Justiça e Defesa da Cidadania: Reforma agrária amplia bacia leiteira do Estado

Na região do Pontal do Paranapanema, assentamentos já respondem por metade da produção de leite, o equivalente a 56,6 milhões de litros

sex, 16/07/2004 - 11h01 | Do Portal do Governo


Há menos de um ano, o jovem Evaldo Aparecido Segatelli Prates, de 21 anos, nunca havia tirado leite de uma vaca. Nem sabia como fazê-lo. Encarregado pelo pai, Antônio Sena Prates, 44 anos, do gerenciamento da produção leiteira do lote da família no assentamento Santa Rita, em Tupi Paulista, ele não viu muito futuro no negócio a princípio. Só não desistiu devido ao incentivo dos pais e apoio do técnico Júlio Gabriel, da Fundação Instituto de Terras (Itesp). Hoje, fornece leite para uma das maiores cooperativas da região e busca ampliar a produção com técnicas inovadoras, como o pastejo rotacionado. ‘Valeu a pena!’, comemora.

Principal atividade dos assentamentos rurais do Estado de São Paulo, a produção de leite tem mercado garantido. ‘Na região do Pontal do Paranapanema, os assentamentos respondem por quase metade da produção de leite tipo C’, afirma o diretor adjunto de Políticas de Desenvolvimento do Itesp, Afonso Curitiba Amaral.

Ele se baseia em estimativa feita pelo Itesp, entidade vinculada à Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, e Instituto de Economia Agrícola (IEA), órgão da Secretaria da Agricultura, sobre a safra agrícola 2002/2003 no Pontal. Foram 56,6 milhões de litros de leite, o equivalente a 48% do total produzido na região.

A importância da atividade também pode ser medida pelo número de tanques de resfriamento existente nos assentamentos. São 131, segundo levantamento recente realizado pelo Itesp. Isso representa uma capacidade de armazenamento de 216.828 litros.

Qualidade

Com os tanques, os assentamentos garantem a qualidade da produção e se antecipam às exigências da Instrução Normativa 51 do Ministério da Agricultura, que deve entrar em vigor em julho do ano que vem. Alguns dos equipamentos foram comprados pelos assentados, com recursos próprios ou financiamentos. Outros são cedidos por laticínios e cooperativas e o valor do equipamento é descontado no preço do leite entregue.

Uma dessas cooperativas é a Cacretupi (Cooperativa Agrária dos Cafeicultores da Região de Tupi Paulista), que recebe diariamente 7,8 mil litros de leite de nove assentamentos rurais das regiões Noroeste e Oeste do Estado. ‘Ainda existe espaço no mercado para absorver a produção dos assentamentos’, avalia Hélio Pinotti, gerente de captação da Cacretupi.

Com o fornecimento para a cooperativa, o preço do leite para os produtores do assentamento Maturi, em Caiuá, saltou de R$ 0,25 para R$ 0,48. A cooperativa disponibilizou um tanque de 3 mil litros para o grupo de produtores do assentamento, que conta, hoje, com 9 pessoas. O grupo fornece de quatro a cinco mil litros por semana agora no inverno, período em que a produção é menor.

‘Outra vantagem é que, como associados, os produtores podem comprar ração, insumos e equipamentos da cooperativa a preço de custo. Com isso, o custo de produção também cai’, comenta o técnico do Itesp Ilson Malheiros.

De acordo com José Aparecido de Souza, 43 anos, representante do grupo, a renda média dos assentados chega a R$ 1.100 com a produção leiteira. Ele explica que a concorrência da cooperativa fez com que outros compradores também oferecessem preços melhores, por volta de R$ 0,45, beneficiando os produtores não-cooperados.

Tanque próprio

Um dos destaques do assentamento Maturi, em Caiuá, é Lindolfo Pedro dos Santos, 52 anos, que comprou um tanque de resfriamento próprio para dar conta da produção diária de 180 litros. Quando conquistou seu lote, há seis anos, ele tinha apenas 15 vacas e tirava 25 litros de leite por dia. Hoje, possui 60 cabeças de gado e uma renda mensal bruta de R$ 3 mil.

Empreendedor, Lindolfo percebeu que ter o próprio tanque de resfriamento era fundamental para ampliar a produção. Ele conseguiu financiamento de R$ 23 mil do Feap (Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista) para compra de um tanque de 650 litros e de mais 10 vacas.

‘Só com a diferença de preço do leite e com o aumento da produção eu consigo pagar o financiamento’, comemora. Ele explica que a produção aumentou não só devido à compra de mais vacas, mas também porque passou a tirar leite duas vezes por dia, contando com a facilidade de ter um tanque de resfriamento próximo ao curral.

Lindolfo já quitou o financiamento do Procera (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária) de R$ 7,5 mil, que recebeu no início do assentamento, e paga religiosamente em dia as parcelas do Feap, em torno de R$ 430 mensais. Também investe em qualidade de vida: com empréstimo de R$ 15 mil, construiu uma casa nova.

Diversificação

Um dos maiores grupos de assentados produtores de leite na região do Pontal é o do assentamento São José da Lagoa, em Piquerobi. São 32 assentados, que têm à sua disposição dois tanques de 2.500 litros oferecidos pela Cacretupi. A produção diária chega a 2.200 litros por dia no período das águas. No inverno, gira em torno de 1.100 litros.

Para incrementar a atividade, os assentados compraram uma colheitadeira de sementes de gramíneas. ‘A idéia é comercializar as sementes de capim, ampliando a renda dos produtores dentro da atividade pecuária’, explica o analista de desenvolvimento agrário do Itesp, Vagner Marinelli.

Além da colheitadeira, foram adquiridos uma máquina ceifadeira e um ancinho para retirada da palha após o corte. O custo total dos equipamentos foi de R$ 37,6 mil, financiados com recursos do FINSOCIAL, fundo gerido pelo Itesp.

Pastejo rotacionado eleva produtividade

Uma técnica desenvolvida pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e adotada por dois produtores do assentamento Santa Rita, de Tupi Paulista, está ampliando a produtividade e o rendimento com a produção leiteira. Trata-se do pastejo rotacionado irrigado, uma alternativa simples e barata para melhorar o aproveitamento de pequenas áreas de pastagem.

O pastejo rotacionado consiste na divisão de uma área de pasto em piquetes. O gado é colocado cada dia em um piquete e um fio de arame eletrificado com baixa voltagem impede que os animais saiam da área delimitada. Ao chegar ao último piquete, o capim do primeiro já se renovou e o ciclo recomeça.

Nilson Joaquim da Costa, 45 anos, aderiu à novidade há dois anos. Antes, tirava 50 litros de leite por dia. Agora, sua produção diária chega a 260 litros. ‘E o custo é muito baixo. Não investi mais do que R$ 450, utilizando material já existente no lote’, explica.

Com o pastejo rotacionado, segundo Vitório Kazuaki Assakawa, analista de desenvolvimento agrário do Itesp, é possível manejar até 15 cabeças de gado por hectare, enquanto o pasto convencional permite de duas a três cabeças por hectare. E a produção de leite chega a dobrar. ‘É um sistema próprio para quem tem poucos recursos e pouco espaço físico’, completa.

‘Em uma área de 5 mil metros quadrados (equivalente a meio hectare) eu faço mais e melhor do que em seis hectares de pasto’, conta Evaldo Aparecido Segatelli Prates, 21 anos. ‘Hoje, sobra pasto no lote’, completa Evaldo. Segundo o técnico do Itesp Júlio Gabriel, em pouco tempo a produção do lote aumentou de 50 litros por dia para 85 a 90 litros. ‘Começamos a preparar a área em novembro do ano passado. Em janeiro deste ano iniciamos o rodízio’, recorda.

Evaldo pretende implantar mais uma área de 5 mil metros, dessa vez com o capim da variedade tifton, que resiste melhor ao inverno. Vitório Assakawa explica que são utilizadas variedades apropriadas de capim, como o tanzânia e o mombaça, além do tifton. ‘São variedades que possuem maior quantidade de massa, proteína e respondem à irrigação e à adubação.’

Essa, inclusive, é outra particularidade da técnica desenvolvida pela Embrapa. O pasto é irrigado e adubado. No caso do lote da família Prates, a variedade de capim utilizada é a mombaça, que leva 28 dias para se recuperar após a passagem do gado. Assim, a área de pastejo foi dividida em 28 piquetes. O desenvolvimento do pasto chega a espantar. ‘No verão, o capim quase encobre as vacas. Elas comem sem abaixar a cabeça’, comenta Maria Segatelli Prates, 48 anos, mãe de Evaldo.

Da Assessoria de Imprensa da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania