Ecologia: Instituto apresenta resultados de pesquisa da captura racional do polvo

Produção média anual de polvo desembarcada em SP de 2000 a 2003 foi de 207 toneladas

seg, 19/07/2004 - 21h39 | Do Portal do Governo

O Instituto de Pesca, que já na década de 1970 estudou a captura de polvos com potes (ou covos), vem acompanhando a evolução dessa pescaria no Estado de São Paulo. Seguindo a sugestão de um pescador de São Sebastião (SP), os pesquisadores desta Instituição Acácio Ribeiro Gomes Tomás e Roberto William von Seckendorff reuniram duas telhas-canal de barro (em formato de “meia-lua”), criando um tipo de pote, de fácil construção, destinado à captura de polvos junto a empreendimentos de mitilicultura mantidos por pescadores no litoral norte paulista.

A partir dessa experiência-piloto, Acácio Ribeiro Gomes Tomás (pesquisador responsável pelo Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica do Agronegócio do Pescado Marinho, sediado em Santos) levou essa técnica experimental também para uma comunidade do Guarujá, onde foi aplicada com sucesso. Depois disso, o pesquisador foi sucessivamente procurado por armadores de pesca interessados em adotar esse tipo de pescaria.

Em fins de 2002, o mercado internacional representava uma excelente oportunidade, face a um tratado pesqueiro entre a Espanha (detentora da principal frota pesqueira de arrasto dirigida a polvos) e países norte-africanos, em cuja Zona Econômica Exclusiva se localizam os maiores bancos pesqueiros de polvos de que se tem conhecimento.

Dessa necessidade do setor produtivo pesqueiro em responder ao mercado internacional, conforme explica Acácio, nasceu a pesca de polvos com potes no Estado de São Paulo, que começou com uma única embarcação, em dezembro de 2002, e após um ano já contava com oito barcos, numa evolução de esforço de pesca sempre acompanhada pela equipe do Instituto de Pesca, que vem trabalhando para a proposição de medidas de manejo, visando ao ordenamento e à sustentabilidade dessa pescaria.

No Brasil ainda inexiste uma legislação específica para essa pescaria que envolve a delimitação do tamanho da frota e do comprimento mínimo de captura e a regulamentação dos apetrechos de pesca. A título de comparação, o pesquisador Acácio diz que em certos países, como Portugal, por exemplo, através de portarias anuais, já se fixam as áreas de pesca e o número de potes a serem utilizados por embarcação.

A técnica

Essa pesca é realizada sobre o leito marinho com o uso de um espinhel de potes, ou seja, um grande cabo principal (linha mestra) ao qual se prendem os potes (cujo número varia de 500 a mais de 5.000, conforme a região), a intervalos regulares, por meio de cabos secundários mais finos.

O conjunto permanece imerso por cerca de três dias. Essa arte de pesca parte do princípio de que os polvos, que buscam e obtêm alimento à noite, de dia procuram refúgio para se protegerem. Os potes são então normalmente lançados sobre fundos de cascalho, não muito distantes de áreas com substrato rochoso onde os polvos buscam abrigo, tornando-se uma “falsa” opção adicional de refúgio.

Segundo o pesquisador Acácio, capturar polvo com espinhel de potes gera a possibilidade de minorar a perda de captura de recursos de alto valor econômico com a eventual redução da pesca com arrasto-de-fundo, medida de preservação ambiental a cada dia mais indicada. Isto porque esse tipo de molusco cefalópode é um dos recursos de maior valor obtido com a pesca arrasteira, ocorrendo como fauna acompanhante em cerca de 80% dos desembarques dessa pesca, principalmente aquela que já teve como espécie-alvo o camarão-rosa. Na verdade, o polvo foi a quinta categoria mais desembarcada nessa pescaria, logo após a abrótea (peixe), o próprio camarão-rosa, a lula e o peixe-sapo. Em 2003 registrou-se a sua captura por 95 embarcações de arrasto sediadas na região de Santos e Guarujá.

O pesquisador Antônio Olinto Ávila da Silva (responsável pela Unidade Laboratorial de Referência em Controle Estatístico da Produção Pesqueira Marinha, também do Instituto de Pesca) cita que, ao longo de 2003, oito embarcações sediadas nessa região foram armadas especificamente para a captura de polvo com espinhel-de-covos, já contribuindo nesse mesmo ano com 37% da produção do molusco na região.

Portanto, isto comprova a eficiência de captura dessa arte de pesca que, ao contrário do arrasto-de-fundo, é passiva, ou seja, é o animal que procura o aparelho de pesca, resultando em impacto extremamente menor sobre o fundo oceânico e seus habitantes, e num bem menor custo operacional.

Os pesquisadores do Instituto de Pesca salientam que a produção desembarcada por esses barcos especificamente armados com espinhel-de-covos foi composta exclusivamente por polvos e que as observações de campo mostram que os animais capturados por essa arte têm sido de porte tecnicamente aconselhado. Isto já não ocorre com o polvo capturado com redes de arrasto.

A produção média anual de polvo desembarcada no Estado de São Paulo de 2000 a 2003 foi de 207 toneladas, variando de 93 toneladas em 2002 a 316 toneladas em 2003. Nesse período, segundo o pesquisador Antônio Olinto, a captura desse tipo de pescado representou até 15% do total em 75% dos desembarques.

Para Acácio Tomás, são comuns as variações anuais do total das capturas, devido às características do ciclo de vida do animal, que é muito curto (apenas um ano), podendo haver grande variação no seu recrutamento (quando o animal atinge o tamanho adequado e/ou as áreas de pesca e passa a ser capturado pelas frotas) em razão do contingente de adultos desovantes e/ou da sobrevivência de jovens, decorrente de sua alta susceptibilidade às oscilações ambientais.

Ordenamento da atividade

Com base também na experiência de alguns países, a equipe de especialistas do Instituto de Pesca entende que a captura de polvos com potes deva ser planejada, visando a uma produtividade de alto rendimento. Para ela, hoje é necessária a aplicação das seguintes medidas de ordenamento: a) controle da pesca do polvo-comum Octopus cf. vulgaris, com a emissão de licenças específicas para a captura com covos; b) limitação do número de embarcações engajadas na pesca com covos. (Neste particular, Acácio entende que a atual quantidade de barcos nessa pescaria já seria suficiente para, no período de um ano, se avaliar a viabilidade de aumento da frota.

Ele explica que hoje cerca de 40 barcos já capturam polvo com potes no Estado de São Paulo, sugerindo manter-se em torno de oito embarcações, como ocorreu em 2003); c) obrigatoriedade do fornecimento de informações sobre captura e esforço por operação de pesca; d) acompanhamento sistemático de desembarques de pescado para a coleta direta de informações, por meio de entrevistas com os mestres de embarcações e observações em campo sobre a evolução da pescaria e dos apetrechos utilizados; e) realização de embarques de observação científica para o monitoramento das capturas, além de marcação de exemplares visando obter informações detalhadas sobre a distribuição espacial e o ciclo de vida da espécie.

Na opinião de Antônio Carlos Simões, diretor-técnico do Centro de Comunicação e Transferência do Conhecimento, o Instituto de Pesca busca fazer a parte que lhe cabe, ou seja, “conhecer os recursos pesqueiros sob explotação e propor medidas de manejo que permitam a sua pesca sustentável”. No entanto, harmonizar a intervenção do homem-pescador nos ciclos naturais dos recursos exige ainda mais que isso: exige atenção, eficiência e bom senso das autoridades normalizadoras. Exige dos armadores e pescadores, sobretudo: altruísmo, consciência ecológica e respeito a esse bem social – os recursos pesqueiros.

Do Instituto de Pesca
C.A.