Sala São Paulo conta um pouco da nossa história

Considerada uma das melhores salas de concerto do mundo, espaço mantém as portas abertas também para visitantes

ter, 12/02/2002 - 12h48 | Do Portal do Governo


Conhecer a Sala São Paulo, localizada no hall da antiga Estação Ferroviária Júlio Prestes, região central da Capital, é rever um pouco da história paulista. O prédio inaugurado no fim da década de 30 é uma verdadeira viagem no tempo. Ele guarda informações valiosas sobre arquitetura e as transformações políticas, econômicas e culturais da época. Restaurada pelo Governo do Estado e adaptada para transformar-se na mais moderna sala de concertos da América Latina e sede da Orquestra Sinfônica (Osesp), a construção teve suas características originais conservadas.

A Sala São Paulo virou um cartão postal da cidade. Além de concorridos concertos e eventos que lotam o local, também abre suas portas diariamente para visitas monitoradas. A assistente social Ercília Machado ficou maravilhada com o que viu. ‘Estou animada porque o Poder Público está resgatando nossa história. Na reforma, conservaram as molduras, o piso e a arquitetura. Ainda lembro da cidade que conheci há 50 anos’, afirmou. Ercília mora na Capital e esteve na Sala São Paulo três vezes, para visita monitorada e para assistir a espetáculos. Já Wlademir Moscheta, que mora a mais de 400 quilômetros da Capital, em São José do Rio Preto, aproveitou sua estada por aqui para ver como ficou o espaço depois da restauração que acompanhou pelos jornais. ‘Sou aficionado por música, principalmente erudita. Só não assisti a apresentação da orquestra porque não tive oportunidade’, lamentou.

Estrada de Ferro Sorocabana foi criada por barões do café

O roteiro de Ercília e Wlademir começou na bilheteria da Sala São Paulo. Eles pagaram os ingressos e aguardaram na cafeteria, junto com os respectivos grupos, a chegada dos monitores que os acompanhariam. ‘A visita começa no Foyer, que é o hall principal da Estação Júlio Prestes’, explica a coordenadora de monitoria, Andréa Vial. Nesse ponto, os monitores contam um pouco da história da Estrada de Ferro Sorocabana, criada pelos barões do café para transportar o produto até o Porto de Santos. ‘Nós falamos sobre a estrada de ferro e o ciclo do café para explicar a construção da estação’, disse Vial.

A Júlio Prestes foi construída para ser a sede e o ponto de partida da Estrada de Ferro Sorocabana. As obras foram iniciadas em 1926, mas a Estação só foi inaugurada em 1938. Dificuldades financeiras e crises políticas provocaram sucessivas paralisações, num período de instabilidade, principalmente para São Paulo. Em 1929, a queda da Bolsa de Valores de Nova Iorque derrubou o preço do café. Além disso, o Estado passou por duas revoluções, a de 1930 e a de 1932.

O monitor conta ainda uma breve biografia do arquiteto responsável pelo projeto, Christiano das Neves. Figura polêmica da arquitetura paulista, Neves nasceu no município de Casa Branca e estudou nos Estados Unidos. Ele desenvolveu projetos para a Estrada de Ferro Central do Brasil e para as obras não executadas das estações iniciais no Rio de Janeiro e em São Paulo. ‘O projeto da Júlio Prestes foi muito criticado pelos modernistas porque foi apresentado em 1925, três anos após a Semana de Arte Moderna, e tem todas as características contra as quais eles estavam se pronunciando. Em jornais existem textos, cartas e críticas nos quais Oswald de Andrade discutia divergências de estilo com Christiano’, conta Vial.

Neves baseou-se na Grand Central Station (1913) e na Pennsylvania Station (1910), ambas em Nova Iorque, para desenvolver o projeto da Júlio Prestes. Seguiu princípios da École de Beaux Arts de Paris e usou ornamentos ao estilo Luis XVI. ‘Quando abordamos o estilo empregado e as características do edifício, já mencionamos algumas das intervenções realizadas. Esse jogo entre novo e antigo é a grande tônica do projeto de revitalização. Falamos de restauro e revitalização, dois projetos paralelos que aconteceram aqui dentro ‘, explica a coordenadora.

Características ideais para sala de concertos

O grupo passa então para o salão dos arcos. ‘Quando entramos nessa área, sempre vemos uma expressão de surpresa no rosto das pessoas. É um espaço muito bonito’, observa Andréa Vial. Nessa área, o monitor fala sobre as características arquitetônicas originais e as intervenções para transformar o espaço em sala de concertos. ‘O arquiteto buscou dialogar o tempo todo entre função original e função contemporânea. Mesmo nos detalhes, ele sempre teve essa preocupação. Por exemplo, na sustentação, que poderia ter uma viga qualquer, ele preferiu fazer um diálogo com os arcos do edifício. A repetição desses arcos dá a idéia de uma linha de trem, fazendo referência à função original’, destaca a monitora.

O prédio da Estação Júlio Prestes possuía características ideais para abrigar a sala de concertos e ser a nova sede da Sinfônica do Estado. Além do foyer da entrada, dois halls auxiliares e um grande salão central, a sala tem mil metros quadrados de piso e pé-direito de 24 metros. Isso cria o que se chama, no jargão acústico, proporção de caixa de sapatos, ideal para salas de concertos. Além disso, os ornamentos formam reentrâncias na superfície das paredes, que contribuem muito para a melhor distribuição do som. ‘Essa série de coincidências arquitetônicas influenciaram na escolha do espaço para esse fim’, explica Vial.

A reforma, que transformou o prédio da Estação Júlio Prestes em complexo cultural, durou um ano e meio e custou R$ 44 milhões. O grande salão que se tornou sala de concertos foi o foco das atenções do projeto. A sala seguiu os mais modernos parâmetros técnico-acústicos. Ganhou cobertura, o piso foi rebaixado, e o prédio recebeu isolamento acústico. A grande inovação tecnológica foi a construção de um teto móvel, formado por placas que podem ser abaixadas ou levantadas para ajustar a qualidade de som, de acordo com o tipo de música a ser tocada. O mecanismo é controlado por computador e sustentado por 170 toneladas de estrutura metálica.

Visitas devem ser marcadas por telefone

Atualmente, a Sala São Paulo possui acústica, segundo especialistas, melhor que a de muitos teatros-sede de orquestras do mundo. A obra de restauração e adaptação foi reconhecida internacionalmente. Em 2001, a Sala foi considerada o melhor projeto de uso público do mundo pela Fédération Internacionale des Professions Immobilières (FIABCI), que conferiu o Prix d’Éxcellence ao espaço.

Além de incluir a Capital paulista no roteiro dos grandes concertistas, tem levado muita gente à antiga Estação Júlio Prestes. Em dois anos, a Sala recebeu cerca de 200 mil pessoas, atraídas por quase 230 espetáculos, entre concertos, desfiles de moda e entregas de prêmios, entre outras atividades.

As visitas monitoradas, que duram em média 40 minutos, acontecem a partir do dia 18 de fevereiro. ‘Normalmente, as visitas são feitas nos horários de intervalo dos músicos, que usam o espaço para estudar e ensaiar’, explicou a diretora da Sala São Paulo, Rita Okamura. As visitas devem ser agendadas pelo telefone (11) 3337-5414. O contato pode ser feito dia da visita, com formação de grupos com até 40 pessoas.

Cíntia Cury