessidades do idoso’, diz. Ela recomenda a implementação de uma ‘enfermagem educativa’, em que tanto os familiares quanto os idosos sejam informados a respeito dos cuidados necessários e dos mecanismos de proteção a direitos.

Cheila defende, ainda, a criação de uma rede de apoio social em que os profissionais de saúde atuem em conjunto com o setor judiciário. Ela sugere a criação de um programa de identificação interno ao Programa de Saúde da Família. Assim, caberia também ao profissional da saúde identificar casos de abuso e informá-los às instituições responsáveis.

Mais informações podem ser obtidas no site www.usp.br
V.C.