Consumidor: Procon-SP alerta para Medida Provisória que altera regras dos Plano de Saúde

nd

qui, 09/08/2001 - 10h51 | Do Portal do Governo

A Fundação Procon-SP, instituição vinculada à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado, alerta para os diversos problemas que a edição da Medida Provisória (nº 2.177-43, de 27/7/2001) trará aos consumidores. Levando-se em conta a natureza complexa da matéria, as alterações não são de fácil assimilação, mesmo para os técnicos especializados.

Mais de dez anos foram necessários para que os planos privados de assistência à saúde fossem regulamentados. A aprovação da Lei 9.656/1998 deu início a um processo que deveria ao longo dos anos alcançar a harmonização e o equilíbrio nesse segmento, porém apenas após três anos a mesma foi descartada por meio da MP 2.177-43, de 27/7/2001. Nos últimos três anos essa lei já vinha sendo descaracterizada por regulamentações deficientes e excludentes (MPs e resoluções).

A Agência Nacional de saúde (ANS), que deveria ter uma preocupação em eqüilibrar as relações entre os consumidores e as operadoras de planos de saúde, adotou como base para regulamentação do segmento um ponto de vista exclusivamente mercantilista, ignorando o aspecto social da prestação de serviços de saúde.

Principais alterações:

1) A ANS poderá autorizar a comercialização de planos com segmentações, subsegmentações e exigências mínimas diferenciadas e específicas, além de I – plano ou produto organizado em sistema hierarquizado e gerenciado; II – plano ou produto com preços de comercialização, reajustes e revisão e condições especiais de mobilidade dos beneficiários; III – plano ou produto com cobertura assistencial condicionada à disponibilidade dos serviços de assistência à saúde na respectiva área de abrangência.

Os técnicos da Fundação Procon-SP apontam que não há clareza quanto ao alcance desse sistema e sobre o que seriam as condições especiais. Se pelo sistema apontado como necessitar-se-a de triagem prévia do clínico geral para encaminhamento a especialistas, entende-se que haverá dificuldade de acesso a assistência, tanto pelo tempo dispendido pelo consumidor, quanto por pressão que a operadora possa exercer junto ao profissional para conter custos.

2) A MP menciona novamente, no Artigo 16 (que define o Plano de Acesso), a garantia de atendimento à rede hierarquizada de serviços. Entendendo-se que essa rede signifique a possibilidade de haver a contratação sem a garantia ao consumidor de escolher, dentro da rede credenciada, os prestadores de serviço de sua confiança, cabendo à operadora definir e encaminhar os usuários que necessitarem de atendimento, de acordo com sua conveniência. Assim, não há qualquer garantia de continuidade de tratamento com o mesmo profissional ou no mesmo local, o que além de contrariar o direito de escolha do consumidor (previsto pelo Código de Defesa do Consumidor-CDC) apresenta a possibilidade de legalizar a disponibilização do serviço para aqueles usuários que puderem pagar um plano de livre escolha com reembolso ou de escolha de acordo com a rede credenciada.

Cabe destacar que um dos fatores que mais influenciam na escolha do plano é a relação dos profissionais e serviços credenciados, sendo que a localização, qualidade do atendimento, serviços disponíveis, pronto socorros são fundamentais para essa escolha.

Pelo CDC a informação adequada, clara e precisa é outro direito básico do consumidor, e deve, portanto, constar no contrato a relação dos profissionais e serviços responsáveis pelo atendimento. Não basta informar que terá um determinado número de especialistas e hospitais com determinado número de leitos e tecnologia.

3) A MP Nº 2.177-43 traz ainda outros prejuízos aos consumidores, principalmente referentes à restrição de coberturas. De acordo com o artigo 12-A § 1º, os planos subsegmentados, acima referidos, não poderiam excluir doenças e limitar quantitativamente os procedimentos. Tal dispositivo é frontalmente contraditório com o inciso III do mesmo artigo, pois este possibilita o oferecimento de planos condicionados à disponibilidade dos serviços de assistência à saúde na respectiva área de abrangência, ou seja, caso o consumidor necessite de um serviço inexistente na região onde a empresa atua, esta não será obrigada a garantir o atendimento. Assim, haverá permissão legal de negativa de cobertura para determinadas doenças e procedimentos. As restrições e exclusões, sempre combatidas em outras épocas, inclusive junto ao Poder Judiciário como abusivas, e que foi um dos pontos principais das discussões para elaboração de lei específica, retornará e estará consagrada no texto legal.

4) Foi feita alteração quanto à adaptação dos contratos antigos (formados até 31/12/1998).O art. 35 é alterado, sendo estabelecido no § 9º que os consumidores devem optar pela adaptação até 31/12/2003 e após este prazo, a adaptação poderá ser feita por acordo entre as partes (§ 10).

Assim, a adaptação deixa de ser opção que o consumidor poderia exercer a qualquer momento, para ser novamente uma obrigatoriedade, tendo em vista a imposição de prazo. Esse tópico já havia sido superado anteriormente e volta com mais força.

A Fundação Procon-SP reitera entendimento de que a adaptação deve ser uma opção e não uma imposição, portanto, torna-se ainda mais grave a possibilidade de que após o prazo de 2003, o consumidor esteja sujeito a reiniciar um contrato, com cumprimento de carências, na medida que acreditamos que o “ acordo entre as partes” efetivamente não ocorrerá.

Cumpre ressaltar que a opção de adaptação dos consumidores está completamente comprometida tendo em vista as constantes alterações ocorridas na legislação. Essas freqüentes mudanças geram incertezas e inseguranças aos usuários de planos, principalmente pelo receio de estar optando por algo que possa ser desfavorável frente ao contrato que possui ou ainda que possa ser alterado.

5) Foi estabelecido o Plano Especial de Adesão a Contrato Adaptado, que impõe às operadoras a obrigatoriedade de oferecer a toda a carteira com contratos firmados anteriormente a 2/1/99 (cobertura estabelecida na Lei 9.656/98), estipulando porém, condições de acesso. Esse Plano Especial prevê ainda, a migração (de plano antigo para novo) com percentual único de aumento das mensalidades, com regras para reajuste de faixa etária e isenção de carências, devendo a operadora ter um número mínimo de adesões de usuários.

Não fica claro o que significa “condições de acesso” à cobertura estabelecida no artigo 35 L, inciso I. Se for restrição mediante indicação por meio do plano de acesso, ou seja, a operadora determina o prestador que efetuará o atendimento, haverá um grande prejuízo aos consumidores, que deixarão de escolher (livremente ou até na rede credenciada) o profissional ou serviço, condicionando-se a aceitação àquele indicado pela operadora.

Questiona-se se haverá transparência e informação aos consumidores quanto aos cálculos que subsidiarão o percentual único a ser definido para o plano especial, bem como demais condições que inclusive podem estar restringindo a opção.

6) De acordo com a ANS, as faixas etárias poderão ser estabelecidas diferentemente do que determina a Lei 9.656/98, sendo que estão somente de acordo com essa lei, os limitadores de reajuste, ou seja, o valor estabelecido para a última faixa etária não pode ser superior a seis vezes o valor da primeira faixa etária. Verificamos que na prática, os percentuais mais elevados acabam ficando justamente nas últimas faixas etárias, atingindo, assim, os consumidores mais idosos.

7) O Art. 12, inciso V, alínea “a” da MP altera a Lei no que tange a partos (altera o termo “partos termo” foi substituída pela palavra “parto”. O que poderiam em uma leitura simplista significar um avanço, mostra ser um prejuízo. Segundo informações da Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo, o parto à termo ocorre no período entre 37 e 42 semanas de gravidez; parto prematuro é o que ocorre no período entre 22 semanas e 36 semanas e seis dias; aborto é quando existe a perda-morte do concepto do início da gestação até 22 semanas.

Ao retirar o prazo máximo de 300 dias para partos a termo, há claro prejuízo aos consumidores, pois a carência de 300 dias era restrita para partos com nove meses de gravidez. Pela lei, se o parto acontecia aos sete meses (28 semanas – prematuro) de gestação, poderia ser entendido como “demais casos”, cuja carência máxima era, antes da MP, de seis meses. Ainda, se ocorressem problemas no processo gestacional, a carência máxima seria de 24 horas.

8) A MP amplia o prazo para direções Fiscal e Técnica, que passaram de 180 para 365 dias. Considerando-se que as direções técnica e fiscal devem atuar no sentido de avaliar a possibilidade de recuperação da saúde econômico-financeira, preocupa um prazo tão extenso, para avaliação final da situação das operadoras sujeitas as direções técnica e fiscal, sobretudo referente à prestação de serviço oferecida aos consumidores, que nessas situações já se encontram comprometidas (descredenciamentos, negativas de atendimento). Não é possível aceitar o fato de que consumidores com problemas de saúde tenham ser colocados em situações de espera e incerteza para tratamento/cirurgia/atendimento etc. por um período de um ano.

Problemas de regulamentação não são novos

Os técnicos da Fundação Procon-SP destacam também que a regulamentação do setor tem gerado inúmeras discussões de polêmicas com a publicação de inúmeras MPs e resoluções, descaracterizando o próprio texto da Lei 9.656/98, bem como sua essência:

– Rol de procedimentos de alta complexidade: ligado à cobertura de doenças e lesões preexistentes, foi exaustivamente discutido entre os órgãos de defesa do consumidor e entidades médicas, havendo unanimidade em apontar sérios problemas nos procedimentos constantes dessa lista e, sobretudo, os sérios riscos de determinadas exclusões, por um período tão extenso, de dois anos (exemplo: quimioterapia, ressonância magnética, diálise etc.).

– Autorizações de reajustes por alteração de faixa etária, a consumidores com 60 anos ou mais de idade e 10 anos ou mais de contratação: concedidas pela ANS às operadoras de planos de saúde de forma questionável, pois grande parte dos contratos são omissos com relação às faixas e aos percentuais de reajustes, bem como redigidos de forma obscura, ou seja, sem a devida clareza e objetividade no tocante a informação do aumento da mensalidade por alteração da faixa etária e ainda com base em contratos que apesar de informarem os percentuais podem ser entendidos como abusivos, por serem extremamente elevados. A Fundação Procon-SP encaminhou o caso ao Ministério Público Federal, que recepcionou como uma representação em face da ANS.

– Urgência e emergência: apesar da Fundação Procon-SP ter apresentado à ANS parecer da Procuradoria Jurídica, da Secretaria de Estado da Saúde, manifestando a inconstitucionalidade da Resolução 13, que dispõe sobre a matéria, bem como entendendo que o prazo máximo de carência, para situações de urgência e emergência, deve ser de 24 horas, não se verificou a necessária alteração ou revogação da referida Resolução.

A Fundação Procon-SP reforça que as mudanças introduzidas pela ANS representam um retrocesso a uma situação já vivenciada pelos consumidores quanto o setor de assistência privada à saúde necessitava ser regulamentado para garantir: acesso à saúde com qualidade, transparência, harmonia e equilíbrio nas relações, bem como viabilidade econômico-financeira das operadoras. Paralelamente, a Fundação Procon-SP entende que a possibilidade de abertura de consulta pública não resolverá de forma efetiva as graves alterações incorporadas na Medida Provisória.

Embora a Lei 9.656/98 apresente diversos pontos a serem alterados para que essas condições sejam atingidas, o contrário aconteceu nos últimos três anos, pois as alterações promovidas desfiguraram o objetivo do própria lei, que era levar a efetiva assistência à saúde a todos, indistintamente.

As pequenas concessões aos consumidores trazidas na MP (aumento da cobertura para recém nascidos, de 30 para 45 dias e a possibilidade de acompanhante para pacientes com mais de 65 anos) são mínimas se comparadas às grandes perdas e retrocessos.