Especial do D.O.: Soldados plantam verduras para serem doadas a entidades assistenciais

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qui, 23/10/2003 - 11h16 | Do Portal do Governo

Por Otávio Nunes, da Agência Imprensa Oficial


Nem o vento frio que balançava a copa das árvores tirou o ânimo dos mais de 600 alunos do Centro de Formação de Soldados Coronel Eduardo Assumpção, em Pirituba – a maioria usando uniforme de treinamento (camiseta e calção). Em clima de descontração, começaram numa tarde de quarta-feira a plantar a Horta Quero-Quero, no terreno da escola. No final do ano, quando estiverem em ponto de colheita, as verduras serão doadas às entidades assistenciais (asilos e orfanatos) da capital e da Grande São Paulo.

A iniciativa é do subcomandante da escola, tenente-coronel PM José Koki Kato, que continua fiel à sua origem de filho de imigrantes japoneses, um povo acostumado a trabalhar os segredos da terra. É o segundo ano consecutivo que ele e os alunos, em atividade extracurricular, trabalham na Quero-Quero, nome em homenagem a este famoso pássaro. Um casal deles mantém, até hoje, um ninho bem no meio dos canteiros. Normalmente arisco e hostil à presença humana, a ave acabou se acostumando com os futuros soldados da PM.

À espera da primavera

‘No Japão, o policial trabalha com iquebana (arranjos florais), para ter sensibilidade. Aqui nós temos a horta, onde os alunos ficam em contato com a natureza e plantam para quem precisa’, explica o coronel Kato. Como autêntico agricultor, percorre os canteiros orientando os rapazes a plantar as mudas de verduras, enfileiradas.

Tudo na horta é resultado de doações da comunidade: mudas, semente, trator, adubo. Em abril, o coronel e os alunos começaram a trabalhar na área de quase 5 mil metros quadrados. De enxada na mão, arrancaram as ervas daninhas, aplicaram 180 toneladas de composto orgânico, 11 de calcário para corrigir o pH do solo e 12 toneladas de esterco de galinha. Após arrumar os 86 canteiros, esperaram a chegada da primavera e das chuvas para começar o plantio.

‘Fico admirado ao ver os rapazes trabalhando na terra. Muitos deles sequer conheciam as técnicas mais simples de tratar um canteiro, mas aprenderam e gostaram’, observa o oficial. Kato diz que o contato dos futuros soldados com essa atividade os fará profissionais responsáveis. Eles irão trabalhar no policiamento ostensivo, outros serão bombeiros, policiais rodoviários e ainda os ambientais, que antes eram conhecidos como florestais.

André Luiz Manoel, de 27 anos, aluno há cinco meses, confessa que não tinha conhecimento do assunto: ‘Porém, trabalhei desde o início e estou feliz porque as verduras vão alimentar pessoas necessitadas. É uma ação comunitária’. Ele mora em Artur Alvim, na zona leste da capital e toma o trem todo dia para estudar e treinar na escola.
O centro de formação da polícia fica próximo à Estação de Vila Clarice (entre Pirituba e Jaraguá), da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

Tobias de Aguiar

O comandante da unidade é o coronel PM Paulo de Tarso Diógenes, também entusiasta da horta, que acompanhou o plantio feito pelos futuros soldados. ‘É uma atividade extracurricular proveitosa, que ocupa parte da propriedade que antes era ociosa’, analisa. O coronel Diógenes observa que a área, em Pirituba, ocupada pela escola desde 1984, pertenceu no passado a Tobias de Aguiar, fundador da Força Pública, em 1831, embrião da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Atualmente, a escola forma 760 policiais. O número oscila bastante em função da demanda da PM. ‘Mas nossa capacidade permite trabalhar com até 1,3 mil alunos, homens e mulheres’, explica o comandante. Sábado passado, 639 deles concluíram o curso, sendo 396 para a Polícia Rodoviária do Estado.

No centro de formação, o maior do Estado e coordenador dos demais, o futuro policial tem oito meses de aulas, o chamado módulo básico, igual para todos, independentemente da especialidade na qual irá trabalhar. No local, há refeitório, alojamento, estacionamento e outras melhorias. Os alunos são egressos de concursos públicos e estudam recebendo salário de aproximadamente R$ 1,1 mil por mês, com status de soldado de segunda classe. Dois anos depois, serão classificados como de primeira classe.

Amor pela terra

O jovem Manoel Neto chegou à horta Quero-Quero dirigindo um caminhão. Na carroceria, estavam 70 bandejas de metal com cerca de 250 mudas em cada uma. As verduras eram alface (crespa, lisa e americana), brócolis ninja (parecido com couve-flor), escarola e cebolinha. Trouxe também sementes de mostarda e rúcula.

Manoel explica que para preencher todos os canteiros terá de fazer três viagens de caminhão. ‘Até o fim do mês, a horta estará inteiramente plantada, e até o Natal as verduras poderão ser colhidas’, prevê. Diz que ainda virão cenoura e talvez até milho e mandioca.

Ele se forma este ano em agronomia. É filho de um agricultor nos municípios de Franco da Rocha e Mairiporã, que pela segunda vez está doando as mudas para a horta. Seu pai vende as verduras em feiras livres e Manoel, mesmo quando estiver com o diploma de engenheiro-agrônomo na mão, pretende continuar a tradição da família.