Mercado: Instituto de Economia Agrícola realiza estudo sobre safra de feijão da seca 2003/04

As cotações diárias indicaram certo nervosismo no mercado atacadista

ter, 17/02/2004 - 20h46 | Do Portal do Governo

A cotação de feijão no mercado paulista apresentou, recentemente, uma elevação repentina, chamando atenção da mídia e dos observadores. Esse fato parece paradoxal, considerando que uma das safras anuais desse grão, a primeira, está-se encerrando com aumento de produção nacional em 17%1.

As cotações diárias, levantadas pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA), indicaram certo nervosismo no mercado atacadista, entre os dias 8 e 14 de janeiro, e ao nível do produtor, entre 9 e 13. Entretanto, a partir de 15 de janeiro, a cotação está estável no atacado paulistano – tomando como referência o preço modal do Carioquinha tipo 1 –, enquanto o preço médio recebido pelos produtores está, semanalmente, em declínio.

Muitos produtores estão segurando parte da produção na expectativa de um mercado mais favorável3. Entretanto, a situação exige uma análise criteriosa, por se tratar de um grão produzido praticamente em todo o território nacional em três safras anuais, com problemas de conservação e de perda de qualidade.

O excesso de chuvas, em grande parte do Estado de São Paulo e sobretudo no Sudoeste Paulista – região que concentra a maior parte da produção da primeira safra -, em janeiro deste ano, é um dos fatores que provavelmente contribuiu para esse desajuste de mercado: os dados mensais de precipitação (250 mm ~ 350 mm)4 e anomalia de precipitação (50 mm ~ 200 mm)5, do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), indicam chuvas acima da média histórica, prejudicando a colheita de feijão das águas nessa região.

Acrescente-se que, na primeira quinzena desse mês, a incidência de maior chuva foi nos dias 1, 7, 8, 9 e 10, segundo a mesma fonte. As chuvas não só atrapalham a colheita de feijão como também afetam a qualidade do grão colhido em condições de umidade, com reflexo imediato no mercado.

O preço médio mensal recebido pelos produtores paulistas em termos reais6, em janeiro deste ano, fechou em R$76,43 a saca de 60 quilos, cotação que fica abaixo apenas da de 2003, quando se analisa o mesmo mês do período 2000-2004

Nota-se que a cotação atual (diária e mensal) da saca de feijão para os produtores paulistas está situada em patamar próximo ao da média mensal histórica do período 1996-2004 (R$73,03). Nesse período, o último pico de preços foi em abril de 2003 (R$147,74/sc.), devido aos problemas climáticos enfrentados na região Nordeste, principalmente na Bahia, com o plantio da primeira safra 2002/03. A inversão na tendência de preços decrescentes só aconteceu após oito meses, em dezembro, com a elevação nas cotações diária e mensal

A expectativa da CONAB em relação à produção total da safra 2003/04 de feijão é de 3,4 milhões de toneladas, 6,6% maior que a safra anterior7, das quais 1,5 milhão de toneladas provenientes da primeira safra, com aumento esperado de 17% em relação à safra anterior, já mencionado.

A estimativa acima, caso se confirme, não só será um recorde como pode tornar-se um problema para os produtores, mesmo levando em conta que o feijão tem parte da produção adquirida pelo governo federal para o Programa de Aquisições de Alimentos da Agricultura Familiar do governo federal e também, no mercado atacadista, para distribuição de cestas básicas às famílias de assentados e em situação de insegurança alimentar.

O feijão no Brasil é considerado, de maneira geral, um produto de elasticidade-renda negativa e de demanda inelástica, pois ocorre diminuição no consumo na medida em que aumenta a renda e, na situação de queda nos preços unitários, não ocorre aumento proporcional na quantidade consumida, devido ao limitado uso alternativo do grão no hábito alimentar do brasileiro. Do mesmo modo, não ocorre aumento proporcional nos preços quando há queda na quantidade ofertada, devido à disponibilidade de produtos substitutos como ovo e frango.

A perspectiva para a safra de feijão da seca 2003/04 no Estado de São Paulo, nesse cenário, é de manutenção da área plantada no nível do ano anterior. Os preços atuais são atraentes, mas a tendência declinante dos preços recebidos pelos produtores nos dois quadrimestres de 2003 pode desencorajar os produtores na hora da decisão de plantio.

Outro fator que influi negativamente na tomada de decisão de plantio do feijão no Estado de São Paulo é a expansão da área com soja: no Sudoeste Paulista, região de concentração de feijão da seca, ela foi significativa, principalmente no Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Avaré (762%), segundo dados do levantamento IEA/CATI8, passando de 19 mil hectares para 164 mil hectares em um ano.

A área de soja não concorre diretamente com a área de feijão da seca, porém atrapalha por dois motivos: o primeiro é o ciclo da cultura da soja, que se sobrepõe parcialmente ao do feijão da seca; o segundo é o problema da rotação da cultura, pelo fato de ambos pertencerem à mesma família, a das leguminosas, o que agrava o problema de pragas e doenças em comum, como a da mosca branca. O milho safrinha, que concorre com o feijão da seca no Sudoeste Paulista, provavelmente não vai substituir a área de feijão devido à menor atratividade econômica nesta safra.

A substituição parcial da área no EDR de Avaré para o plantio de feijão da seca poderá vir da renovação da área com pastagem, ideal sob a ótica da rotação de cultura. As chuvas abundantes desde o início do ano favorecem as operações de semeadura para os produtores que já planejaram o plantio de feijão no Estado de São Paulo ora em andamento.

Ikuyo Kiyuna e Humberto Sebastiao Alves do Instituto de Economia Agrícola
C.A.