Casa da Solidariedade I e II atendem 530 crianças da Região Central da Capital

Unidades encerraram ano letivo nesta sexta-feira, dia 5, com apresentações culturais para Lu Alckmin

sex, 05/12/2003 - 15h50 | Do Portal do Governo


As crianças das Casas da Solidariedade I e II, localizadas nos bairros de Campos Elíseos e Parque Dom Pedro, respectivamente, encerraram, nesta sexta-feira, dia 5, o ano letivo. As unidades oferecem atividades fora do horário escolar a crianças em situação de risco, com idade entre 7 e 14 anos, que moram ou estudam na região Central da Capital. O período de férias das casas está vinculado ao ano letivo, nos meses de julho e dezembro.

Para marcar o fim das atividades de 2003, as crianças mostraram à presidente do Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo (Fussesp), Lu Alckmin, um pouco do que aprenderam durante o ano, com apresentações de teatro, dança, capoeira, orquestra, coral e violão. Além disso, Lu Alckmin pôde ver uma exposição dos trabalhos realizados nas aulas de história em quadrinhos, tapeçaria, orientação escolar e artes.

Mantidas pelo Fussesp, as Casas da Solidariedade I e II oferecem gratuitamente às crianças em situação de risco aulas de dança, educação física, violão, capoeira, informática, história em quadrinhos, tapeçaria, orientação escolar, orquestra e coral, entre outras. Também oferecem alimentação, acompanhamento médico e odontológico, fonoaudióloga, assistente social e psicóloga, que trabalha o grupo familiar da criança. “Investindo na criança e no jovem construiremos um mundo melhor. O trabalho desenvolvido nas Casas da Solidariedade, de conscientização, respeito ao próximo e sociabilidade, é modelo. Queremos, inclusive, amplia-los para as escolas”, afirma Lu Alckmin.

Na opinião da presidente do Fussesp, as crianças levam o que aprendem nas Casas para os familiares e para a comunidade, além disso, conquistarão um futuro melhor, porque estão mais preparadas.

Atividades mudam a rotina das crianças

As atividades desenvolvidas nas duas unidades mudam a rotina das crianças. Rony Weslley Marques da Cruz freqüenta a Casa da Solidariedade I desde 1996. Como completou 14 anos, ele não voltará à unidade em 2004. Rony mora no bairro da Barra Funda e ficava sozinho em casa enquanto a mãe trabalhava. Desde que entrou na Casa, não parou um só minuto: toca violino na orquestra do Projeto Guri, joga futebol, aprendeu informática, fez tapetes e, principalmente capoeira. Ele foi o campeão dos Primeiros Jogos Abertos de Capoeira da Casa da Solidariedade.

Suas perspectivas de vida mudaram. Pensando no futuro, ele está fazendo um curso de informática numa escola particular e pretende continuar se preparando para o mercado de trabalho com cursos de inglês, espanhol e administração. “Aqui se aprende a conviver em grupo, realizar atividades em grupo. Se eu estivesse em casa, não teria esse convívio”, conta.

Em vez de ficar nas ruas ou sozinhas em casa quando não estão na escola, 530 crianças em situação de risco, que moram ou estudam na região Central da Capital, contam com essa alternativa de educação, esporte e entretenimento fora do horário escolar.

“O Centro de São Paulo é muito frio. Cada pessoa representa apenas mais um na multidão. O que procuramos fazer aqui é resgatar a auto-estima da criança, levá-la a reconhecer-se como cidadã e vislumbrar novas possibilidades”, explica a diretora da Casa da Solidariedade I, Maria de Fátima Correa Crespi. Ela destaca que nas unidades também se ensinam bons hábitos e conceitos básicos de higiene e saúde. “A criança aprende a comer e agradecer o que come. Isso gera um valor diferenciado e desperta o sentimento de solidariedade”, acredita.

Freqüência na escola é obrigatória para entrar na Casa da Solidariedade

Para entrar na Casa da Solidariedade, a criança deve freqüentar a escola. A mãe ou responsável também tem obrigações: ela precisa passar por consulta ginecológica anualmente para fazer a prevenção ao câncer de mama e de colo de útero, em ginecologista vinculado à unidade.

Na opinião da diretora, o programa auxilia toda a família. “Muitas mães puderam voltar a estudar ou trabalhar no horário em que as crianças ficam aqui e nós as incentivamos a aproveitar esse tempo para aumentar a renda da família. No ano passado, montamos um coral de pais e tivemos de parar com o projeto porque a maioria voltou a estudar. Isso nos deixou muito felizes”, atesta Crespi.

“Contemplamos as famílias mais necessitadas. As crianças que freqüentam as Casas geralmente moram em pensões, cortiços ou habitações coletivas no entorno das unidades. Algumas estudam na região. Não aceitamos crianças que moram longe e precisariam gastar com transporte porque isso afetaria o orçamento familiar”, destaca.

Como na escola, a criança tem a obrigação de freqüentar a Casa da Solidariedade e participar das atividades propostas de segunda a sexta-feira, em horário definido, ou seja, das 8 às 12 horas, para as que estudam à tarde, e das 13 às 17 horas, para quem está na escola no período matutino. Cada criança recebe duas refeições por dia: café da manhã e almoço ou almoço e lanche da tarde. Já os uniformes, compostos por calça azul e camiseta branca, dependem de doações. “Os uniformes são obrigatórios na medida do possível”, explica a assistente social Maria Aparecida de Souza.

“Se a criança deixar de freqüentar a escola perde o direito de vir para a Casa. E se faltar aqui, entramos em contato com a escola e com a família para saber o que está acontecendo. Trabalhamos em sintonia com escola, família e comunidade. Se, por exemplo, uma de nossas crianças faz alguma ‘traquinagem’ lá fora, os vizinhos nos ligam avisando”, explica Crespi.

Entre as atividades, educação física e tapeçaria são as preferidas

“Uma criança leva cerca de dois anos para formar um hábito. Aqui, temos tempo de semear e ver desabrochar. A criança passa até sete anos conosco. E depois que saem, muitas voltam para contar histórias bonitas, de trabalho, de estudo e de família”, destaca a diretora Fátima Crespi.

Leandro Gomes da Serra, de 7 anos, entrou na Casa da Solidariedade I em agosto deste ano. Quando chegou, ele tinha uma alimentação restrita. “Hoje, como de tudo. Até salada e legumes”, conta, muito tímido. Meio sem querer continuar a conversa, ele diz gostar das aulas de educação física e orientação escolar. Depois de algumas horas, nossa reportagem reencontra Leandro. Dessa vez, ele está ensaiando uma música que será apresentada à presidente do Fussesp no dia do encerramento do ano letivo pelo coral do Projeto Guri instalado na unidade. O coral, e também a orquestra do Guri, são resultado de uma parceria com a Secretaria de Estado da Cultura.

No meio de amigos, Leandro nos recebe com um largo sorriso e dispara sem cerimônia: ‘Isso na sua mão é um gravador? Mostra como funciona!’. E, voltando-se para a professora: ‘Tia, podemos cantar uma música para ela?’. A amiga, Tamiris Pereira Cunha, de 8 anos, entra na conversa e conta que quer ser cantora. Pede à professora do Guri, Geni Barbosa, que os deixe cantar ‘Ode à Alegria’ de Beethoven. Orgulhosa, Tamiris diz que além de alemão, o grupo também canta uma música em latim e outra num dialeto cubano.

Novas perspectivas para o futuro

O objetivo das Casas da Solidariedade não é a formação profissional das crianças, mas oferecer-lhe novas perspectivas de vida, evitando que fiquem nas ruas ou sozinhas em casa. O objetivo das Casas da Solidariedade não é a formação profissional das crianças, mas oferecer-lhe novas perspectivas de vida, evitando que fiquem nas ruas ou sozinhas em casa. “Nas oficinas, trabalhamos a criatividade e a sociabilidade da criança. Para se ter uma idéia, na oficina de informática, as crianças desenvolvendo atividades sobre cidadania e reciclagem de materiais”, explicou a diretora da Casa da Solidariedade II, Maria Helena Galvani.

Talita Silva Venâncio, de 13 anos, que mora nas proximidades do Bairro de Campos Elíseos, conta que passava o tempo livre em casa, dormindo. Ela chegou à Casa em fevereiro deste ano e já comemora os progressos: “O que mais gosto de fazer aqui é tapeçaria. Já estou no quinto tapete e pretendo continuar. Outra coisa boa é que estou emagrecendo”, diz.

O curso de tapeçaria é um dos preferidos dos alunos. O professor Miguel Sérgio Brozoski credita o sucesso de suas aulas à liberdade de expressão e ao fato de permitir que as crianças trabalhem em grupo. Muito envolvido, o professor Sérgio não fica longe da Casa nem quando está doente. Mesmo com uma forte gripe, ele exibia orgulhoso as guirlandas confeccionadas pelos alunos neste segundo semestre. “Alguns descobrem nisso uma atividade profissional. Mas não sou unanimidade aqui. Tem criança que já disse achar tapeçaria coisa de ‘mauricinho’”, diverte-se.

Já Paloma das Neves, de 10 anos, que freqüenta a Casa de Solidariedade há três anos, ficava sozinha em casa enquanto a mãe, Maria de Fátima das Neves, trabalhava. “Insisti muito para que ela pudesse ficar aqui. É muito difícil conseguir uma vaga. Está sempre lotado”, atesta Maria de Fátima.

A procura por vagas é muito grande. Tanto que a Casa de Solidariedade II foi inaugurada em setembro de 2000 para atender parte dessa demanda. Mesmo assim, as duas unidades estão com fila de espera.

Ana Cláudia da Silva chegou à Casa de Solidariedade em 1999. Com 13 anos, ela deverá deixar a unidade em agosto de 2004. “Gosto daqui. Nunca imaginei que aprenderia a fazer tapeçaria, tocar violino e violão. No ano que vem, pretendo fazer um curso de arte”, afirma.

Quando o jovem completa 14 anos e precisa deixar a Casa da Solidariedade, ele pode buscar o preparo para o mercado de trabalho, inscrevendo-se nos cursos oferecidos pelo Instituto Criança Cidadã, com o qual as unidades mantêm parceria.

A Casa da Solidariedade I fica na Rua Guaianazes, 1.112, no bairro de Campos Elíseos. E a Casa da Solidariedade II fica na Rua Frederico Alvarenga, 125, Parque Dom Pedro.

Cíntia Cury