Especial do D.O.: Caverna Digital da USP comanda estudo da realidade virtual na América Latina

Aplicações incluem telemedicina, prospecção de petróleo em águas profundas e construção de um planetário interativo

seg, 22/11/2004 - 13h31 | Do Portal do Governo

A Caverna Digital da USP é o principal centro de pesquisa e desenvolvimento em realidade virtual da América Latina. É uma iniciativa do Laboratório de Sistemas Integráveis da Escola Politécnica da USP, iniciada em março de 2001, que investe na criação de sistemas interativos e de imersão. Um dos objetivos é transferir o conhecimento adquirido para governos e empresas. As atividades estão centralizadas na Cidade Universitária, na capital.

A realidade virtual tem um conceito vasto e compreende três principais áreas: visualização, computação de alto desempenho e transmissão de dados em alta velocidade. Tem aplicações em telemedicina, TV digital e em áreas como engenharia (naval, oceânica, mecânica, civil, automobilística e eletrônica), medicina (simulações cirúrgicas e estudos em anatomia), ciências básicas (astronomia, astrofísica, biologia e química), pedagogia (jogos interativos educativos), arquitetura (maquetes virtuais), entretenimento, (roteiros imersivos e interativos e estudos em imagens de alta-resolução).

Diferentes segmentos empresariais brasileiros utilizam-na com redução de custos. Indústrias como a aeronáutica, montadoras e de óleo e gás economizam com a produção digital de maquetes virtuais, cujo preço é muito inferior à construção de protótipos reais. Outra vantagem que a RV propõe é poder modificar o projeto, em qualquer fase, sem reiniciar todo o processo.

Na área médica, treinamentos cirúrgicos já são realizados com a ajuda de uma interface que simula um bisturi. Além disso, os serviços prestados pela Caverna Digital incluem o auxílio na prospecção e exploração de petróleo em águas profundas pela Petrobras. Investindo também em educação, o Centro colocará em funcionamento um planetário interativo para crianças, a ser construído ao lado do Zoológico, na zona sul da capital, em 2005. A previsão é de receber 150 mil visitantes por ano.

Equipe multidisciplinar – O engenheiro eletrônico Marcelo Knörich Zuffo é o cientista responsável pela criação e comando da equipe multidisciplinar de 30 profissionais (pós-graduandos, professores e estagiários) da Caverna Digital. Ele conta que o gosto pelo estudo de imagens começou no Natal de 1982, quando ganhou uma calculadora científica que imprimia gráficos coloridos. Desde então, se especializou no tema e explica que a Caverna Digital cresceu com o desenvolvimento interno de clusters – agrupamentos de computadores de baixo custo e alta capacidade. No arranjo, cada máquina é responsável por projetar, simultaneamente, as imagens nas cinco paredes da Caverna Digital e, assim, criar de modo artificial a sensação de tridimensionalidade. No Brasil, é pioneira no desenvolvimento desses sistemas e dispõe de três conjuntos. O cluster é formado por computadores, que podem chegar a algumas dezenas. As máquinas funcionam sincronizadas e as projeções são simultâneas. Associadas aos efeitos sonoros, tornam mais atraentes e interativas as aplicações em realidade virtual. Zuffo informa que, daqui a dez anos, a meta será ter um computador para cada pixel – a menor unidade de imagem projetada na tela.

“Com milhares de máquinas trabalhando ao mesmo tempo, as experiências serão ainda mais realísticas. Um dos desafios em RV é estimular a interoperabilidade e o uso comum entre os sistemas e criar filmes que dispensem aplicativo operacional para serem executados”, explica.

Transmissor estereoscópico – Márcio Cabral é formado em ciências da computação e gerente de projetos da Caverna Digital. Está envolvido na construção de um transmissor de videoestereoscópico sem fio –equipamento que contém um capacete com duas câmeras acopladas (de visão frontal e traseira, e uma mochila com um laptop no seu interior. Ao se deslocar, o usuário transmite as imagens captadas para um outro computador ou ambiente.

“As possibilidades de uso do transmissor são ilimitadas. Abrangem treinamento para portadores de deficiências, conserto à distância de motores e máquinas, uso militar e exploração de áreas perigosas, como campo minado”, conta. O engenheiro de computação Luciano Pereira Soares é um dos pioneiros da equipe. “Trabalhei na Silicon Graphics, empresa multinacional, e vim fazer mestrado no centro. Utilizei meus conhecimentos e colaborei na concepção das paredes, salas de máquinas e clusters. Aproveitei as soluções encontradas pela Escola Politécnica da USP para clusters numéricos e procurei adaptá-las para a área de computação gráfica”, explica.

Luciano explica que desenvolver ferramentas educacionais é uma das principais propostas do centro. “O ensino tradicional, restrito à lousa e giz, não tem o mesmo apelo do passado. Para estudar a estrutura do átomo, é mais fácil e instigante assistir a um filme com aplicação em realidade virtual, mostrando para o aluno o seu funcionamento, com cores, animações e interatividade”, compara.

Outro desafio para a expansão dessa tecnologia é desenvolver ferramentas para construir aplicações. “Comprar software é caro e nem sempre o programa corresponde totalmente às expectativas”, informa. O custo desses equipamentos, baseado em dólar, é outro fator de limitação. E, finalmente, é preciso criar conteúdo brasileiro para os filmes”, salienta.

A mestranda Júlia Benini é estagiária na Caverna Digital e formada em propaganda pela USP. Trocou empregos anteriores em produtoras de sites pela possibilidade de se aprofundar na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias. “Aqui encontro respostas para as pesquisas de viabilidade prática que faço com bolsistas de iniciação científica e graduandos. É diferente de locais onde o estagiário somente tira xerox.”

Vôo simula a sensação de estar numa asa-delta

Na Caverna Digital, o visitante pode simular um vôo panorâmico, como se estivesse numa asa-delta sobrevoando o Corcovado, no Rio de Janeiro. Se quiser, conhece todo o câmpus da USP na capital e aprende astronomia, ao “viajar” pelo Sistema Solar e estudar as estrelas da Via Láctea na Caverna. A experiência é controlada por um joystick – dispositivo de controle igual ao utilizado nos jogos eletrônicos. O computador cria artificialmente as sensações de profundidade, movimento e de imersão”, explica.

Para participar da experiência, o visitante coloca óculos especiais e, de meia ou de chinelo, anda e interage com o ambiente, revestido por telas especiais, que recebem as projeções – são brancas com três metros de altura e três de largura. A luminosidade do local também é calculada e o projeto das salas foi acompanhado por professores de arquitetura da USP. O objetivo é oferecer conforto máximo aos usuários na sala, que tem isolamento acústico também especial. Tudo isso só foi possível graças às parcerias com a Itautec, Intel e o Finep – programa de financiamento de estudos e projetos, do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Aplicativo permite a robô mapear paisagem submarina

Especialista em processamento de imagens, o engenheiro Osvaldo Ramos conta que o filme tridimensional exibido na Caverna Digital é resultado de um minucioso trabalho de fotomontagem. As imagens que compõem as cenas são produzidas por uma câmera especial, sobre um tripé, que as capta simultaneamente em 360 graus com 12 lentes. Dispostas em círculo, filmam em todas as direções e produzem cenas panorâmicas de uma área completa. O passo seguinte é juntar as fotos e transformá-las em filme único, num programa de computador que foi desenvolvido pelos cientistas do Centro.

Osvaldo disse que a iniciativa teve grande importância para a Petrobras. “Essa aplicação é útil na exploração de águas profundas. Permite a um robô afundar e mapear, de modo panorâmico, toda a paisagem submarina. São informações fundamentais para a construção de oleodutos, marinas e plataformas de exploração de petróleo”, explica.

Aplicações infinitas – A realidade virtual tem execução prática na construção de robôs e dispositivos capazes de desarmar bombas, evacuar prédios e prestar socorro em situações de emergência. “Uma novidade é o seu uso no tratamento de fobias, já realizado em países europeus, como Portugal e França. Um paciente que tenha medo de altura pode ser submetido a um tratamento que utilize essa tecnologia para a superação de seus medos.”

Marcelo informou que o esforço dos cientistas em pesquisar a RV colabora com projetos em bens de consumo ergonômicos – eletrodomésticos e dispositivos capazes de se integrar melhor aos movimentos e formas do corpo humano. Um dos maiores desafios é sincronizar o funcionamento das máquinas envolvidas para criar a sensação de profundidade, que se completa com a projeção simultânea dos computadores nas paredes e com o uso dos óculos especiais.

Rede vai conectar Caverna Digital com o mundo

Projeto da Fapesp, a Rede Kyatera interligará a Caverna Digital com sistemas similares no Brasil e no mundo. Permitirá a realização de exercícios de imersão e teleimersão a distância, gerando e transferindo imagens e sons digitais pela Internet de alta velocidade e, no outro ponto da rede, repassar a sensação de ilusão para usuários distantes, até mesmo em outros continentes. O estudo da telepresença é apoiado pela Rede Nacional de Pesquisas (RNP) e é diferente do teletransporte de matéria, brincadeira recorrente no antigo desenho animado dos Jetsons. O engenheiro Zuffo informa que esta aplicação vem sendo utilizada por médicos para ensinar colegas a realizar procedimentos cirúrgicos delicados.

SERVIÇO
Mais informações a respeito da Caverna Digital da USP pelo site www.lsi.usp.br/interativos

Da Agência Imprensa Oficial
Por Rogério Silveira