Genética: Estudo da USP pode dar posse de terras a comunidades negras no Piauí

Famílias são descedentes de quilombos que se formaram no século XIX

qua, 17/12/2003 - 11h13 | Do Portal do Governo

Da Agência de Notícias da USP
Por Maurício Kanno

Uma pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP pode auxiliar no processo de posse de terra das comunidades Mimbó, Sítio Velho e Gaucinha, remanescentes de quilombos do Piauí, que vivem em situação precária.

O estudo mostra que elas são descendentes dos quilombos que se formaram durante o século XIX, apesar de ainda não serem reconhecidas pelo governo federal como tal. De acordo com Cláudia Emilia Vieira Wiezel, que fez o estudo em sua tese de doutorado, há cerca de 800 comunidades do tipo no Brasil, mas somente 29 têm título da terra.

‘A composição genética das comunidades continua bem semelhante à de populações da Costa Oeste da África, de onde vinha a maioria dos escravos para o Brasil,’ diz a pesquisadora. ‘É interessante ter se conservado um reservatório tão grande de genes africanos por mais de 250 anos.’

Cláudia verificou que há grande diversidade genética nas comunidades, entre si e dentro de cada uma, sendo que, apesar da predominância de genes africanos, todas tinham genes europeus e ameríndios. ‘O estudo foi importante para verificar a contribuição genética africana na formação da população brasileira.’

Diferença de genes

Utilizando amostras de sangue previamente coletadas, a bióloga analisou 12 regiões hipervariáveis do DNA. Constatou que a porcentagem de genes africanos nas três comunidades ia de 38% a 96,4 %, dependendo do cromossomo – parte constituinte do DNA – , enquanto que numa população urbana de Teresina, ia de 20% a 41 %.

Esses resultados devem-se ao semi-isolamento das comunidades, cujos membros só se casam entre si e procuram manter sua tradição, diferentemente das populações modernas, mais miscigenadas.

Cláudia diz que essa foi a primeira vez no Brasil em que se fez um trabalho extenso, de modo a examinar tanto os cromossomos ligados ao sexo, X e Y, como os não ligados, os autossômicos.

A tese foi defendida em outubro, após quatro anos de pesquisa. ‘Depois que os resultados forem divulgados no meio científico, a Fundação Palmares poderá usá-los no Congresso’, garante a pesquisadora. ‘Juntamente com dados históricos e demográficos, poderá reivindicar o título da terra para as comunidades que enfrentam o risco de serem expulsas pelos fazendeiros da região.’

A Fundação Palmares é um órgão que tem o objetivo de zelar pelas comunidades negras remanescentes de quilombos no País, sendo uma de suas atribuições auxiliar seus membros a garantir suas terras.

Mais informações podem ser obtidas no site:
www.usp.br/agen
V.C.