Meio Ambiente: MDL ou Mercado de Carbono para atingir as metas do Protocolo de Kioto

Regras para esses projetos tratam de questões sobre carbono nas florestas

sex, 17/10/2003 - 19h31 | Do Portal do Governo

O aumento dos gases que provocam o efeito estufa na atmosfera terrestre constitui uma das grandes preocupações em todo o mundo. São gases como o dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), resultantes de atividades como: a queima de combustíveis fósseis em indústrias, usinas termoelétricas e veículos; atividades agropecuárias, como a criação de gado; as emissões de gás de lixões, aterros sanitários e estações de tratamento de esgotos e as evaporações de substâncias voláteis, como solventes.

Na Rio 92, com base em um relato sobre os possíveis impactos do efeito estufa no sistema global, estabeleceu-se um regime jurídico internacional para estabilizar a concentração dos gases, em todos os países. Conhecida como Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – CQNUMC, depois de ratificada e aprovada recebeu a adesão de 185 países e até dos Estados Unidos, embora este tenha declarado, recentemente, ser contra o Protocolo de Kyoto.

Seguindo os princípios dessa Convenção, em 1997, foram adotadas metas para reduzir em 5%, em média, as emissões de carbono referentes aos níveis verificados em 1990, as quais estão definidas no Protocolo de Kyoto (PK).

Esse Protocolo (PK) foi proposto em uma das Conferências das Partes da Convenção do Clima. Para entrar em vigor, depende da ratificação de 55% dos países do Anexo 1, ou seja, dos países desenvolvidos que têm metas de redução. Para perfazer os 55%, a entrada em vigor do PK ainda está dependendo da adesão da Rússia, independentemente da ratificação pelos Estados Unidos.

O Protocolo de Kyoto estabelece três mecanismos que os países signatários podem utilizar para cumprir seus compromissos: a Implementação Conjunta, o Comércio de Emissões e o MDL -Mecanismos de Desenvolvimento Limpo. Apenas os dois primeiros podem ser utilizados pelos países do Anexo 1.

O MDL pode ser utilizado pelos países do Anexo 1 para compensar suas emissões por meio de financiamento de projetos nos países em desenvolvimento – caso do Brasil – , que resultem na redução de emissões ou no seqüestro de carbono.

Com relação aos projetos de fixação de carbono, conhecidos pela sigla em inglês LULUCF (Land Use, Land Use Change and Foresty – Uso do Solo, Mudança no Uso do Solo e Florestas), já está definido que para o primeiro período do compromisso do PK, de 2008 a 2012, somente serão aceitos os projetos de florestamento e reflorestamento.

As regras para esses projetos que tratam de questões relacionadas à permanência do carbono nas florestas, deverão ser definidas na próxima Conferência das Partes, a COP 9, que será realizada em dezembro de 2003, em Milão.

O MDL só existirá de fato quando o PK estiver em vigor. Contudo, já existe um mercado de carbono, chamado de “Kyoto Compliance”, representado pelas transações entre os interessados em antecipar a compra de créditos de carbono para cumprir suas metas de redução. Os interessados são as empresas e os países do Anexo 1, e os vendedores de créditos resultantes de projetos com perfil para o MDL, implementados em países em desenvolvimento.

“O que já está ocorrendo é que mesmo sem que o PK esteja em vigor e que as regras para os projetos de florestamento e reflorestamento já estejam definidas, estão ocorrendo transações no mercado de carbono, chamado de `No Kyoto Compliance´”, que existe e vai continuar existindo, independente do PK entrar em vigor”, explica Helena Carrascosa, da Secretaria do Meio Ambiente (SMA).

O principal fundo que já possui recursos para a compra/venda de créditos de carbono é o Fundo Protótipo de Carbono (PCF ou Prototype Carbon Fund), do Banco Mundial. Esse comércio também pode ser financiado pelo GEF (Global Environment Facility), deste mesmo Banco, que trabalha em parceria com governos nacionais, ONGs e organizações científicas, para fornecer concessões a projetos sobre biodiversidade, mudanças climáticas, águas internacionais e proteção à camada de ozônio.

Outros fundos estão em fase de lançamento. Dentre estes, pode-se citar o Bio Carbon Fund, para projetos florestais, e o Community Development Carbon Fund, especializado em projetos comunitários, ambos do Banco Mundial. Pode-se citar também o fundo administrado pela Cooperação Financeira Internacional (IFC – Netherlands Carbon Facility), o Future Forests, do Reino Unido, e a empresa alemã PRIMAKLIMA, que financia projetos florestais.

O uso do MDL para financiar programas
da Secretaria do Meio Ambiente

Uma das tarefas prioritárias da Secretaria de Estado do Meio Ambiente é formular um Programa Estadual de Recuperação de Matas Ciliares. Estudos estimam a existência de mais de um milhão de hectares de áreas marginais a cursos d`água sem vegetação ciliar, e para recuperar essa área é necessário produzir, plantar e manter mais de dois bilhões de mudas.

A histórica falta de recursos para o plantio de florestas nativas e, em especial, para a recuperação de matas ciliares pode agora ser provida, ainda que parcialmente, pela remuneração advinda da absorção de carbono pelas florestas em crescimento. ‘Precisamos explorar nosso potencial de formulação e implementação de projetos MDL, para recuperar áreas degradadas’, salienta Helena Carrascosa, que também é coordenadora do Projeto Pomar e do Grupo de Trabalho encarregado de preparar o projeto de recuperação de matas ciliares da SMA.

Alguns requisitos para a aprovação de projetos e contabilização de créditos de carbono já estão definidos, tais como: somente as áreas que não são consideradas florestais poderão ser enquadradas em projetos de florestamento e reflorestamento; os projetos têm que resultar em redução ou absorção de emissões reais e mensuráveis; essas reduções devem ser adicionais, ou seja, não ocorreriam sem o projeto; os projetos devem estar de acordo com os objetivos do desenvolvimento sustentável do país e devem contribuir para a conservação da biodiversidade e para o uso sustentável dos recursos naturais.

O projeto da recuperação e reflorestamento de zonas ciliares, que se encontram sem vegetação desde 1989, preenche os requisitos para ser aprovado para o uso da MDL. As matas ciliares são importantes para conter a erosão, garantir a estabilidade da temperatura da água, barrar pragas e doenças agrícolas, além de fornecer abrigo, alimento e água para as diversas espécies. Têm um papel fundamental para a conservação da biodiversidade, pois formam corredores naturais que proporcionam a conexão de remanescentes de vegetação nativa, o que facilita o trânsito de animais e a troca de material genético, sem os quais não se garante a renovação natural e a diversidade genética da flora e fauna.

Esses aspectos promovem o uso adequado dos recursos naturais e o desenvolvimento sustentável. Quanto ao aspecto social, a recuperação das matas ciliares poderá gerar alternativas de trabalho e renda para pequenos agricultores em atividades de coleta de sementes, produção de mudas, e implantação e manutenção das florestas. A conservação dessas matas manterá o solo e as águas protegidos, o que poderá contribuir para o aumento da produtividade, principalmente de alimentos, que são requisitos suficientes para eleger projetos. Quanto ao aspecto econômico, podemos citar, como exemplo, que nas matas ciliares podem se cultivar espécies compatíveis (como essências vegetais) e outras culturas, como a de abelhas.

‘Apesar de não existir um banco de dados que indique, com precisão, a quantidade de carbono que as florestas ciliares, em suas diferentes fisionomias e composições florísticas, são capazes de absorver, é certo que seu crescimento promove a absorção real e mensurável de gases de efeito estufa, o que torna os projetos compatíveis com a integridade da Convenção do Clima e do Protocolo de Kyoto’, explica Carrascosa.

Um projeto piloto da SMA já está sendo implantado em Sumaré, tendo sido iniciado com o plantio de 30 mil mudas, de 89 espécies arbóreas diferentes, com previsão de continuidade do plantio nesta estação chuvosa. O monitoramento desse projeto e outros estudos que a SMA pretende desenvolver devem resultar em dados e conclusões que reduzam a incerteza de projetos de recuperação de matas ciliares e favoreçam sua elegibilidade ao MDL e à comercialização dos créditos de carbono, instrumentos importantes para viabilizar o Programa de Recuperação de Matas Ciliares no Estado de São Paulo.

Este projeto visa também a aumentar a escala de produção e a logística de transporte das mudas, barateando os custos não compensados com os créditos de carbono.

O Projeto MDL Brasil-Alemanha

Se 4 milhões de carros na União Européia substituíssem o uso do MTBE, com a adição de 5% de álcool na gasolina, haveria um redução de 3.500.000 toneladas por ano das emissões de carbono para a atmosfera. Essa estimativa é feita pela consultora de meio ambiente, Laura Tetti.

O álcool é um combustível renovável e na cultura de cana o carbono é absorvido por fotossíntese. É assim, um excelente substituto para combustíveis fósseis e fortíssimo candidato a projetos MDL.

Além disso, o álcool polui menos que a gasolina e o diesel, o que é um importante fator para sua penetração em outros mercados. O Brasil já tem um mercado bastante desenvolvido e está tentando abrir as portas dos países desenvolvidos para este combustível.

A Alemanha propôs ao Brasil um projeto para aumentar em 100 mil o número de carros que usam álcool puro como combustível. Esses 100 mil carros evitariam lançar na atmosfera cerca de 2 milhões de toneladas de carbono, ao rodarem 10 anos, que é o tempo da vida útil dos automóveis no Brasil, sendo que a Alemanha teria créditos de carbono para cumprir seus compromissos com o Protocolo de Kyoto ou com a União Européia.

O Brasil produz 13 bilhões de litros de etanol por ano, atualmente.

Com a introdução desses 100 mil carros movidos a álcool, essa produção aumentaria cerca de 500 milhões de litros/ano. Esse aumento na produção de álcool acarretaria em 20 mil empregos diretos, com uma remuneração média de US$ 200 e 60 mil empregos indiretos.

Está previsto no projeto também que os consumidores terão R$ 1.000,00 de desconto na compra do carro e as montadoras serão compensadas pelo desconto dado com a redução do IPI. Esse programa já foi aprovado pelo Congresso Nacional, no ano passado.

Segundo José Goldemberg, secretário estadual do Meio Ambiente, ‘vender mais automóveis nos dias de hoje, sobretudo automóveis `verdes´, ajudaria a ativar a economia e expandir o uso do álcool através de um exemplo concreto, que caracteriza o Brasil como um grande parceiro para a redução das emissões de carbono
“Além disso, a frota adicional de veículos a álcool estimularia os donos de postos a não desativarem suas bombas até que os veículos bi-combustível (flex-fuel) estejam consolidados em nossa frota. Com o declínio na venda dos carros a álcool (mesmo com o crescimento na venda de etanol adicionado à gasolina), há um risco de perda da infraestrutura nos postos de combustível. Levaram muitos anos para o Brasil possuir bombas de álcool nos postos e não podemos perder essa infraestrutura”, diz Oswaldo Lucon, coordenador do Grupo de Trabalho para estudar o potencial de “Sequestro de Carbono por Matas Ciliares”, da SMA.

De Renata Egydio/ Da Assessoria de Imprensa da Secretaria do Meio Ambiente