Especial do D.O.: Indústria paulista atenta para métodos de produção mais limpa

Grupo que reúne setores público e privado prega a importância econômica e ambiental do reaproveitamento do resíduo industrial

qua, 12/11/2003 - 13h51 | Do Portal do Governo

Por Otávio Nunes, da Agência Imprensa Oficial


Toda indústria gera produto e resíduo e aquela que só dá importância ao primeiro item está perdendo dinheiro. Excesso de detrito é sinal de algo errado na produção, que encarece os custos e ainda deixa a empresa em má situação, como responsável pelo prejuízo que causa ao meio ambiente. Dentro dessa filosofia, a Mesa Redonda Paulista de Produção + Limpa atua desde 2001 como importante fórum na discussão e incentivo à adoção de processos de fabricação que gerem pouco resíduo (ou nenhum) ou reaproveitem o que foi descartado.

A mesa é formada por representantes de entidades empresariais dos setores privado (Fiesp e outras associações industriais) e público (Cetesb e Sabesp), além de instituições de ensino como Senai, universidades, Ongs e também por qualquer interessado em propagar a idéia de uma indústria com produção limpa e respeito ao meio ambiente. É constituída por cerca de 500 associados que trabalham de forma voluntária, pois a mesa não tem fins lucrativos nem cobra adesão. Os membros se dividem em cinco grupos de estudos e a secretaria executiva está a cargo da Cetesb, representada pela engenheira química Tânia Gasi.

Consciência dispersa

A engenheira da Cetesb conta que a idéia de criar a mesa paulista foi unir as entidades que se preocupavam com a produção mais limpa: ‘Já existia o conceito em empresas, associações e escolas de ensino superior. Mas cada uma delas atuava de forma isolada’. Além da Cetesb, ela cita a Escola Politécnica da USP, IPT e Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil) entre as instituições que propagavam a importância do reaproveitamento do resíduo industrial, como noção econômica e ambiental. ‘Detritos industriais nunca foram bom negócio’, justifica.

As indústrias que tinham essa cultura, lembra a engenheira, eram multinacionais, na maioria. Muitas delas trouxeram para o Brasil métodos que suas matrizes usavam no exterior. ‘Restava mostrar que a indústria brasileira também tinha condições de praticar a produção mais limpa.’

Pioneira no Brasil

A idéia de criar a mesa surgiu em 2001. Mas sua efetivação ocorreu no ano seguinte, na sede da Fiesp, com a realização da 1ª Semana de Produção + Limpa em São Paulo. Tânia Gasi assegura que é a primeira e única do gênero no Brasil. A iniciativa brasileira não é tão tardia como se pode imaginar. Também nos países desenvolvidos ou em desenvolvimento esses fóruns são recentes. Nos Estados Unidos, surgiram em 1985, vindo a seguir Europa (94), Canadá (97), Ásia (98) e México em 2000.

A 2ª Semana de P + L foi realizada entre 21 e 27 do mês passado, na sede da Cetesb. Compareceram convidados do setor público, empresas, universidades e Ongs, que apresentaram métodos racionais de utilização de matérias-primas, redução de materiais tóxicos na geração de resíduos industriais e de reciclagem. Entre eles, uma representante do Centro Canadense para Prevenção à Poluição, entidade análoga à mesa paulista. Ambas têm planos futuros de colaboração mútua em pesquisas.

Linhas de crédito

Durante a semana, ocorreram painéis sobre o tema. Um deles, Produção Mais Limpa no Setor Financeiro, mostrou as linhas de financiamento específicas para a área ambiental. Participaram técnicos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Banco do Nordeste e do ABN Amro Real.

Entre os casos apresentados, a BSH Continental Eletrodomésticos mostrou técnicas de produção de fogões e refrigeradores com baixo consumo de energia e água. A Tecnologia de Tração Elétrica (Eletra) expôs baterias, células de hidrogênio e sistemas híbridos para geração de energia elétrica em veículos. Indústrias como Fundição Engenharia e Máquinas, Mahle Metal Leve (autopeças) e Rhom and Hass Química também abordaram métodos de reutilização de resíduos.

Curso na Cetesb

A gerente do setor de prevenção à poluição da Cetesb, Marie Yamamoto do Vale Quaresma, informa que a empresa oferece um curso para indústrias que desejam conhecer a filosofia de trabalho da produção mais limpa. Todos os anos, em setembro, a Cetesb realiza curso na sua sede, em Pinheiros, São Paulo. Além de Marie, compõem a equipe mais seis profissionais (engenheiros, químico e biólogo) que ministram 40 horas de aula durante cinco dias. A inscrição é feita no site da Cetesb. Já participaram uma centena de pessoas, desde 1998, quando o curso foi criado.

‘Ensinamos que a redução de desperdício, por meio de programas de prevenção à poluição, é economicamente importante para a empresa e o meio ambiente também ganha’, justifica Marie Yamamoto. Durante o curso, os interessados ficam conhecendo, além do método, casos de sucesso de indústrias que adotaram o processo de P + L. Também há visitas a empresas que tenham casos bem-sucedidos.

Agência ambiental

Antes da formação da mesa paulista, a Cetesb já auxiliava empresas interessadas em mudar seus processos industriais para gerar menos detritos ou reciclar o material descartado. Indústrias de bijuterias do interior paulista e da Grande São Paulo, que utilizavam a galvanoplastia (tratamento de metais), foram as primeiras a participar de um projeto-piloto da Cetesb, com sucesso. A seguir, vieram fabricantes têxteis, indústrias gráficas e outras.

‘No entanto, como somos uma agência ambiental fiscalizadora, não prestamos assessoria técnica. Nosso trabalho é incentivar a adoção de processos de P + L, com cursos em nossa sede e também in company e apresentação de casos de sucesso’, ressalva Marie Yamamoto.

Pensando na ecologia, e também nos lucros

Indústrias multinacionais trouxeram para o Brasil métodos de produção mais limpa adotados em suas matrizes e que hoje servem como exemplo para outras. Um dos casos apontados pela Cetesb como de sucesso é o da 3M do Brasil, cuja fábrica fica em Sumaré, na região de Campinas. Até 1980, a produção de fitas adesivas da companhia emitia cerca de 400 mil litros por mês de compostos orgânicos voláteis, capazes de provocar problemas de saúde pública, como irritação nos olhos, nariz e garganta, agravando doenças respiratórias.

Além do transtorno ambiental, junto com a emissão desses gases ‘iam para o ar’ aproximadamente R$ 600 mil, custo que a empresa repassava ao produto, provocando desvantagem comercial frente à concorrência. Em 82, a 3M instalou um recuperador de solventes à base de carvão ativado, fabricado pela brasileira Villares, com tecnologia alemã. O equipamento foi projetado com capacidade de vazão da ordem de 120 mil metros cúbicos de ar carregados com solventes voláteis.

Ao passar pelo equipamento, o composto orgânico volátil é adsorvido, ou seja, passa pelo processo de adsorção, que fixa as moléculas do solvente no carvão ativado. Num estágio posterior, a substância orgânica é retirada e reaproveitada no ambiente industrial. A companhia investiu US$ 3 milhões na aquisição do recuperador e demais equipamentos periféricos necessários ao processo.

O sistema recuperou em média 400 mil litros/mês de solventes, gerando economia de U$ 2,5 milhões ao ano, o que possibilitou ‘pagar’ o investimento em pouco mais de 12 meses. Hoje, com a produção de fitas reduzida, a indústria recupera 200 mil litros/mês de voláteis orgânicos. No site da Cestesb, existem mais três casos de sucesso da 3M do Brasil: reutilização de efluentes líqüidos tratados, reciclagem de retalhos de PVC e eliminação do descarte de embalagens siliconizadas.

Líquido precioso

Até 1996, a BSH Continental Eletrodomésticos consumia em sua unidade industrial da Mooca, na zona leste da capital, aproximadamente 5,5 mil m3 de água por mês, totalizando 66 mil m3 por ano. A maior parte era usada no tratamento de superfície das peças metálicas dos seus produtos (fogões, refrigeradores, lavadoras de roupa e depuradores de ar). Quase a totalidade da água vinha da rede pública e gerava efluentes que deviam ser tratados.

Todo o processo, conta de consumo e custo para tratamento (produtos químicos, energia, mão-de-obra) representavam despesa muito alta para a empresa. Por isso, a indústria resolveu investir no reaproveitamento da água. Foram gastos, na época, aproximadamente R$ 4,3 mil na compra de filtro, bombas centrífugas e caixa-d’água.

A engenheira Ivana Ribeiro explica que o efluente sai da produção, vai para a estação de tratamento e, por último, passa pelo filtro, composto de areia e isento de ferro. O meio filtrante retém os contaminantes e eventuais partículas em suspensão no líquido. Depois de tratada, a água é bombeada à caixa, que tem capacidade para 5 m3, e novamente enviada ao processo industrial.

A maior parte é reutilizada nos sanitários. Outra vai para lavagem de peças esmaltadas e pisos da fábrica. “É um ciclo fechado de uso e reutilização da água”, ressalta Ivana Ribeiro. Somente a fração dos sanitários não retorna à estação de tratamento, pois vai para a rede de esgoto.

A medida resultou na redução de 30% do consumo de água da Sabesp, que passou de 86,4 mil m3/ano para 60,4 mil m3/ano. A economia anual é estimada pela empresa em R$ 135 mil. “A água é um bem natural limitado e o que fizemos, além de ajudar na economia, foi bom para a companhia e para a sociedade”, analisa Ivana Ribeiro.

Outros casos de sucesso

O site da Cetesb cita outros casos de indústrias que desenvolveram projetos de produção mais limpa:
Erimpress Etiquetas (São Paulo)
Femaq Fundição Engenharia e Máquinas (Piracicaba)
Rohm and Haas Química (Jacareí)
Indústrias Romi (Santa Bárbara D’Oeste)
Votorantim Celulose e Papel (Jacareí e Mogi das Cruzes)
Kodak Brasileira (Taubaté)
Janssen Cilag Farmacêutica (Taubaté)
Ford Motor Company Brasil (Taubaté)
BSH Continental Eletrodomésticos (São Paulo)
Alsco Toalheiro Brasil (Guarulhos)
Elekeiroz (Jundiaí)
Pilkington Brasil (São Paulo)
Ferro Enamel do Brasil (Americana)

Serviço:
www.cetesb.sp.gov.br
www.mesaproducaomaislimpa.gov.br
Telefone: (11) 3030-6000

(LRK)