Especial do D.O.: Comissão fiscaliza e combate o trabalho infantil no Estado de São Paulo

Instituição procura sensibilizar e mobilizar a sociedade para o desenvolvimento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

qua, 01/12/2004 - 13h17 | Do Portal do Governo

Todos os dias milhares de crianças e adolescentes exercem algum tipo de ocupação que põe em risco a sua saúde ou as impede de estudar e brincar – atividades essenciais ao seu desenvolvimento. São cerca de 5,5 milhões no País, na faixa dos 5 aos 17 anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2001. Quase 10% (430 mil) no Estado de São Paulo, num universo de 4,7 milhões de crianças com 10 anos ou mais, de acordo com o censo de 2000. Denunciar esse tipo de situação, em âmbito paulista, é uma das principais tarefas da Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil, instituição que reúne representantes dos governos federal, estadual e municipal, além de entidades da sociedade civil.

Essa fiscalização é incumbência da Delegacia Regional do Trabalho (DRT), vinculada ao Ministério do Trabalho. A criação da comissão foi uma exigência para a aplicação e desenvolvimento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) nos Estados e municípios. Instituído pelo governo federal, é o único programa destinado a acabar com o trabalho de para crianças e adolescentes no Estado. ‘Cabe à instituição confirmar as denúncias e propor ações, por meio de sua gerência, para resolver o problema’, explica a coordenadora da comissão, Maria José de Macedo. Quando o assunto não é solucionado, a comissão pode elaborar parecer e solicitar ao governo federal que a cidade seja excluída do Peti. Aprovar quais municípios ingressarão é outra de suas atribuições. Além disso, tem o papel de sensibilizar a sociedade em relação ao problema por meio de seminários, palestras e outras ações desenvolvidas em todo o Estado.

Capital e Grande São Paulo são as regiões de maior concentração desse sistema de trabalho. As atividades que mais empregam menores são as de catador de lixo reciclável, guardador de carros e flanelinha. No interior, além dessas, ocorrem também o trabalho na lavoura e atividades como vendedores ambulantes. As tarefas de risco compreendem 157 mil das 430 mil crianças subempregadas no Estado.

Segundo Maria José, um dos obstáculos enfrentados pela comissão nas suas ações de combate é de ordem cultural, e está arraigado na população: ‘As pessoas preferem ver as crianças ocupadas em alguma atividade a permitir que brinquem ou estudem. Há um desconhecimento da importância do brinquedo no desenvolvimento infantil’, explica.

Existe, também, pouco entendimento por parte de alguns prefeitos acerca do Peti. Outra dificuldade é a falta de recursos para desenvolver um trabalho de geração de renda para as famílias, de forma a não dependerem dos filhos menores.

Qualquer pessoa pode participar da comissão, que é formada por cerca de 30 membros. Há representantes da Pastoral do Menor, Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), CUT, Força Sindical, ONG Água e Vida, Fundação Orsa, Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condeca), entre outras. Da esfera pública, há representantes dos governos federal (DRT), estadual (secretarias da Educação e Emprego e Relações do Trabalho), além de outras instituições, como a Unesp, e até mesmo a Secretaria de Assistência Social do Município de São Paulo.

Em 2005, segundo Maria José, haverá um representante de cada região da Grande São Paulo, pois o governo pretende atuar de forma integrada. Uma das razões é que nem todas as crianças que exercem ocupação na capital residem no município. Algumas vêm de cidades próximas, como Itapevi e Ferraz de Vasconcelos. ‘Trabalhar integradamente já era uma das propostas da própria comissão’, explica.

Menos de 10% das crianças com ocupação estão no Peti

Dos 430 mil jovens (com dez ou mais anos), que exercem algum tipo de atividade, 33 mil (menos de 10%) estão no Peti, único programa direcionado à erradicação do trabalho infantil no âmbito estadual. O início do projeto no Estado ocorreu entre o final de 2000 e o começo de 2001. Hoje, são 186 municípios inseridos, que recebem mensalmente R$ 1,5 milhão. O montante refere-se às bolsas concedidas às famílias participantes, para que seus filhos em idade escolar permaneçam nas instituições de ensino. O valor varia de acordo com a região à qual pertençam.

Em cidades com mais de 250 mil habitantes, a bolsa é de R$ 40,00; nas demais regiões, incluindo a zona rural, o valor é de R$ 25,00. Na capital, por exemplo, são atendidas 4 mil crianças. Na área metropolitana, outras 4 mil. Em municípios rurais estão 3,3 mil e, nas demais cidades, o restante. Numa ação educativa complementar à escola, os municípios recebem, também, um valor a mais para a realização da Jornada Ampliada. Isso significa que, se a criança estuda pela manhã, terá outro período à tarde, mas não de aulas, e sim de jogos, lazer, música, filmes e teatro, que enriquecem o seu universo. Em nenhuma hipótese se pode desenvolver atividades semi ou profissionalizantes na Jornada Ampliada, simplesmente por não ser permitido o trabalho à criança.

A execução da Jornada é de responsabilidade da prefeitura, que para isso recebe recursos do Peti. Nas áreas urbanas, essa importância equivale a R$ 10,00 por menor, independentemente do tamanho do município. Nas rurais, a quantia é de R$ 20,00. O mais importante, segundo a coordenadora da comissão, é a conscientização da família, que deve ser estendida também à necessidade de capacitação para projetos de geração de renda, que promovam auto-sustentabilidade, Ainda de acordo com Maria José, grande vantagem do Peti é tratar-se de um programa com porta de entrada e de saída. ‘O que acontece hoje no País é que os programas só têm porta de entrada. Isso porque, quando as pessoas saem dele retornam à condição anterior, de miséria.’

Revista Fecesp insiste na tecla da conscientização

A Federação dos Empregados no Comércio do Estado de São Paulo (Fecesp) é uma das entidades que compõem a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil. Essa participação vem desde a época da sua criação, há quase quatro anos, no final de 2000. A missão da entidade é de sensibilizar, segundo o seu representante, Paulo José de Lara Dante. ‘A Fecesp assumiu a luta pelo fim do trabalho infantil divulgando seus malefícios aos filiados da entidade e solicitando deles uma ação de vigilância em suas bases, incentivando-os a participar das comissões municipais do Peti.’

A instituição acompanha um programa desenvolvido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), Programa Internacional pela Erradicação do Trabalho Infantil (Ipec) e Fundação Orsa, que tem como meta acabar com a exploração de 1,5 mil crianças e adolescentes nos municípios paulistas de Caraguatatuba, Campinas e Itapeva. Trata-se das quatro piores formas de exploração infantil: doméstica, sexual, comércio informal e agricultura familiar. E a Fecesp atua representando a comissão estadual.

A entidade faz denúncia, por meio da revista Repórter Fecesp, com tiragem de 35 mil exemplares, distribuída em prefeituras, câmaras municipais, assembléias legislativas, câmara dos deputados e em todo o meio sindical. Além disso, apóia eventos e seminários, como O Trabalho Infantil no Comércio Informal, que reuniu mais de 400 participantes no ano passado.

Peti de São Bernardo realiza trabalho com famílias

Pelas excelentes ações desenvolvidas, o Peti de São Bernardo do Campo é considerado uma espécie de vitrina pela Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil, segundo sua coordenadora Maria José de Macedo. As atividades locais (na forma de projeto-piloto) iniciaram no final de 1999. Agora atende 1.080 pessoas de 7 a 15 anos, totalizando 564 famílias. O desligamento do bolsista se dá ao completar 16 anos. Os jovens inseridos no Peti, além da necessidade de apresentar pelo menos 75% de freqüência escolar, participam da Jornada Ampliada. É uma proposta de educação alternativa não-escolar, desenvolvida em centros comunitários e outros espaços públicos, em horário diverso ao da escola, sempre de segunda a sexta-feira, por um período de quatro horas.

De acordo com a coordenadora do Peti de São Bernardo, Fabiola Dimitrov Beltrame, a Jornada Ampliada desenvolve nas crianças e adolescentes a auto-estima e o sentimento de pertencer à comunidade. Por isso são usados a informação, criação (artística e corporal) e discussões de problemas vivenciados em casa, na escola e na rua.

Exercício da cidadania – Já a família (pai, mãe ou representante legal) deve marcar presença na reunião socioeducativa mensal. Além de garantir a retirada dos filhos da situação de trabalho, também recebe orientação e acompanhamento em relação aos serviços de saúde, educação, dentre outros disponíveis no município, bem como aconselhamento para enfrentar e solucionar conflitos em casa e referentes à comunidade. Conforme explica Fabiola, reuniões em grupo com pais e parentes propiciam a discussão de temas de seus interesses, levando-os ao resgate de vínculos, às mudanças de comportamento e ao exercício da cidadania.

Os familiares participam de cursos e ações voltados à geração de renda. São, geralmente, atividades com pequena carga horária, sujeitas a adequação, de acordo com o público a que se destinam. O de cabeleireiro, por exemplo, pode abranger apenas corte e escova, já que tintura requer maior escolaridade do candidato. Tais cursos concentram-se nas áreas de alimentação, artesanato e beleza, que inclui manicure.

Paulo Henrique Andrade
Da Agência Imprensa Oficial