Primeiras ocas da CDHU serão entregues em 15 dias

Unidades são do Programa de Moradia Indígena do Governo Estadual

sex, 19/04/2002 - 13h56 | Do Portal do Governo


Índios Guarani da Aldeia Rio Silveiras, localizada entre os municípios de Bertioga e São Sebastião receberão em duas semanas as primeiras oito ocas de um conjunto inédito de 50 unidades da CDHU (Companhia Desenvolvimento Habitacional e Urbano). As casas fazem parte do Programa de Moradia Indígena – PMI, uma iniciativa singular do Governo estadual, que tem apoio da Fundação Nacional do Índio – Funai. Neste primeiro conjunto há também a parceria da Prefeitura de São Sebastião.

O programa é o único do País a contar com participação direta da comunidade indígena no projeto das ocas. Na Aldeia Rio Silveiras elas estão sendo erguidas respeitando costumes e tradições da etnia. As unidades fogem dos padrões convencionais da CDHU em vários aspectos.

Têm formato oval, estão sendo construídas em fundação direta, dispõem de piso impermeabilizado com cimento liso, paredes e teto de madeira de eucalipto, tratada em autoclave, e a cobertura conta com feixes de piaçava. Cada unidade dispõe de banheiro com lavatório, ducha e acesso por fora da oca, conforme exigência dos próprios índios. Outro diferencial é a localização das moradias, erguidas com relativa distância uma das outras, seguindo os parâmetros de uma reserva indígena.

As ocas da CDHU vão substituir as casas de pau-a-pique e barro, cobertas de sapé e palha de guaritana, onde vivem hoje 264 índios da aldeia, a maioria crianças e adolescentes. O projeto dispõe de 38 unidades com 60 metros quadrados de área construída e outras 12 com área de quase 50 metros quadrados. O custo unitário do primeiro modelo é de R$ 20,3 mil e do segundo, R$ 17,3 mil, no entanto os índios não se tornarão mutuários da empresa estadual. Isso porque, os R$ 980 mil aplicados pelo Governo paulista no projeto serão a fundo perdido, conforme prevê o programa, que teve aprovação da Assembléia Legislativa. O investimento foi repassado à Prefeitura de São Sebastião, responsável pela construção das ocas e realização das obras de infra-estrutura na reserva. As 50 unidades deverão estar concluídas até julho.

Escassez de recursos naturais

O chefe do posto da Funai da aldeia, Márcio Alvim, atesta a importância das novas moradias, alegando que os índios não encontram mais na mata a palha suficiente para cobrir suas casas convencionais, e como a região tem grande incidência de chuvas, as madeiras usadas se deterioram rapidamente.

Outro fator destacado por ele é a adoção de piso de cimento, que poderá reduzir os índices de gripe, inflamação do aparelho respiratório e até pneumonias, registrados sobretudo em crianças durante o inverno. As atuais casas têm piso de terra batida e transmitem toda umidade do solo.

Na opinião do arquiteto e professor da FAU-USP, Carlos Zibel Costa, o projeto é interessante e positivo, porque trabalha diretamente com as aldeias. Zibel, que tem doutorado em Habitação Indígena, destaca a escassez de recursos naturais, como madeira e palmeira. Com isso, as dificuldades que os índios enfrentam para fazer suas casas, mas critica alguns aspectos do projeto. “Não é totalmente adequado, por levar uma solução branca para uso indígena”, completa ele, referindo-se a adoção de energia elétrica e banheiro nas ocas.

“Os índios tiveram participação no projeto e o quiseram desde o começo”, comenta Márcio Alvim. O modelo adotado, na opinião do representante da Funai, aliou conceitos teóricos e práticos. “Muitos estudiosos podem contestar, dizendo que vaso sanitário não é da cultura indígena, mas a verminose também não. No entanto, ainda temos grande incidência dessa doença aqui”, ressalta ele, destacando a importância do saneamento básico.

Para o índio Vando Karay, as novas ocas irão melhorar as condições de trabalho da comunidade. Agricultor dedicado ao replantio de palmito das espécies juçara e pupunha, Vando diz perder muito tempo na manutenção de sua casa, que precisa ser refeita a cada dois ou três anos em função da umidade. “Dá muito trabalho encontrar madeira e palha apropriada. Isso dificulta nosso manejo na agricultura”.

Programa contempla outras aldeias indígena do Estado

Criado em junho de 1998 e oficializado em dezembro de 2001, o Programa de Moradia Indígena teve seu primeiro convênio firmado em janeiro último para a construção das 50 ocas na Aldeia Rio Silveiras de índios Guarani. A iniciativa também vai atender aldeias do oeste paulista, litoral sul e norte, além de índios da Capital. Nesses locais foram identificadas as principais etnias do Estado, como Terena, Kaingang, Pankararu, Krenac, Fulniô, Kopenoti, Icatu, Nimuendaju e Vanuire.

O programa já conta com outros dois projetos em andamento, ambos em comunidades Guarani. Um deles de cinco casas na Aldeia Jaraguá, em São Paulo. O outro, de 22 unidades será erguido na Aldeia Icatu, localizada no município de Braúna, região oeste do Estado. Além desses, um quatro projeto está em processo de fechamento de convênio. Ele prevê a construção de 30 unidades na Aldeia Boa Vista, de Ubatuba (litoral norte) também da etnia Guarani.

A CDHU também tem programada a construção de mais dois empreendimentos indígenas na região oeste, ambos ainda sem convênios firmados. Um deles de 30 unidades será em Avaí e vai beneficiar as aldeias Kopenoti e Nimuendaju. O outro será de 48 casas para a Aldeia Vanuire, no município de Arco-Íris.

Para participar do PMI, a aldeia indígena necessita apresentar à CDHU um diagnóstico detalhado da comunidade, feito em conjunto com a Funai. O levantamento deve informar as condições existentes de habitabilidade, a situação fundiária da aldeia e um perfil econômico e social da população, como número de famílias e atividades desenvolvidas. A comunidade deverá obter ainda um apoio técnico da Prefeitura local para desenvolver uma sugestão de projeto das moradias e de contratação da obra.

Perfil estadual

Estimativas da Funai apontam que existam hoje no Estado de São Paulo perto de 4.500 índios, entre comunidades aldeadas em reservas e um contingente nos centros urbanos, muitos morando em favelas. É o caso de 900 índios da etnia Pankararu, que vivem na Favela Real Parque, da Capital. Originário do Estado do Pernambuco, este povo está radicado em São Paulo desde meados dos anos 50 e pleiteia uma área própria para desenvolver e manter suas tradições e cultura.

Gislene Lima
Fotos: Reginaldo Pupo

Leia também:

  • Estado mantém sete escolas em aldeias indígenas com ensino bilingüe
  • Governo do Estado cria curso especial de formação para índios no magistério