Especial do D.O.: Laboratório inaugurado na USP vai abrigar vírus de alta periculosidade

É o primeiro laboratório do País com nível de biossegurança 3+ (NB3+)

seg, 17/11/2003 - 11h36 | Do Portal do Governo

A ciência brasileira conta a partir desta semana com um espaço especial para o estudo de vírus e bactérias. Trata-se do primeiro laboratório do País com nível de biossegurança 3+ (NB3+), que vai funcionar no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, em São Paulo.

Esse tipo de laboratório, só existente em centros de pesquisa dos EUA, Europa e alguns países, permitirá estudar vírus e bactérias de alta periculosidade, como o da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), sem que esses microorganismos tenham a possibilidade de escapar para o meio externo (veja matéria abaixo).

Ao custo aproximado de R$ 1 milhão, o laboratório levou 2 anos e meio para ser construído. Faz parte de um projeto mais amplo, a Rede de Diversidade Genética de Vírus, criada no final de 2000 com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O objetivo dela é estudar os vírus já identificados no Brasil, como o arbovírus (da dengue, febre amarela), os que ainda podem chegar aqui (da Sars, Febre do Oeste do Nilo) e outros desconhecidos, que podem aparecer. Além do laboratório da USP, mais três com o mesmo nível de segurança estão previstos no Estado.
O laboratório NB3+ leva o nome de Klaus Eberhard Stewien, virologista alemão naturalizado brasileiro que ajudou a conter a paralisia infantil no País. Trata-se de um ambiente de 50 m2, hermeticamente fechado. Para chegar ao seu interior, é preciso passar por algumas eclusas, que estabilizam a pressão interna, evitando o escape de ar contaminado. O ambiente funciona com pressão negativa, ou seja: suga o ar sempre para dentro. Esse ar passa por filtros absolutos que asseguram a filtragem de qualquer patógeno (agente causador de doenças). Por isso, mesmo que se faça um buraco na parede, o ar contaminado não sai do ambiente.

Vale do Rift

Só dois pesquisadores e quatro técnicos têm acesso ao local. Para isso, utilizam roupas especiais (cujos tecidos impedem a entrada de microorganismos), máscaras, luvas e óculos. Ao saírem do compartimento, além de trocarem novamente de roupa, precisam tomar uma ducha de água com cloro desinfetante e outra com água pura. O material usado nas pesquisas, incluindo a água, também passa por tratamento especial para evitar que microorganismos atinjam o meio externo. São submetidos a temperaturas superiores a 120º C, que eliminam qualquer patógeno.

Um laboratório como esse possibilita maior autonomia e rapidez de resposta em casos emergenciais de surtos epidêmicos no País, afirma Paolo Zanotto, do ICB, um dos pesquisadores que terá acesso ao espaço. A unidade de NB3+ possibilita também a identificação e caracterização de novos agentes infecciosos desconhecidos.

Com esse laboratório, segundo o professor Zanotto, o Brasil está mais preparado para enfrentar até mesmo doenças que nem chegaram aqui, como a Febre do Oeste do Nilo. Causada por um vírus que infecta aves e transmitida ao homem por mosquitos, a doença já é encontrada em várias partes do mundo e pode chegar ao País. Outra moléstia possível de se estudar é a febre hemorrágica causada pelo vírus do Vale do Rift, no Quênia, também transmitida ao homem por mosquitos.

Lidando com o inimigo

O laboratório NB3+ permitirá ao ICB, no futuro, criar uma unidade de descoberta viral. Caso surja um vírus desconhecido, o laboratório reunirá as condições para realizar pesquisas sobre ele, explica o professor.

Inicialmente, as pesquisas do laboratório funcionarão em fase de testes, com a utilização de microorganismos de periculosidade inferior aos do nível 3. A escala de biossegurança dos laboratórios vai de 1 a 5. No nível 1 estão os que analisam os vírus e bactérias que não apresentam riscos para o pesquisador. No nível 2, os que estudam patógenos conhecidos e de gravidade variável, como o vírus Influenza, causador da gripe. No nível 3, os que pesquisam patógenos conhecidos e potencialmente letais, como o hantavírus (proveniente de roedores e causador de pneumonia hemorrágica).

No nível 3+, encontram-se os que estudam patógenos pouco conhecidos, como o vírus da Sars, do Vale do Rift. Há ainda os níveis 4, cujos laboratórios lidam com patógenos altamente infecciosos, como o vírus do Ebola, e o 5, em operação dentro de unidades militares, voltado para o estudo de armas biológicas.

Paulo Henrique Andrade
Da Agência Imprensa Oficial

(AM)