Biodiversidade: Biólogos descobrem 52 espécies de animais que vivem no fundo do oceano

Trabalho foi coordenado por pesquisadora da Unicamp

qua, 19/02/2003 - 11h21 | Do Portal do Governo

Imagine um litoral em que, de cada dez espécies de animais que vivem no fundo do mar, uma pode ser nova e totalmente desconhecida para a ciência. Uma costa com tal riqueza ainda inexplorada de fauna bentônica, o nome técnico dado a moluscos, crustáceos, vermes e outros seres que habitam o assoalho dos oceanos, existe de verdade e nem fica tão longe assim. É a porção do litoral norte de São Paulo, nos municípios de São Sebastião, Caraguatatuba e Ubatuba, distante cerca de três horas de carro da cidade de São Paulo.

Ocultos na areia das praias, incrustados na rocha de costões ou simplesmente escondidos nas profundezas do mar, alguns são bonitos e singulares, outros podem até causar medo, como o verme Diopatra cuprea. Provavelmente estavam ali, a um passo de serem descobertos pelo homem, desde tempos imemoriais. Faltava alguém com sorte e disposição para revolver as areias e os costões no momento e lugar certos. Esse alguém são os pesquisadores do projeto temático da FAPESP que visa mapear a biodiversidade da fauna bentônica marinha presente na costa paulista, coordenado por Antonia Cecília Zacagnini Amaral, do Instituto de Biologia (IB) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Depois de realizar extensas coletas entre janeiro de 2001 e dezembro de 2002 em trechos do litoral dessas três cidades, quase sempre em pontos em que ainda não haviam sido alvo de trabalhos exploratórios no passado, os pesquisadores do projeto pararam a parte de campo e foram analisar o que tinham capturado. Até agora, conseguiram contabilizar 535 espécies diferentes, entre as quais algumas de aspecto tão intrigante como as colônias avermelhadas de tunicados de Symplegma rubra , seres que parecem pequenas bolhas presas em rochas ou costões, e a serpente-do-mar, o equinoderma Amphiodia riisei , que pertence ao mesmo grupo taxonômico das estrelas-do-mar.

Em meio a esse meio milhar de distintas espécies catalogadas, 52 foram identificadas como novas para a ciência. São seres nunca antes descritos em lugar algum do mundo pela literatura especializada em bentos. Daí a proporção de uma espécie nova de fauna bentônica para cada dez identificadas no litoral norte paulista, a impressionante cifra mencionada no início desta matéria. ‘E olha que esses números se referem a apenas 30% das amostras coletadas’, afirma Cecília.

‘Os outros 70% estão sendo estudados.’ Em termos de tamanho, 40 das 52 novas espécies pertencem à chamada meiofauna. São animais que ficam retidos em uma malha de 0,05 milímetro. As outras 12 novas espécies são representantes da macrofauna, animais de maior porte.

Seres rastejantes

Entre as 52 novas espécies, há descobertas interessantes, sobretudo para quem trabalha com taxonomia. Foram capturadas, por exemplo, cinco variedades de D. cuprea , verme anelídeo do mesmo grupo das minhocas que pode chegar a 15 centímetros de comprimento por 8 milímetros de largura e foi identificado pela primeira vez há mais de 200 anos. Cada uma dessas variedades, apesar de muito parecidas, é, na verdade, uma espécie diferente, que será descrita minuciosamente por uma especialista nesse tipo de animal marinho.

Para quem não tem olhos treinados e encontra a D. cuprea nas areias das praias, as cinco variedades são consideradas iguais. ‘O mais impressionante é que essas cinco espécies foram encontradas apenas num trecho do litoral de São Paulo’, diz Cecília. ‘Imagine quantas mais pode haver em toda a costa brasileira.’ Felizmente, alguns exemplares desses diversificados seres rastejantes, como a Eunice sebastiani , utilizada como isca para peixes, escaparam dos pescadores, mas não das coletas dos pesquisadores.

do Porta da Revista da Fapesp

V.C.