Reforma agrária: Luta pela terra concentra movimentos diversificados

Estudo da USP constata que existem diferenças entre as lideranças dos diversos movimentos de luta pela terra

qui, 24/07/2003 - 10h14 | Do Portal do Governo

Do Portal da USP
Por Leonardo Leomil

O movimento camponês no Brasil ainda está em processo de formação e os agricultores que pertencem a estes grupos passam por uma ‘revolução diária’. ‘Essas pessoas estão aprendendo a reivindicar sem ficar apenas esperando’, diz Carlos Alberto Feliciano, que apresentou seu estudo O Movimento Camponês Rebelde e a Geografia da Reforma Agrária, no Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.

O pesquisador defende que o governo não deve conversar apenas como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). ‘Há diferenças entre as lideranças dentro dos movimentos sociais rurais. Não é um único grupo que vai fazer a reforma agrária’, afirma Feliciano. Segundo ele, as características do campo brasileiro e das famílias camponesas são diversificadas.

Feliciano visitou áreas de acampamentos rurais do Estado de São Paulo entre 1985 e 2002, onde manteve contato com todas as lideranças. ‘Até dezembro de 2002, havia cerca 90 acampamentos no Estado’, conta. Ele constatou a formação de um movimento amplo, que ele denomina Movimento Camponês Moderno, em que a base são as famílias de agricultores sem-terras lutando diariamente por melhores condições de vida independentemente de legendas.

Além do MST, existem outros movimentos de luta pela terra. Alguns surgiram de dissidências entre os lideres e outros vieram do sindicalismo rural. Mas em todos eles a base são as famílias. ‘Em um acampamento, quem manda são as famílias. Se elas não concordarem com a coordenação não seguem as orientações do movimento’, afirma. A revolução diária que Feliciano descreve em seu trabalho é a luta pelo acesso ao meio de produção e por uma vida melhor. Segundo ele, não há grandes diferenças entre os diversos movimentos em sua base. ‘Existem famílias que eram do MST, foram para outro movimento e depois voltaram’, explica.

A diferença entre os movimentos está nos princípios das lideranças. ‘Eles não atuam juntos. As bases se unem quando há necessidade de ‘brigar’, quando há divergências sobre em qual área atuar e como cada grupo quer mostrar sua identidade’, descreve o pesquisador. Essa, segundo Feliciano, é uma das características do Movimento Camponês Moderno. O pesquisador lembra que os outros movimentos não têm a mesma repercussão. ‘O Movimento dos Agricultores Sem Terra (MAST), que atua no Pontal do Paranapanema, no Paraná e no Nordeste, não tem a mesma projeção do MST’, garante Feliciano.

Movimentos independentes

Feliciano também constatou a existência de movimentos independentes, que não querem vínculos com nenhum partido político ou com movimentos sociais organizados. ‘Eles formam um grupo de famílias e resolvem ocupar uma área. Querem apenas aquilo e mais nada’, explica. O MST tem grupos de formação política para orientar as famílias. ‘Aquelas que não concordam saem e formam outros grupos, ou ficam independentes’, relata. ‘Contudo, são as que mais sofrem, pois não têm força política.’

O pesquisador conta que há casos de famílias já assentadas ou acampadas que são contra a formação de cooperativas proposta pelo MST e que preferem a produção individual. Em seguida, algumas por mais afinidade e parentesco, constroem processos coletivos de produção ao seu modo, ‘de forma espontânea’, por perceberem a melhora na produtividade. ‘Essa é a característica do movimento camponês, eles não querem ninguém mandando neles. Querem trabalhar da melhor forma para eles e suas famílias’.

Outra origem dos movimentos sociais rurais está no sindicalismo. No começo, lutavam por melhores salários e condições de trabalho aos bóias-frias. Com a mecanização crescente das lavouras, o desemprego subiu e a luta passou a ser pelo acesso à terra. O diferencial desses movimentos está em suas condições de reivindicação. ‘Por estarem em áreas onde é difícil questionar a produtividade das propriedades locais, eles acabam ocupando áreas públicas que não exercem sua função social’, explica Feliciano. A Federação dos Assalariados Rurais do Estado de São Paulo (FEARESP) e a Federação dos Agricultores Familiares (FAF) são dois movimentos oriundos do sindicalismo rural. Ambos atuam na região de Ribeirão Preto e Araraquara, onde há latifúndios produtivos.

Mais informações podem ser obtidas no site www.usp.br/agen

V.C.