Especial do D.O.: Estudos negam vínculo entre novos presídios e aumento da violência

Levantamentos foram feitos por especialistas da Unesp

qui, 30/10/2003 - 10h09 | Do Portal do Governo

A instalação de presídios em cidades do Interior do Estado e a conseqüente presença de visitantes de prisioneiros aumentam a criminalidade nessas localidades? Estudos de dois especialistas da Unesp revelam que não. A idéia que relaciona visitantes de prisioneiros ao crescimento da criminalidade não provém de fatos concretos, mas de formulações preconceituosas, mostra a pesquisa do professor Luiz Carlos da Rocha, do Departamento de Psicologia Evolutiva, Social e Escolar, da Faculdade de Ciências e Letras (FCL) da Unesp de Assis.

Segundo o professor, houve aumento de crimes após a instalação de penitenciárias na região de Assis, mas não um crescimento especial, acentuado. Em uma das etapas de sua pesquisa, ele comparou os índices de criminalidade de cidades com e sem presídios. Resultado: não há diferenças consideráveis entre esses índices, embora se pense que sim.

Para a professora Eda Góes, que nos últimos quatro anos desenvolve trabalhos relacionados às penitenciárias do oeste paulista, a atitude preconceituosa tem entre suas causas a influência da mídia, “que cada vez mais incorpora uma visão sensacionalista no tratamento da questão penitenciária”.

Professora na Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Unesp de Presidente Prudente, Eda Góes observa que os meios de comunicação pouco falam do cotidiano dos presídios; tocam no assunto quando ocorrem rebeliões e outros eventos negativos. O público, em conseqüência, passa a acreditar que o excepcional (a violência) é regra dentro das unidades prisionais. “A visibilidade de organizações que sempre existiram, como o PCC, também aumenta o receio e o preconceito”, afirma a professora.

Inconsistência

O professor Luiz Carlos pesquisou o assunto com a colaboração de estudantes bolsistas de graduação, durante aproximadamente três anos. A conclusão do trabalho ocorreu há um ano. A primeira etapa consistiu em levantar a presença, na mídia escrita regional, da noção que vincula visitantes de prisioneiros ao aumento da criminalidade na região. Também foram realizadas entrevistas com formadores de opinião (jornalistas, professores, religiosos, entre outros), que demonstraram que essa noção realmente existia. O rádio não foi utilizado na pesquisa em razão da falta de arquivos nesta área. Quanto à TV, não há retransmissoras e, portanto, programas produzidos na região.

Na etapa seguinte, a pesquisa analisou os índices criminais na cidade de Assis e região entre 1984 e 1996, antes e depois da instalação da penitenciária local, em 1991. Os dados do Departamento de Análise e Planejamento da Polícia Civil de São Paulo e do IBGE mostraram não haver alterações significativas nas ocorrências policiais, com a presença da penitenciária.

Por fim, o estudo comparou o perfil de suspeitos de crimes, pela análise de boletins de ocorrências policiais, com o perfil das pessoas que visitam os presos. O resultado foi uma profunda diferença entre os dois grupos. Os criminosos e suspeitos de crimes eram, em sua maioria, homens adultos (86%), em contraste com a população de visitantes, composta principalmente por mulheres (60%), crianças (27%) e homens adultos (13%). Isso indica, de acordo com o professor Luiz Carlos, a inconsistência da suspeita de que visitantes de prisioneiros tenham a ver com os crimes cometidos na região. Foi também nessa etapa do trabalho que se constatou a semelhança dos índices de criminalidade em cidades com e sem presídios.

Em nome da segurança

Como a grande imprensa e a imprensa regional lidam com a questão penitenciária é um dos estudos que a professora Eda Góes desenvolve atualmente. O outro se refere à atuação de alunos e ex-alunos da Unesp que trabalham nas novas unidades prisionais como professores e psicólogos, entre outras funções. Antes de voltar a trabalhar com a temática penitenciária, a professora da Unesp já havia pesquisado o assunto no começo dos anos 80, época de seu mestrado.

“Há poucos trabalhos de pesquisa relativos às novas penitenciárias.” A seu ver, há um limite “imposto pela própria administração penitenciária que, em nome da segurança, acaba dificultando as pesquisas, e impossibilitando que outros discursos, diferentes dos sensacionalistas, se contraponham.”

Paulo Henrique Andrade
Da Agência Imprensa Oficial

(AM)