Agricultura: Cati contribui para a produção de biodiesel

Objetivo é transferir ao produtor rural a tecnologia de produção de oleaginosas e a extração de óleo para movimentar tratores

ter, 17/12/2002 - 19h38 | Do Portal do Governo

Óleos vegetais como combustível: alternativa, desafio ou solução?

O uso de óleos vegetais como combustível já é conhecido de longa data. Além de limpo e não agredir o meio ambiente é mais econômico. Vários institutos e universidades brasileiras tem pesquisado essa tecnologia para a produção de biodiesel, como é conhecido, trabalhando com o óleo de diversas oleaginosas produzidas no Brasil. E já existe a preocupação com a criação de normas e padrões técnicos para a produção e venda em escala comercial, como já é feito na Europa, principalmente na Alemanha e França e também nos Estados Unidos.

A Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), também vem dando sua contribuição. Na Fazenda Ataliba Leonel, localizada em Manduri – SP, técnicos vem acompanhando, através de observações práticas o comportamento de um trator MF235 com motor Perkins. Este motor está funcionando a mais de 500 horas com óleo de girassol. O objetivo é transferir ao produtor rural a tecnologia de produção de oleaginosas e a extração de óleo para movimentar tratores, colheitadeiras, veículos, motores de irrigação, gerar energia elétrica, etc, partindo de conceitos de viabilidade na substituição total do diesel fóssil, esgotável, por diesel vegetal renovável.

Segundo o engenheiro agrônomo Sylmar Denucci, do Centro de Testes, Avaliação e Divulgação da Cati – Sementes e Mudas, antes de 1930 já existia a preocupação com a solução do problema energético no país sendo o babaçu, o dendê e outras oleaginosas citadas como fontes de combustível alternativo, mas somente em períodos de crise. A cada ano que se passa, diminuem as reservas de petróleo e aumenta a necessidade de manter o equilíbrio ambiental. Isso vem possibilitando atualmente um interesse cada vez maior na pesquisa e desenvolvimento de combustíveis alternativos.

Para debater o assunto a Cati realizou no final de novembro um Fórum sobre a Utilização de Óleos Vegetais como Combustível, que reuniu órgãos de pesquisa e empresas de diversos estados, cujo objetivo foi proporcionar esclarecimentos e prestar uma contribuição para a adoção dessa alternativa, que é um desafio ou, talvez, a solução para o setor energético nacional.


A Cati e a produção de óleos vegetais

Sementes e Mudas tem como função principal o desenvolvimento de alternativas para o agricultor familiar. Dentro dessa filosofia, surgiram as sementes de milho variedade, nabo forrageiro, mamona, girassol, painço, setária, entre outras. O milho variedade é uma opção de baixo custo e produtividade compatível com os híbridos disponíveis no mercado. O nabo forrageiro surgiu como opção de adubação verde. A mamona também foi resgatada pela Cati. O girassol foi obtido como alternativa de silagem e adubação verde e depois veio o estímulo a produção artesanal do óleo, com bom rendimento e a custo baixo. Sylmar explica que “só colocar as sementes no mercado não foi suficiente. Era necessário fornecer outras alternativas. Uma coisa foi puxando a outra e, com o passar do tempo, vislumbrou-se a questão energética e ambiental, que já é desenvolvida em muitos países.”

Nesse sentido, o Centro de Testes vem trabalhando para obtenção de óleo com duas oleaginosas, o girassol e o nabo forrageiro, para abastecimento de máquinas e veículos movidos a diesel. Desde 2000, o órgão tem procurado parcerias, no sentido de aprimorar e simplificar os métodos de extração, filtragem e utilização do óleo “in natura”. Sylmar explica que já foram consumidos mais de 2.000 litros de óleo bruto de girassol nos testes com máquinas que já tem centenas de horas trabalhadas. “A conclusão até agora é que a viabilidade econômica dessas opções é muito grande e as dificuldades encontradas são apenas um desafio diante das possibilidades. Além disso, os resíduos proporcionam outros benefícios: as tortas, por exemplo, são utilizadas na composição de rações para uso na propriedade ou comercialização”

O óleo de girassol para uso como combustível tem um custo muito baixo, ficando em torno de R$ 0,63 o litro. O custo da produção agrícola fica em torno de R$ 522,00 por hectare, que rendem em torno de 1.500 quilos. Nesse custo estão incluídos os serviços (adequação da área, aplicação de herbicida e inseticida, semeadura, adubação de cobertura, colheita, transporte e secagem) e os insumos (herbicidas, sementes, fertilizantes, inseticida e sacaria). O custo da extração de óleo bruto, na Fazenda Ataliba Leonel em Manduri, ficou em R$ 150,00, com um rendimento de 400 litros de óleo, 1.050 quilos de torta de girassol e 50 quilos de borra. Nesse custo está embutido a amortização, depreciação e manutenção da miniprensa, a mão de obra e a energia elétrica utilizada.

O preço de aquisição da miniprensa é de R$ 6.500,00. Ela tem capacidade de prensagem de 40 quilos de girassol por hora e uma vida útil de 15 anos. É economicamente viável para uma área mínima de 50 hectares e máxima de 100 hectares, desde que em turno duplo.

A experiência do IPT com o uso de biodiesel

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) também vem testando a substituição parcial ou total do óleo diesel por combustíveis a base de óleos vegetais em motores de ignição por compressão. As primeiras pesquisas foram feitas com óleo de soja. Atualmente o IPT, em conjunto com outros institutos de pesquisa e associações da indústria automobilística, de autopeças e produtores de óleos vegetais, participam do Programa Brasileiro do Biodiesel. O IPT vem realizando ensaios comparativos com óleos diesel, de babaçu e de soja.

Segundo Maurício A.Trielle, responsável pelo Laboratório de Motores do IPT, até agora, as experiências indicam que os óleos vegetais são combustíveis alternativos adequados a motores de ignição por compressão. Nos motores recentes, de injeção e de turbo-compressores, ainda é necessário realizar ensaios específicos para verificar a evolução dos depósitos nos injetores, o desempenho e a compatibilidade. Como vantagens, os óleos vegetais apresentam elevada lubricidade e alto número de cetano, que podem ser transformados em aditivos ideais ao futuro óleo diesel de baixíssimo teor de enxofre.

Análise da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Segundo Donato Aranda, da Escola de Quimica da UFRJ, o Brasil consume anualmente cerca de 30 bilhões de litros de diesel, sendo que 10 bilhões são importados. Por esse motivo, a Universidade vem avaliando o biodiesel, já utilizado em diversos países do mundo. “Sua grande vantagem é a utilização sem necessidade de adaptação dos motores a diesel comerciais. Além disso, em termos ambientais é 78% menos poluente, já que possui mil vezes menos enxofre.”

Outro trabalho realizado pela UFRJ, através do departamento de energia mecânica, é a análise de desempenho de geradores operando com óleo de dendê “in natura”. Os testes foram feitos com um motor monocilindrico de injeção indireta. Segundo Valéria Pimentel, como a viscosidade desse óleo a temperatura ambiente é muito alta e, para que não comprometa o motor, o óleo de dendê para chegar a viscosidade próxima ao diesel, terá que ser aquecido a 85 graus centígrados. Mas, com algumas modificações é possível concluir que a utilização desse óleo é uma alternativa viável em substituição aos combustíveis derivados de petróleo.

O Brasil no contexto energético mundial

De acordo com o professor DSc José Walter Bautista Vidal, a maior preocupação do Brasil com energia são os possíveis colapsos energéticos, o alto custo do gás e, por consequência, da energia elétrica, além de aumentar o efeito estufa. As usinas hidrelétricas, apesar de produzirem energia limpa, muitas vezes exigem intervenções radicais no meio-ambiente, provocando perdas do potencial energético das florestas e inundando terras f’érteis. As florestas protegem o solo, preservando mananciais e nascentes.

Bautista Vidal explica que o colapso futuro não será apenas de energia elétrica, mas, principalmente, dos combustíveis fósseis. As reservas de petróleo dos EUA, por exemplo, só teriam duração de cinco anos, a Alemanha e o Japão estão a zero. A Arábia Saudita, detentora das maiores reservas do mundo, não produzirá uma só gota daqui a trinta ou quarenta anos. A solução está na energia renovável. Para substituir a gasolina, temos o álcool etílico, da cana-de-açúcar, da mandioca, do milho, etc. Para o óleo diesel, os substitutos são os óleos vegetais tropicais: dendê, mamona, soja, girassol, colza, amendoim, babaçu, etc. Rudolph Diesel, por exemplo, desenvolveu os motores de ciclo diesel a partir do óleo vegetal de amendoim.

Bautista finaliza dizendo que o Brasil é uma grande fonte energética. Só na Amazônia a utilização de 70 milhões de hectares aptos ao dendê, permitiria produzir o óleo vegetal substituto do diesel de petróleo. Além disso, um empreendimento desse porte poderia gerar milhões de empregos, em uma produção de elevado valor agregado. “Com mais de 50 milhões de miseráveis, o Brasil precisa dessa geração de emprego. Um programa energético com essas características, deixa de ser um programa só para o Brasil, para ser um programa para o mundo.”