Pronunciamento de Serra no Centro de Estudos Americanos da Faap

Evento aconteceu na segunda-feira, 7, em seminário na Fundação Armando Álvares Penteado , em São Paulo

ter, 08/05/2007 - 14h57 | Do Portal do Governo

Evento aconteceu na segunda-feira, 7, em seminário na Fundação Armando Álvares Penteado , em São Paulo

Como os palestrantes foram embora da mesa e eu não assisti ao seminário, não posso me aventurar a falar sobre a relação Brasil-EUA. Dificilmente poderia falar algo que oferecesse algum interesse a respeito do tema todo. Fico satisfeito, em primeiro lugar com a criação desse centro. Pela FAAP que dá seqüência ao conjunto de atividades de natureza cultural, pós-graduação e acadêmicas, com a organização de um centro como esse que, sem dúvida, vai ser um lócus de debate a respeito do país e das relações entre o Brasil e os EUA, sendo os EUA isoladamente o país mais importante para o Brasil nas suas relações internacionais.

E não poderia esse trabalho ter ficado em mãos mais competentes que as do Sérgio Amaral (ex-porta-voz do governo FHC) e do Rubens Ricupero (diretor da Faculdade de Economia da Faap e do Instituto Fernand Braudel de São Paulo) e por outro lado é uma honra para São Paulo também abrigar um centro desse tipo. Eu creio que São Paulo, isoladamente, sem qualquer pretensão hegemônica, deve ter um papel, em matéria de relações internacionais, respeitando, naturalmente a condução da esfera federal, mas São Paulo tem que multiplicar suas iniciativas. Aliás, pode até se fazer um paralelo, que São Paulo foi o estado que, de alguma maneira, organizou a imigração européia para o Brasil no final do século XIX, tomando iniciativas que acabaram tendo um impacto fundamental para o desenvolvimento brasileiro nas décadas subseqüentes e até hoje.

De alguma maneira agora, até por coincidência, é em São Paulo que se localizam dois terços da produção e 75% das exportações de etanol e cana-de-açúcar, que oferecem uma opção – eu não diria que seria a salvação ecológica ou econômica dos combustíveis para veículos automotores do mundo -, mas inegavelmente tem um papel complementar importante. Aliás, a experiência brasileira mostra que é possível avançar muito nessa área. Cerca de 40% do combustível de automóveis e de veículos leves, hoje, no Brasil, são movidos a etanol. Naturalmente essa é uma cifra inalcançável em termo mundial. Se todos os países usassem 10% de etanol nas misturas ou diretamente para combustíveis de veículos, hoje a oferta teria que aumentar oito vezes a produção conjunta Brasil-EUA. Isso dá uma noção de proporções bastante interessante. Mas é indiscutível que o etanol abre uma etapa boa para frente.

Para variar, a atitude dos EUA, nesse aspecto, é de protecionismo exacerbado. Isso corresponde à tradição da história dos EUA, que é de protecionismo. Quando está para trás é protecionismo e quando está adiante é livre comércio. É mais ou menos o costume, mas, de toda maneira, é um desafio importante que se coloca. É um desafio na constituição do mercado mundial. O Brasil tem interesse nisso. Nós precisamos ter de 20 a 40 países consumindo etanol para viabilizar o mercado internacional, precisamos ter uma maior normatização do produto da Commodity, interessa ter países produzindo, porque um país como o Japão, por exemplo, não vai importar combustível etanol apenas de um dos mercados produtores. Quer ter uma oferta mais ou menos garantida? É preciso ter diversificação da oferta.

Neste momento, embora represente maior concorrência para o Brasil, interessa ao Brasil fomentar a diversificação da produção em escala internacional, inclusive no Caribe. Muitos empresários brasileiros com (não diria oportunismo) senso de oportunidade, às vezes é difícil distinguir uma coisa da outra, favorecem isso porque estão exportando para os EUA, exportando a partir das tarifas preferenciais para os EUA e não para alguns países centro-americano e para o Caribe. Então, com pragmatismo o pessoal até passa a gostar da idéia, que podem vender tecnologia, equipamentos e furar o bloqueio comercial norte-americano à produção do etanol.

Quando o presidente Bush esteve aqui, no almoço eu perguntei a ele a respeito do protecionismo e ele deu os mesmo argumentos que no nascimento da CEPAL se dava para qualquer tentativa de industrialização na América Latina. Indústria nascente, essas coisas todas que sempre se repetem, eu não sei até quando isso vai durar, mas o fato é que se depender dos EUA, eles não vão dar uma grande abertura ao Brasil nessa matéria. Vão preferir essa diversificação de oferta, negócios especiais, dentro de uma política de bilateralidade comercial, que é a estratégia que tem sido implantada na prática, aliás, com a cooperação do governo brasileiro – que foram os dois governos que não deixaram a ALCA caminhar. Mas de toda maneira, a questão do etanol põe desafios, eu mesmo citei alguns aqui, mais no sentido provocativo para posteriores debates. Talvez o próximo passo, ou um dos próximos passos, seja a organização de um seminário dessa natureza. Enfim, me perdoem o improviso, mas não podia deixar de fazer algumas referências ou alguma sugestão com relação ao debate. Parabéns Sérgio Amaral, parabéns aos palestrantes todos, eu tinha muita vontade de escutar (o debate). Muito obrigado e parabéns mais uma vez.