Especial do D.O.: Programa Escrevendo o Futuro dá prêmios a estudantes da rede pública

Mais de um milhão de estudantes e 25 mil professores de escolas de todo o Brasil participaram desta edição

qua, 29/12/2004 - 14h58 | Do Portal do Governo

Para 21 estudantes da rede pública de ensino de todo o Brasil, o mês de dezembro de 2004 será lembrado com muita alegria e saudade. Viajaram de avião, visitaram livrarias e pontos turísticos de São Paulo, posaram para fotos e gravaram entrevistas. A emoção maior aconteceu no dia 6, no Memorial da América Latina, onde foram aplaudidos como finalistas da segunda edição do Prêmio Escrevendo o Futuro – projeto que contribui para a formação de professores e a melhoria da leitura e da escrita de alunos das 4ª e 5ªs séries de escolas públicas do País. Era visível em seus rostos – como também nos dos seus mestres, pais e acompanhantes – o misto de surpresa e de deslumbramento. “Sou uma celebridade”, dizia Mayla Eduarda Rosa, aluna da 4ª série de Sertãozinho, interior de São Paulo.

Mais do que apenas distribuir prêmios, Escrevendo o Futuro é um programa desenvolvido em duas vertentes. Nos anos pares, premia, em âmbito nacional, textos produzidos pelos estudantes em oficinas realizadas por seus professores nas suas próprias escolas, com a utilização de material de apoio pedagógico, que constitui o Kit Itaú de Criação de Textos. Nos ímpares, promove a formação – presencial e a distância – dos professores, publica os textos escolhidos e relatos das experiências práticas dos educadores. Desta segunda edição participaram mais de um milhão de estudantes e 25 mil professores de 10.544 escolas de todo o Brasil.

Noite de celebração – No Memorial da América Latina todas as atenções estavam voltadas para as crianças. Os 21 finalistas, sete em cada gênero de texto (Poesia, Memória e Opinião), vieram de diversas regiões, desde grandes capitais, como Rio de Janeiro e Goiânia, até pequenos municípios, como Quixeré, no Ceará; Caicó, no Rio Grande do Norte; e Sertãozinho, em São Paulo. Os estudantes, de 9 a 12 anos, escreveram sobre as comunidades em que vivem.

Giselle Santos de Paula, do Rio de Janeiro, foi a grande vencedora da edição 2004, no gênero Opinião, com o texto O lugar onde vivo. Ela, que minutos antes dizia não estar preocupada em ganhar porque chegar ali já era seu maior prêmio, viu toda a platéia levantar-se para aplaudi-la. Além disso, assistiu ao vídeo em que a escritora Zélia Gattai leu e elogiou o seu trabalho. No palco, a seu lado, sua professora, Myrian Rodrigues da Silva Munhoz, emocionada com a surpresa, abraçava a aluna.

O vencedor na categoria Poesia foi Euler Júnior Machado, de Santo Antônio do Amparo, Minas Gerais, com o trabalho Minha terra, minha gente. Olhos arregalados, apenas dizia que não dava para falar nada, tamanha a emoção. Antes de saber que era um dos ganhadores, contava, todo animado, como tinha sido a sua participação no concurso: “Conheci muita gente e também um monte de lugares bonitos”. Tairine Silva Ribeiro, de São João de Iracema, São Paulo, levou o prêmio no gênero Memória, com o texto Da lamparina à energia elétrica. Ela dizia que sua avó tinha muita história para contar. “Ainda não consigo acreditar que o que eu escrevi foi escolhido.”

As outras duas finalistas paulistas também comentavam a participação no Escrevendo o Futuro. Mayla Eduarda Rosa, de Sertãozinho, concorreu no gênero Opinião com o texto Com dinheiro não se brinca. Ao falar sobre a emoção de ser selecionada entre um milhão de pessoas, foi direta: “Fiquei pasma”. Laize dos Santos Gama, de Rancharia, finalista no gênero Poesia, revelava que se inspirara na própria história de sua família, que vivia na beira da rodovia e agora mora num assentamento. O título da sua poesia é Conquista. Feliz, dizia que já havia conseguido o mais importante: “Estou aqui”.

Processo participativo – O vice-governador do Estado, Cláudio Lembo, representando o governador Geraldo Alckmin no evento de premiação, foi enfático: “Esta é uma noite de vitórias, em que vemos o Brasil florescer”. Entusiasta do programa, o secretário da Educação e presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação, Gabriel Chalita, afirmou que esse evento não foi uma ação isolada. “Aqui se investe num processo de capacitação de professores e de educação de alunos. Esta iniciativa traz uma proposta pedagógica, o que é fantástico.”

Na opinião da presidente do Instituto Faça Parte, Milú Villela, embaixadora da Boa Vontade da Unesco, é importante o estímulo para que as pessoas revelem seus talentos. “Este projeto, além de educar, promove um resgate da memória regional do País.” O presidente da Fundação Itaú Social e diretor-presidente do Banco Itaú, Roberto Egydio Setúbal, completou: “Celebramos aqui a esperança. Todos nós temos o grande desafio de buscar a melhoria das condições de vida, e isso passa pela educação. A transformação de um país como o Brasil só é possível mediante parcerias”.

O Prêmio Escrevendo o Futuro é promovido pela Fundação Itaú Social em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e o Canal Futura. O programa tem, ainda, o apoio do Ministério da Educação e do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais da Educação. A coordenação técnica é do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). As escolas cadastram-se para participar e recebem o Kit Itaú de Criação de Textos, que traz um roteiro de atividades. O tema é sempre a comunidade em que o aluno vive. “Observamos que, como têm uma visão politizada e senso crítico apurado, as crianças sabem como exercer a sua cidadania”, afirma a coordenadora-geral do Cenpec, Maria do Carmo Brant.

Cada escola cria uma comissão para selecionar os melhores textos, que deve ser composta, no mínimo, por quatro avaliadores: o diretor da instituição de ensino, o professor, um representante dos pais dos alunos (cujo filho não tenha participação direta no projeto) e um representante da comunidade que desenvolva trabalho com a escrita. “Temos a preocupação de que o processo seja participativo, respeitando as características de cada localidade, o processo de criação do estudante e o estilo de docência do profissional de ensino. Esses são os pontos fundamentais”, explica Maria do Carmo Brant.

Nas etapas seguintes são feitas seleções estaduais e regionais e uma final. Na fase estadual foram escolhidos 180 trabalhos. Na regional, os Estados foram divididos em pólos, com uma cidade encabeçando: Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia, Manaus, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. Daí saíram os 21 finalistas. Na fase final, essas crianças selecionadas passam a participar do processo. “Elas vêm para São Paulo acompanhadas por seus professores e responsáveis, e aqui ampliam ainda mais seu universo: andam de metrô, visitam museus e bibliotecas e participam de intensa programação cultural”, conta a coordenadora-geral do Cenpec. “Entendemos que a sala de aula não é o único espaço de formação.”

Para todos é uma grande novidade: “Presenciamos cenas interessantes. As crianças se deslumbram quando vêem o mar pela primeira vez, quando andam de elevador ou quando viajam de avião. Além disso, são realizadas atividades em oficinas, que nos ajudam a entender e avaliar o processo criativo dos alunos e, também, de que forma os professores atuam na orientação dos trabalhos”, explica Maria do Carmo.

Olhar crítico sobre a realidade

Segundo a coordenadora-geral do Cenpec, alguns dados interessantes podem ser extraídos dos trabalhos. Nos textos de Opinião, por exemplo, as crianças têm escolhido questões relevantes. Na Região Nordeste foi freqüente a abordagem sobre a ocupação infantil e a escassez de água. Em São Paulo, os temas mais freqüentes foram o desemprego e a falta de moradia; no Rio de Janeiro, a violência. Também se observa, nos textos de Opinião, que as crianças não só são capazes de analisar a realidade social em que vivem, mas também de propor soluções interessantes para os problemas da comunidade.

“Uma aluna da cidade de Marília, interior de São Paulo, reivindicou o asfaltamento de uma estrada vicinal. Um deputado estadual leu o texto, convenceu-se com os argumentos e apresentou emenda na Câmara para asfaltar a estrada”, conta Brant. Já os poemas refletem a identidade de cada região do Brasil. “Percebemos nitidamente que são marcados pelo ritmo da musicalidade desses lugares. Em Minas Gerais, identificamos o ritmo da música de procissão; na região Nordeste, do forró e do repente; som de rodeio, no interior de São Paulo, e do carimbó, no Pará, para citarmos alguns exemplos.”

Acervo precioso – Nesta segunda edição, os textos de Memória valorizaram as pessoas idosas. “O projeto não só possibilitou que as crianças e a comunidade escolar valorizassem os idosos como deu voz a pessoas simples, do povo, que geralmente não são ouvidas”, explicou Brant. Os seis mil textos de crianças em todo o Brasil estão despertando o interesse em universidades e outras instituições. “É um acervo precioso”, fala Brant. A Undime do Ceará solicitou textos sobre o trabalho infantil para um seminário da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Canal Futura solicitou o material produzido no Estado do Rio de Janeiro que aborda o tema da violência. A secretaria de Educação de Pernambuco pediu toda a produção referente ao Estado.

O Projeto Terras Paulistas (que promove um resgate das origens caipiras do interior paulistano) analisará textos deste Estado. “As crianças também foram bastante reconhecidas pela comunidade. Tiveram seus trabalhos xerocados e afixados nas lojas comerciais e em alguns locais toda a população mobilizou-se para viabilizar a viagem dos alunos e de professores a São Paulo.” Ao falar sobre a continuidade da iniciativa ela foi enfática: “Um projeto social só tem efetividade se tiver duração. Só vamos alterá-lo quando alcançarmos um número expressivo de crianças alfabetizadas”.

A superintendente da Fundação Itaú Social, Ana Beatriz Patrício, reforça a existência de um olhar crítico sobre a realidade. “Notamos que nesta edição do prêmio alguns temas foram mais recorrentes, como a violência urbana e a preservação do meio ambiente. Na edição passada os problemas ligados ao trabalho infantil foram muito abordados”. Ela observa que o programa é, acima de tudo, de capacitação. “Temos informação que algumas secretarias estão utilizando o material para seus professores.”

Os vencedores receberam bolsas de estudo para o ensino superior e seus professores ganharão auxílio para custeio de cursos extracurriculares e verba para aquisição de livros. As escolas terão apoio para a criação ou ampliação de suas bibliotecas e computadores para compor uma sala de informática. No total, foram destinados R$ 440 mil em prêmios. Na primeira edição estiveram envolvidos 4.657 instituições de ensino e aproximadamente oito mil docentes em 1.466 municípios de todo o País, distribuídos nos 27 Estados brasileiros.

Onde e como eles vivem

Ser pobre não significa ser bandido –“Subindo a ladeira, ouvi uma frase de um grupo de jovens que desconhece o meu lugar, dizendo que, ‘no morro só mora bandido’. Isso não é verdade.” Assim começa o texto de Giselle Santos de Paula, a grande vencedora do Prêmio Escrevendo o Futuro, na categoria Opinião. Ela fala sobre a violência, afirmando que “ser pobre não significa ser bandido não”. Comenta que, no morro, nem tudo é ruim, e cobra medidas contra o desemprego e a fome. “Somos trabalhadores e cidadãos que precisam de trabalho, um bom lugar para se viver com dignidade, mais escolas, hospitais, o direito de ser cidadão e sermos respeitados”. É o que reivindica. O mineiro Euler Machado (ganhador no gênero Poesia) cantou a sua terra e a sua gente em verso. “Se cai chuva, não tem trabalho; / o chão fica molhado / desfaz a marmita / é hora de ajeitar o telhado”. A paulista Tairine Silva Ribeiro (premiada no gênero Memória) baseou-se nas memórias da avó para narrar a história da sua cidade, São João de Iracema.

SERVIÇO
Programa Escrevendo o Futuro

Outras informações podem ser obtidas nos sites www.itausocial.com.br ou www.cenpec.org.br

Joice Henrique
Da Agência Imprensa Oficial