Educação: Cursos profissionalizantes são porta de saída para adolescentes da Febem

Mais da metade dos internos da Febem do Tatuapé freqüentam cursos profissionalizantes

ter, 30/12/2003 - 12h49 | Do Portal do Governo

A Escola Profissionalizante Marina Vieira de Carvalho Mesquita forma alunos interessados em 31 cursos e em 50 oficinas. A maioria dos meninos faz questão de freqüentá-los mais de uma vez. Sabem como é importante que conste em seus currículos que estudaram.

Mais da metade dos 1,5 mil adolescentes que cumprem medida socioeducativa com privação de liberdade na Febem do Tatuapé freqüentam os cursos da Escola, que funciona dentro do próprio complexo.

A certificação dos cursos e oficinas é dada pelos parceiros Senai, Senac, Projeto Fique Vivo, Fundação Bradesco, Fundação Paula Souza, Faculdade Cantareira, Universidade Nove de Julho, Comitê para Democratização da Informática, Amcham, PriceWaterHouseCoopers, Sutaco e Projeto Curumim. A intenção é que não sejam discriminados no mercado de trabalho ao informarem que estudaram na Febem.

As parcerias possibilitaram que mais jovens fossem atendidos. ‘De maio para cá, alcançamos uma melhora em virtude das parcerias. Se conseguirmos novos colaboradores, poderemos reduzir ainda mais o índice de reincidência’, disse Márcio Moraes, diretor da Escola Profissionalizante.

Centro de referência

Os cursos desenvolvem conteúdos relacionados ao mundo do trabalho, oferecendo aos alunos condições para realizar mudanças e obter êxito profissional. Eles escolhem o que gostariam de fazer e depois são submetidos a testes de aptidão para que fique garantido o total aproveitamento do conteúdo educacional.

Quando tem bom desempenho e apresenta facilidade na realização das tarefas, pode continuar na turma como monitor. Além dos adolescentes infratores, funcionários de outras unidades também participam dos cursos. A Escola Profissionalizante funciona como centro de referência da Febem.

As medidas socioeducativas de privação de liberdade variam de seis meses a três anos. Como os internos não sabem quanto tempo irão ficar na instituição, os cursos são de curta e média duração. A carga horária varia de 50 a 100 horas-aula. Marcio Moraes explica que uma das maiores dificuldades dos educadores é lidar com a expectativa dos garotos. Eles costumam imaginar datas para saída da Febem, como o Natal, por exemplo, e acabam se frustrando quando não vão embora.

Professores e alunos entusiasmados com os resultados dos cursos

Na oficina de acabamento de móveis, os meninos aprendem lixar, amaciar e pintar as peças produzidas pela turma de marcenaria. ‘Ensino que desenho e pintura são uma questão de treino’, diz a professora Mara Lucia Ramos, que se realiza vendo a evolução dos alunos. ‘Aprendi muita coisa aqui, como pintar e desenhar’, garante Diego, 18 anos, que está fazendo o curso pela terceira vez.

Os cursos de informática, promovidos pela Fundação Bradesco, são muito disputados. ‘O aprendizado vai me ajudar bastante com o serviço lá fora’, diz Alex, 17 anos, participando da terceira fase do treinamento. ‘Tem alunos bem interessados, curiosos. Eles perguntam bastante e têm muita vontade de aprender’, conta Fernanda Nogueira, que dá aulas sobre os softwares do pacote Microsoft Office.

Estúdio e laboratório de revelação estão disponíveis para a turma de Fotografia e Cidadania, coordenado pelo Senac. O professor Eliel Nascimento comemora os resultados dizendo que muitos alunos formados nos últimos cinco anos estão trabalhando na área. Ele lembra de um garoto que, quando saiu da Febem, foi ser fotógrafo de um jornal de Santo André.

São 70 horas de curso oferecidas para 12 adolescentes, que aprendem técnicas de estúdio e de revelação. ‘Estou me esforçando para que eu possa continuar trabalhando quando sair daqui’, diz Evanilde de 19 anos. O Ministério da Saúde e o governo federal utilizaram fotos produzidas pelos estudantes da Febem para ilustrar o calendário 2003, sobre doenças sexualmente transmissíveis e Aids.

Exercitando a criatividade

A oficina de velas e biscuit (técnica de artesanato que utiliza massa especial para moldar) forma sete educandos por turma. Eles aprendem a fazer velas decorativas e pequenos objetos de massinha. ‘Estou gostando porque aprendi a fazer velas’, disse Leandro, 14, enquanto segurava orgulhoso a caixa com os presentes que preparou para dar à sua mãe no Natal. Alguns dos trabalhos realizados ficam para os garotos e outros vão para o bazar interno da Febem. O dinheiro obtido com as vendas é revertido para a compra de novos materiais para oficinas e cursos.

Os internos de corte e costura fazem suas próprias roupas. ‘Começamos com exercícios de coordenação motora. Depois fazemos almofada, mochila, bermuda, e a última peça foi um camisão’, relata a professora Maria do Socorro. Os aprendizes podem exercitar a criatividade, adaptando tecidos e criando novos modelos.

Transformação

‘Eu fiz três bermudas, uma mochila, dois camisões, uma almofada e um pano de copa. Vou reservar as bermudas para mim e as outras peças vou presentear minha mãe’, conta Leandro, 18, trajando um dos camisões que costurou.

A turma que faz enfeites de Natal também está orgulhosa com o resultado. ‘Aprendi a fazer quadro, boneca, cartão e enfeites de Natal. Se eu quiser, tenho tudo para melhorar. Só depende de mim’, diz Cleberson, 16. Isaias, 18, está fazendo o sexto curso. Ele explica que, como tinha cometido várias infrações, o juiz pediu para que estudasse o máximo possível. ‘Melhorei muito e aprendi a fazer coisas que eu não sabia antes.

Já fiz costura, vela, encadernação de livros, estamparia de camisas e decoração de vidros. Lá fora eu só pensava em roubar’, conta o menino orgulhoso pela transformação, enquanto corre para mostrar todos os enfeites natalinos que produziu.

Estudar e aprender

Os internos sabem como é importante estudar e aprender uma nova profissão. Na oficina de tapeçaria e bordado não é diferente. ‘Já sei fazer muitos pontos, que vão me ajudar no trabalho quando eu sair daqui’, conta Fernando, 15, que fez encadernação e serigrafia (reprodução de imagens e letreiros em superfícies planas).

Na oficina de serigrafia, Marcos, 19, fala da importância de estudar: ‘Eu não sabia fazer isto. A gente aprende coisas que nem imagina. Aprendemos a ver que o mundo também tem coisas boas’.

O curso de pintura de autos está formando dezenas de jovens. ‘O garoto que o concluiu tem condições de trabalhar como auxiliar em qualquer oficina. Ele sai conhecendo todos os materiais e com muitas noções teóricas e práticas’, garante o professor Job Carlos. ‘Eu aprendi tudo. Quando estiver lá fora vou procurar serviço’, garante Sérgio, 18 anos.

Os alunos praticam as técnicas de funilaria e pintura em peças cedidas pelo Senai. A empresa IGP, fabricante de autopeças, também doou mais de 30 unidades danificadas durante o transporte.

Ensinamentos práticos

Muitos que escolheram pintura de autos também procuram a oficina mecânica. ‘A gente tem aqui a mecânica básica. Estamos batalhando para mostrar algo mais moderno, como a injeção eletrônica de combustível’, prevê o professor Reinaldo José Machado, que garante que a maioria dos alunos tem condições de sair trabalhando como ajudantes de mecânica.

Os garotos se entusiasmam porque os ensinamentos são bem práticos. Marcos, 15, corre para ligar o motor do Santana que ajudou a montar. Exibe orgulhoso o som do motor funcionando perfeitamente. ‘É bom fazer o curso porque quando eu sair tenho uma opção. Montamos a peça e ajustamos de acordo com o barulho’, diz Marcos.

Da oficina de mecânica geral, os meninos saem prontos para trabalhar em metalúrgicas. ‘Espero que alguma empresa me dê uma oportunidade. Só com o trabalho a gente pode sair desta vida. Quero trabalhar, mesmo que seja para ganhar pouco’, conclui Eduardo, 18 anos. ‘É um curso muito bom. Vou terminar meus estudos e fazer outro no Senai quando sair daqui’, sonha o jovem Ricardo de 18 anos.

Instalação elétrica residencial e manutenção formam ajudantes em reparos. ‘É uma profissão que eu aprendi aqui. Vai me auxiliar a arrumar um emprego quando eu estiver no mundo lá fora’, avalia Thiago, 17, que garante que não se incomoda em levar choque de vez em quando.

Bons pensamentos

Uma parceria com o governo federal permite que os adolescentes possam trabalhar na fábrica de bolas, recebendo R$ 50,00 por mês. O contrato do projeto Pintando a Liberdade é para a produção de 8 mil bolas de futebol de salão, vôlei e futebol de campo, no prazo de seis meses. A maioria delas será destinada a escolas públicas.

Sérgio Fonseca, coordenador da fábrica, explica que o dinheiro ajuda bastante os garotos, pois muitos são casados e deixaram filhos fora da Febem. ‘Dá um incentivo para trabalhar lá fora. A mente vazia não traz bons pensamentos. O dinheiro favorece a família’, assegura Gabriel, 18 anos.

De Regina Amábile, da Agência Imprensa Oficial

C.C.