Fapesp: Novos procedimentos técnicos evitam contaminação por navios

Troca das águas de lastro de reservatórios terá de seguir manual controlado por autoridades

ter, 17/02/2004 - 14h39 | Do Portal do Governo

Cientistas e profissionais de saúde lutam por medidas mais eficazes para evitar a contaminação pela água de lastro usada em navios, há mais de dez anos. Na última sexta-feira, dia 13, o encerramento da Conferência da Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês), realizada em Londres, registrou uma marco importante nessa guerra.

A IMO, agência da Organização das Nações Unidas responsável pela segurança da navegação e prevenção da poluição marinha, decidiu adotar uma nova Convenção Internacional para Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios. O acordo precisa ser ratificado por pelo menos 30 países para entrar em vigor.

“Essa é uma questão ambiental bastante séria. As bilhões de toneladas de água de lastro que são transportadas pelo navios todos os anos de uma parte a outra do mundo carregam microrganismos e espécies invasoras que podem destruir o equilíbrio dos ecossistemas”, disse o secretário-geral da IMO, Efthimios Mitropoulos, em comunicado da organização, ao justificar a adoção da nova convenção.

Pela convenção adotada em Londres, as embarcações terão que seguir uma série de procedimentos técnicos ao trocar as águas de lastro de seus reservatórios. A operação terá que ocorrer no mínimo a 200 milhas da costa ou a 200 metros de profundidade. A troca também deve ser feita pelo menos por três vezes. Todas as operações terão que ser registradas pela tripulação num livro de bordo específico, que deverá ser controlado pelas autoridades.

Segundo Irma Rivera, professora do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP) e consultora da Organização Mundial de Saúde (OMS), a decisão consolidada em Londres “ tem uma grande importância para a saúde pública”.

Para ela, o fato de serem incluídas na convenção exigências de controle de patógenos, vírus e bactérias é bastante importante. “O Brasil é um dos poucos países preocupados com essas normas microbiológicas”, disse à Agência FAPESP a pesquisadora da USP, que investiga, sob um ponto de vista microbiológico, as águas de lastro despejadas na costa brasileira.

Um ponto essencial da convenção, na visão da pesquisadora, foi a inclusão de parâmetros relacionados com o vibrião da cólera, também defendida pela delegação do Brasil. “Nós encontramos, em pesquisa para a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), duas amostras de água de lastro de navios que atracaram em portos brasileiros com o Vibrio cholerae patogênico, entre 99 coletas estudadas. Por isso, foi consenso do nosso grupo incluir a bactéria no texto da convenção”, disse.

A presença de alguns tipos toxicogênicos do vibrião é considerado de risco, pois essas variações podem trocar material genético com os microrganismos encontrados no Brasil. “O vibrião da cólera está sendo isolado nos nossos sistemas aquáticos marinhos desde 1979. Eles não são patogênicos. É preciso ressaltar que a cólera não é endêmica por aqui, como é na Ásia e na África”, afirmou a cientista.

Estudos realizados pela equipe de Irma Rivera mostram evidências de que algumas epidemias de cólera registrada na década de 1990 no Peru e no Brasil, no Porto de Paranaguá, foram causadas pelas águas de lastro. Além disso, outro problema registrado em várias partes do mundo, e comprovadamente associado às águas que os navios transportam em seus reservatórios para controlar o peso, é a invasão de espécies exóticas.

“Aqui, por exemplo, temos um problema com o mexilhão dourado”, conta a pesquisadora da USP. Originário da Ásia, esse molusco foi identificado pela primeira vez desse lado do mundo em 1991, no porto de Buenos Aires. Em 1998, surgiu em Porto Alegre. Por ter encontrado um ambiente propício, o mexilhão dourado se reproduziu com rapidez e causou problemas ao infestar a rede de abastecimento de água da capital gaúcha.

Eduardo Geraque – Agência Fapesp